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Estabilização De Preços, Renda Ou De Volume Negociado?
Nas
últimas décadas, a evolução e a estabilização da renda do setor agrícola têm
sido uma constante na elaboração e condução das políticas econômicas e agrícolas
em vários países. É claro que o objetivo geral dos vários programas de
estabilização de preços/renda seja diretamente orientado para a segurança e o
planejamento dos produtores de atividades agrícolas. O modelo
Nos Estados Unidos, os programas de intervenção proporcionaram a sustentação de
preços e receitas para os principais produtos agrícolas e, em conseqüência,
proporcionaram um excesso de oferta e a necessidade de volumosa armazenagem
pelos órgãos governamentais, cooperativas e outros esquemas privados. A
sustentação de preços dava-se através do Programa de Empréstimos, tendo o
produto como garantia, e a sustentação de receitas pelo 'Preço Meta' e
'Pagamento por Deficiência'. Nesse caso, quando as vendas são realizadas pelo
produtor diretamente no mercado, o Governo paga a eventual diferença entre o
preço recebido e o estabelecido. No entanto, sempre ocorre algum tipo de
restrição imposta quanto à área total cultivada.
Na atual União Européia(EU), a Política Agrícola Comum (PAC), adotada desde
1962, estabelecia preços de sustentação para assegurar ao produtor uma receita
mínima, que tem estimulado o aumento da produção.Embora, a partir do início dos
anos oitenta, tenham sido efetuadas significativas reformas na PAC, com redução
no volume de subsídios para o setor, manteve-se ao mesmo tempo o nível de renda
dos produtores agrícolas.
No Brasil, a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM) foi o principal
instrumento de política agrícola para os produtos básicos da agricultura
brasileira nas décadas de 70 e 80, mas no início dos anos 90 passa a perder
importância como política agrícola, principalmente pela defasagem dos preços
fixados no início de cada safra ou pela sua deficiente operacionalização, além
de ter sido uma decisão política face ao movimento de globalização. A PGPM tinha
como objetivos, entre outros, a redução das flutuações dos preços recebidos
pelos produtores, de maneira a incrementar e garantir a oferta de alimentos e
matérias-primas e garantir a renda do setor agrícola.
A renda agrícola, composta pelo preço e pela produção (esta ultima resultado da
área cultivada e da produtividade obtida), apresenta como principal
característica uma inerente instabilidade, relacionada aos preços agrícolas e à
dependência das condições climáticas. É evidente que essas flutuações na renda
agrícola acarretam acentuados impactos alocativos e distributivos no setor e na
economia, e geralmente as políticas agrícolas enfatizam aspectos relacionados
ora com a estabilização do preço agrícola, ora com a produção e/ou com a renda.
NEWBERY e STIGLITZ (1981) argumentam que poderia existir um conflito nos
objetivos dos programas de estabilização de renda ou dos preços, uma vez que a
estabilidade nos preços poderia implicar em renda total instável, o que
particularmente se verificaria no caso de um produtor com mais de uma atividade
agrícola, com receitas individualmente instáveis mas que, no conjunto, seriam
relativamente estáveis.
O principal argumento do ponto de vista de eficiência sugere que movimentos de
instabilidades nos preços nos mercados de produtos agrícolas provocariam uso
inadequado de recursos produtivos no curto prazo, além de induzir um dispêndio
maior dos consumidores. Especificamente, o argumento contra a instabilidade é de
que um aumento dos volumes negociados no mercado implicaria em diminuição da
eficiência econômica de transporte, armazenamento e processamento dos produtos
agrícolas.
Este artigo procura discutir alguns aspectos de políticas estabilização de
mercados, assumindo que o governo resolva estabelecer como meta reduzir a
instabilidade de renda de um produto agrícola.
Partiu-se de uma análise gráfica, a mesma utilizada por HOUCK (1973), que leva
em consideração as funções de oferta (OO) e de demanda (DD) e um intervalo, que
pode ser determinado por critérios políticos ou técnicos, de renda. A área
hachuriada delimitada pela hipérbole (SS) mostra as combinações de preço (P) e
quantidade (Q) que produzem o limite máximo de renda aceitável e a hipérbole
(MM) com o limite mínimo de renda aceitável (figura 1).
Se a intersecção anual da oferta e demanda ocorre dentro do intervalo dessas
duas hipérboles, então não é preciso ser acionado nenhum esquema de
estabilização. Se a intersecção da demanda e oferta ocorrer fora do intervalo
escolhido, então será preciso intervir no mercado para amenizar o problema de
estabilização.Para ilustrar uma situação provável, HOUCK (1973) admitiu que
exista uma agência governamental que possa intervir no mercado através de compra
e venda do produto e de estoques reguladores para influenciar preço e renda ou
que possa utilizar fundos de estabilização para arrecadar ou fazer pagamentos
suplementares para influenciar preços e renda.
Dois cenários
Um simples conceito de instabilidade se refere a um aumento de flutuação em torno da tendência central do longo prazo para preço, quantidades e renda. Considere-se uma instabilidade na produção e a conseqüente flutuação na oferta de um ano para o outro e dois tipos de demanda: uma inelástica, isto é, a resposta à variação do preço encontra-se no intervalo (-1,0), e outra elástica, isto é, a resposta à variação encontra-se no intervalo (menor que –1). Razoáveis argumentos podem ser utilizados para aceitar que as flutuações na demanda não ocorram facilmente de um ano para o outro.
A
figura 2, com demanda inelástica, dá uma indicação de como uma agência de
Governo pode agir para amenizar uma instabilidade causada no mercado. Com uma
oferta reduzida para OO, o preço e a quantidade de equilíbrio alcançaram o ponto
A fora do intervalo de estabilização desejado. A agência poderia comprar uma
quantidade de produto igual a BC e reduzir o preço de mercado igual a AB, de
sorte que atingiria o intervalo desejado. A agência poderia também, através de
fundos de estabilização, retirar AB do preço do produtor para atingir o ponto B
no intervalo de renda desejado.
Em anos com oferta maior O’O’, a aquisição da quantidade GE pela agência ou o
pagamento suplementar de FE poderia mover os preços e a quantidade para o
intervalo desejado. Neste caso, se alcançaria tanto a estabilização no preço
como a renda desejada. Venda de estoques reguladores em época de oferta escassa
e compra de estoques reguladores em anos abundantes promoveriam estabilidade nos
volumes negociados no mercado. Observe-se que com a ação da agência o preço se
estabeleceria no intervalo (E,B), menor que (A,F).
A
figura 3, com demanda elástica, mostra que com a oferta reduzida o equilíbrio de
mercado estaria abaixo do intervalo de renda desejado. E que, com uma oferta
abundante, o equilíbrio de mercado está acima do intervalo de renda desejado.
Com a oferta OO, a agência precisaria adquirir a quantidade CB de estoques
reguladores ou suplementar um pagamento igual a AB por unidade. Com a oferta
O’O’, precisaria ser liberada a quantidade EG dos estoques reguladores ou se
retirar a quantidade FE por unidade de preço do produto para que a renda atinja
o limite superior do intervalo de renda desejado. Neste caso, se estaria
atingindo estabilização na renda. Porém, o preço recebido pelos produtores
ficaria desestabilizado, pois a variação do intervalo dos preços se ampliaria
para o intervalo (B, E) que é maior que o intervalo (A,F) sem a intervenção da
agência. Uma agravante maior dessa situação é que se adicionaria instabilidade
ao volume negociado no mercado, com a agência adquirindo produto em época de
safras escassas e liberando produto em época de safras abundantes, proposta
oposta àquela que José, filho de Jacó, interpretou ao Faraó egípcio sobre o
sonho das 'Sete Vacas Magras e Sete Vacas Gordas'.
Com este modelo analítico relativamente simples, foi possível se analisar dois
cenários bem caracterizados e tirar conclusões. Contudo, outras aplicações
poderiam ser analisadas caso a caso, separadamente, em função das
características específicas de cada produto.
Data de Publicação: 04/12/2001
Autor(es): Afonso Negri Neto (afonsonegri@yahoo.com.br) Consulte outros textos deste autor