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Certificação De Produtos Orgânicos
1. O que é certificação de produtos orgânicos
A
certificação é o procedimento pelo qual uma terceira parte, independente,
assegura, por escrito, que um produto, processo ou serviço obedece a
determinados requisitos, através da emissão de um certificado. Esse certificado
representa uma garantia de que o produto, processo ou serviço é diferenciado dos
demais. No caso de produtos orgânicos, a certificação é um instrumento,
geralmente apresentado sob a forma de um selo afixado ou impresso no rótulo ou
na embalagem do produto, que garante que os produtos orgânicos rotulados foram
produzidos de acordo com as normas e práticas da agricultura orgânica. 2. Porque certificar O
estabelecimento de normas para regular a produção, o processamento, a
certificação e a comercialização de produtos orgânicos surgiu da necessidade de
os consumidores terem segurança quanto à qualidade dos produtos que adquirem,
pelo filão de mercado que surgiu em vários países, impulsionado pelo crescimento
da demanda por produtos cultivados com métodos da agricultura orgânica. 3. Quem pode certificar A
certificação orgânica pode ser feita por agências locais, internacionais ou por
parcerias entre elas. Pode também ser realizada por grupos de pequenos
produtores, desde que existam mecanismos internos de controle que sigam os
padrões da agricultura orgânica. Nesses casos, é comum a comercialização da
produção através de feiras de produtores e não há preocupação com exportação.
4. Breve histórico da certificação orgânica no Brasil
A
certificação de produtos orgânicos no Brasil teve início em meados dos anos 80s.
As primeiras iniciativas de organização da produção partiram de uma cooperativa
de consumidores, a COOLMÉIA, no Rio Grande do Sul, em 1978. Em 1984, foi fundada
uma entidade de produtores, a Associação de Agricultores Biológicos (ABIO) do
Rio de Janeiro, que criou as primeiras normas para credenciamento de
propriedades em 1986. 5. Como se faz a certificação Uma
vez que o produtor decide produzir utilizando métodos da agricultura orgânica, é
recomendável que se associe a uma agência certificadora, onde obterá informações
sobre as normas técnicas de produção. A certificadora poderá também indicar
consultores para assistência técnica, que dão orientação quanto à produção e
comercialização dentro de seus padrões técnicos para certificação. 6. Padrões Os
padrões de certificação orgânica são geralmente estabelecidos pelo Departamento
Técnico das agências certificadoras, que promove reuniões periódicas com
agrônomos, veterinários e produtores orgânicos para determinar a viabilidade
técnica das práticas propostas. Os padrões devem sempre estar em consonância com
as diretrizes básicas estabelecidas pela IFOAM. Aqueles que porventura ainda não
estiverem em conformidade com essas diretrizes deverão adaptar-se dentro de um
prazo estipulado para isso. 7. Quanto custa
Buscou-se reunir informações para duas das principais agências certificadoras de
produtos orgânicos no Estado de São Paulo. Os itens de despesa considerados,
apesar de serem semelhantes, variam de uma para outra. A Tabela 1 mostra a
estimativa dos custos de certificação da AAO.
As agências certificadoras precisam ser credenciadas por um órgão autorizado que
reconheça formalmente que uma pessoa ou organização tem competência para
desenvolver determinados procedimentos técnicos de fiscalização da produção. No
caso de produtos orgânicos, o órgão que credencia internacionalmente as
certificadoras é a International Federation of Organic Agriculture Movements
(IFOAM), que é a federação internacional que congrega os diversos movimentos
relacionados com a agricultura orgânica.
A iniciativa de adesão à certificação orgânica é voluntária, quando não houver
legislação que regulamente o assunto. Os casos com suspeita de fraude, quando
detectados, são passíveis de avaliação por uma comissão de certificação e outra
de ética. Conforme a avaliação dessas comissões, a agência certificadora pode
aplicar punições que podem chegar à exclusão do agricultor ou comerciante
oportunista, impedindo o uso do selo orgânico.
Quando existe legislação específica para isso, seja federal, estadual ou
municipal, a rotulagem orgânica passa a ser obrigatória para esses produtos. Os
infratores ficam sujeitos às penalidades previstas na lei. A regulamentação dos
processos e tecnologias de produção é necessária para manter os padrões éticos
do movimento orgânico e para fortalecer a confiança do consumidor no produto.
Serve para orientar os produtores orgânicos e promover o comércio desses
produtos entre fronteiras, uma vez que a qualidade orgânica é garantida pela
presença do selo.
A diferenciação de produtos orgânicos ocorre com base em suas qualidades
físicas, decorrentes principalmente da ausência de agrotóxicos e adubos
químicos, por exemplo, que estão mais diretamente relacionadas à forma como
esses produtos foram produzidos. Estas características embutidas nos produtos
orgânicos não podem ser observadas com facilidade no momento da compra. A
distância entre consumidores e produtores e a incapacidade de se ter certeza
quanto à forma pela qual os produtos orgânicos foram produzidos justificam a
necessidade de monitoramento da produção por uma terceira parte, independente.
A certificação é, portanto, uma garantia de que produtos rotulados como
orgânicos tenham de fato sido produzidos dentro dos padrões da agricultura
orgânica. A emissão do selo ou do certificado ajuda a eliminar, ou pelo menos
reduzir, a incerteza com relação à qualidade presente nos produtos, oferecendo
aos consumidores informações objetivas, que são importantes no momento da
compra.
A certificação orgânica começa a ser exigida para alguns produtos destinados à
exportação, como soja, café, mel, hortaliças, óleos essenciais, óleo de dendê,
caju, açúcar, mate, citrus, banana e guaraná. Nesses casos, a organização
certificadora precisa, na maioria das vezes, ser credenciada pela IFOAM ou pelas
normas ISO-65 para emitir um certificado que tenha reconhecimento internacional.
O desenvolvimento do mercado de produtos orgânicos depende fundamentalmente da
confiança dos consumidores na sua autenticidade, que, por sua vez, só pode ser
assegurada por legislação e/ou programas de certificação eficientes. O novo ramo
de atividade que surge com a regulamentação da agricultura orgânica pode ser
desempenhado com diferentes níveis de seriedade, compromisso ético,
transparência e competência.
Quando os consumidores decidem pela compra de produtos orgânicos e pelo
pagamento de um prêmio por efeitos positivos à saúde e redução de impacto
ambiental, entre outros atributos, eles esperam obter, em troca, um produto de
origem orgânica garantida. Assim como os produtores orgânicos, que arcam com
custos de produção mais elevados, os consumidores desejam estar protegidos
contra os falsos produtos orgânicos.
Para que uma agência certificadora de produtos orgânicos venha a funcionar
legalmente, precisa credenciar-se junto ao órgão oficial competente, caso haja
legislação. Deve também credenciar-se junto à IFOAM e obter o certificado ISO-65
para que o selo emitido seja reconhecido internacionalmente. Precisa ainda
estabelecer suas próprias normas, padrões e procedimentos de certificação, mas
que devem, necessariamente, estar subordinados tanto à legislação vigente em
cada país quanto à organização credenciadora.
As normas geralmente se referem à forma como os produtos de origem orgânica são
produzidos. A prática mais comum é a definição de diretrizes gerais e a
descrição de práticas culturais, tecnologias e/ou insumos permitidos, proibidos
ou de uso restrito nesse modo de produção. A reputação das agências
certificadoras constitui um aspecto fundamental, pois denota persistência de
seriedade na produção e de qualidade dos produtos.
A IFOAM foi a organização pioneira na criação de uma estrutura mundial de
certificação orgânica, que contava, em 1999, com 14 agências credenciadas para
emitir certificados de reconhecimento internacional. Seus padrões forneceram
parâmetros para a legislação sobre produtos orgânicos de diversos países.
Existem, ainda, certificadores independentes que tendem a atuar com base local.
Até o momento, ainda não há um sistema que seja plenamente reconhecido no mundo
todo e que possa fornecer a garantia da qualidade orgânica dos produtos.
Neste ano, iniciaram-se também os contatos para exportação de produtos orgânicos
certificados através do Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural (IBD),
localizado em Botucatu, Estado de São Paulo, cujo selo já conta com
reconhecimento internacional. Após as primeiras exportações, que só se
concretizaram em 1990, a demanda por um leque maior de produtos foi
intensificada.
Em 1992, a Associação de Agricultura Orgânica (AAO) de São Paulo, fundada em
1989, começou a cadastrar produtores para a feira de produtos orgânicos que
organiza semanalmente no Parque da Água Branca. No final de 1996, a AAO lançou
seu selo orgânico, permitindo a expansão dos canais de comercialização dos
produtos de seus associados, que agora podem ser encontrados nas principais
redes de supermercados de São Paulo. Nesse ano, foram exportadas 3.100 toneladas
de produtos orgânicos certificados. O selo da AAO encontra-se em fase de
reconhecimento internacional, através do credenciamento para este fim junto a
certificadoras internacionais.
Na esfera do Estado, o Governo Federal instituiu em 1995 o Comitê Nacional de Produtos Orgânicos (CNPO), para elaborar e aprimorar normas para a agricultura orgânica em nível nacional, com composição paritária entre governo e ONGs que atuam com agricultura ecológica. Fazem parte do CNPO representantes de ONGs das cinco regiões do país, do Ministério da Agricultura, da EMBRAPA, do Ministério do Meio Ambiente e de Universidades. Em outubro de 1998, foi publicada no Diário Oficial da União a portaria no 505/98 do Ministério da Agricultura, com uma proposta de normatização de produtos orgânicos. Esta proposta foi aberta para consulta pública até janeiro de 1999, período em que foram recolhidas sugestões da sociedade civil. Em maio de 1999, entrou em vigor a Instrução Normativa no 7/99 do Ministério da
Agricultura e Abastecimento, com o objetivo de estabelecer as normas de
produção, tipificação, processamento, envase, distribuição, identificação e
certificação de qualidade para produtos orgânicos de origem animal e vegetal.
Estas iniciativas surgiram em resposta a exigências de alguns países como o
Japão e da Comunidade Européia, que passaram a condicionar a importação de
alimentos à existência de certificação de qualidade ambiental, o que se
constitui em barreira não-tarifária por parte dos países importadores. Outro
fator importante para promover a regulamentação relaciona-se ao Mercosul.
Argentina, Uruguai e Paraguai já dispõem de regras para produção orgânica, que
serão impostas ao país, caso o Brasil não possua sua própria legislação.
Outros certificadores nacionais são a Associação de Agricultura Natural de Campinas e Região (ANC), a Associação dos Produtores de Agricultura Natural (APAN) e a Fundação Mokiti Okada (MOA). Certificadores internacionais, como a norte-americana Farmers Verified Organic (FVO), a francesa ECOCERT-BRASIL e a alemã BCS, também estão atuando no país. Mas caberá ao Colegiado Nacional, previsto na Instrução Normativa no 7/99 e atualmente em fase de definição de seus
membros a partir da formação dos Colegiados Estaduais, estabelecer quem pode e
quem não pode certificar produtos orgânicos no Brasil.
Em linhas gerais, o processo de certificação deve ser feito através de visitas
periódicas de inspeção, realizadas na unidade de produção agrícola, quando o
produto é comercializado ‘in natura’, e também nas unidades de processamento,
quando o produto for processado, e de comercialização, no caso de entrepostos.
As inspeções devem ser tanto programadas (com o conhecimento do produtor) quanto
aleatórias (sem o seu conhecimento prévio).
O produtor deve apresentar um plano de produção para a certificadora e manter
registros atualizados de uma série de informações, como a origem dos insumos
adquiridos, a sua aplicação e o volume produzido. Estas informações têm caráter
sigiloso e, assim como as instalações do estabelecimento, devem estar sempre
disponíveis para vistoria e avaliação do inspetor, caso seja solicitado.
Após a visita, o inspetor elabora um relatório no qual são indicadas as práticas
culturais e de criação observadas, o que permite detectar possíveis
irregularidades com relação às normas de produção estabelecidas. Estes
relatórios são encaminhados ao Departamento Técnico ou ao Conselho de
Certificação da certificadora, que delibera sobre a concessão do certificado que
habilita o produtor, processador ou distribuidor a utilizar o selo. A
certificação pode ser solicitada para algumas áreas ou para toda a propriedade.
As normas estabelecidas devem ser amplamente divulgadas entre os associados e
prestadores de assistência técnica e cumpridas rigorosamente pelo agricultor,
processador ou comerciante que desejem obter e manter a certificação. Os padrões
são revisados periodicamente, para permitir a adaptação a eventuais atualizações
técnicas.
Tabela 1. Estimativa de custos de certificação de produtos
orgânicos da AAO–
Associação de Agricultura
Orgânica
| |
Inscrição (anuidade, não obrigatória) | |
Inspeção - hortaliças (sorteios p/ visitas extras cada 15 dias) - frutas e cereais (visitas semestrais) | 120,00 a 200,00 + despesas de viagem |
Taxas de comercialização Feiras do Produtor Orgânico** - Água Branca - hortaliças, frutas e flores - processados e cereais - produtos apícolas - laticínios e ovos - carnes - Ibirapuera - Alphaville Selo Orgânico Certificado de Exportação - SAT (sem agrotóxicos, específico p/ café) Empresa comerciante | 23,00 / mês 1% sobre valor
comercializado (mensal) 1% sobre valor comercializado + despesas de inspeção semestral (200,00 + despesas de viagem) 2% sobre valor
comercializado + despesas de inspeção trimestral 1% sobre valor comercializado com o selo + despesas com inspeção (150,00 a 200,00) |
* Os valores estão em R$ de março de 2000.
** Valores por metro linear de comprimento de banca.
Fonte: AAO – Associação de Agricultura Orgânica
Na
Tabela 2, estão as estimativas de custo de certificação do IBD.
Tabela 2. Estimativa de custos de certificação de produtos
orgânicos do IBD – Instituto
Biodinâmico de Desenvolvimento
Rural
| |
Matrícula | Paga-se uma única vez. Varia entre 100,00 e 3.000,00 conforme o faturamento anual da empresa. |
Inspeção (anual) | - Custo de deslocamento (inclui passagens, hospedagem e alimentação) - Diária do inspetor
- produtos p/ mercado interno: 265,00 - pequenos produtores e associações: a combinar - produtos p/ exportação: 210,00 |
Emissão do Certificado Orgânico | 0,5 a 2% do valor faturado para cada remessa. Varia conforme o tipo de produto. |
* Os valores estão em R$ de março de 2000.
Fonte: IBD – Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural.
8. Quanto tempo leva
O
tempo necessário para a conclusão do processo de certificação depende de vários
fatores e varia conforme o ciclo produtivo das atividades e da agência
certificadora. Se o estabelecimento agrícola está passando por um processo de
conversão para a agricultura orgânica, este pode levar até três anos para que
seja considerado certificado, se for, por exemplo, o caso de culturas perenes
como frutas. Esse período é necessário para garantir um tempo que permita a
dissipação de resíduos de agrotóxicos no solo, que contaminariam a produção. No
caso da produção de hortaliças, cujo ciclo é mais curto, esse período é mais
reduzido. Enquanto não se cumprir os períodos exigidos para a adaptação, o
estabelecimento e as atividades agrícolas são considerados como ‘em transição’.
Se o estabelecimento já produz conforme as normas orgânicas, a emissão do
certificado que o habilita a utilizar o selo é praticamente imediata, após a
inspeção, caso não seja detectado nenhum procedimento que esteja em desacordo
com as normas de produção e comercialização da agência certificadora.
9. Quanto se ganha
Os
produtos orgânicos geralmente recebem um adicional de preço, que busca remunerar
as dificuldades enfrentadas e as possíveis reduções na produção. O diferencial
de preço, no entanto, varia muito conforme o produto. Cabe ressaltar que o ágio
obtido por produtos orgânicos está diretamente relacionado à sua oferta no
mercado.
As folhosas e demais hortaliças, por exemplo, que não têm problemas sérios para
sua produção e apresentam oferta regular, costumam ter diferencial de preço que
pode variar entre 20 e 30% acima dos produtos similares produzidos de modo
convencional. Produtos com maiores problemas técnicos na produção podem alcançar
100% de ágio no preço pago ao produtor, como no caso de algodão orgânico
naturalmente colorido.
O mais alto diferencial de preço em relação aos similares convencionais, no
entanto, é observado em produtos mais difíceis de serem produzidos com métodos
orgânicos, como morango, tomate e batata, sobretudo quando a oferta já reduzida
coincide com fatores desfavoráveis para a sua produção, como problemas
climáticos. Nesses casos, o ágio pode alcançar 200, 300 ou ainda 400%.
10. Endereços úteis
AAO – Associação de Agricultura Orgânica
Av. Francisco Matarazzo, 455
Prédio do Fazendeiro - 2o andar – Sala 20
Caixa
Interna 24
São Paulo – SP
CEP
05001-900
Telefax: (0XX11) 263-8013
E-mail: organica@uol.com.br
http://www.aao.org.br
IBD – Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural
Caixa Postal 321
Botucatu – SP
CEP 18603-970
Telefax: (0XX14)
822-5066
E-mail: ibd@laser.com.br
http://www.laser.com.br/ibd
11. Bibliografia
AAO. Manual de Certificação: normas de produção, regulamentos, contratos, formulários e estatutos. São Paulo: Associação de Agricultura Orgânica, 1998. 64p.
IBD. Diretrizes para os padrões de qualidade Biodinâmico, Deméter e Orgânico 'Instituto Biodinâmico'. 7 ed. Botucatu: Instituto Biodinâmico de Desenvolvimento Rural, set. 1997. 50p.
INSTRUÇÃO NORMATIVA No 07/99, de 17 de maio de 1999. Diário Oficial da União, 19 de maio de 1999.
PORTARIA No 505, de 16 de outubro de 1998. Diário Oficial da União, 19 de outubro de 1998.
SOUZA, Maria C. M. Algodão orgânico: o papel das organizações na
coordenação e diferenciação do sistema agroindustrial do algodão. São Paulo, SP:
USP/FEA, 1998. 187p. Dissertação de Mestrado
Data de Publicação: 10/05/2001
Autor(es): Maria Celia Martins De Souza (mcmsouza@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor