Previsões Para os Preços Recebidos pelos Produtores de Leite B e C no Estado de São Paulo para 2008

1 - Introdução

            Em razão de vários fatores conjunturais e estruturais tanto domésticos quanto externos, em 2007, observou-se considerável aumento do preço do leite comparativamente a 2006. No mercado internacional, a alta do preço do leite foi decorrente sobretudo da escassez do produto, fato que estimulou o crescimento das exportações brasileiras de lácteos, restringindo sua disponibilidade interna. Como resultado dessa situação, cresceu a disputa interna entre os laticínios pela matéria-prima escassa, pressionando favoravelmente o preço pago ao produtor. Prova disso foi a ocorrência de alta relevante dos preços no mercado spot (produto comercializado entre laticínios), forçando ainda mais para cima o preço do leite no mercado interno.

            Nos fatores externos, destaca-se a evolução positiva da demanda mundial de leite, provocada pelo incremento da renda na Rússia, dos países do Leste Europeu e de países em desenvolvimento, como a China, contudo, sem o acompanhamento do crescimento da oferta. Outro fator fundamental para a alta do preço do leite no mercado mundial ocorreu do lado da oferta, isto é, o prolongamento da seca na Austrália, um dos principais países produtor e exportador do produto, que impactou fortemente a produção e a comercialização de leite no mercado externo. Também, a redução dos subsídios europeus para exportações de leite em pó e a queda de seus estoques públicos restringiram ainda mais a oferta mundial de leite.

            A conseqüência desses fatores externos foi que o ano de 2007 mostrou-se atípico, mas extremamente favorável para a produção leiteira brasileira, pois o mercado interno ficou 'enxuto' devido à pouca oferta, relacionada ao período de seca nas regiões produtoras; à oportunidade de aumento das exportações, pela falta do produto no mercado externo, e ao aumento do consumo mundial.

            É necessário frisar que os preços dos insumos exercem papel relevante na composição de custos de produção e, conseqüentemente, podem influenciar os preços recebidos pelos produtores de leite. Em períodos normais, a elevação de preço desses fatores, como observado no período recente, poderia ser limitante ao estímulo da produção leiteira. No entanto, em 2007, o comportamento favorável dos preços recebidos, aparentemente, anulou o que poderia ser um fator restritivo.

            O objetivo deste estudo é avaliar se as condições atuais, que estão favorecendo o mercado de leite, devem continuar favoráveis para o setor em termos de preços. Para tal será empregado modelo de previsão para séries temporais para os leites tipos B e C.
 

2 - Modelo de Previsão para o Preço Recebido pelo Produtor de Leite B no Estado de São Paulo

            Utilizou-se um modelo de séries temporais para prever os valores dos preços recebidos pelos produtores de leite B no Estado de São Paulo, mais precisamente um Modelo de Função de Transferência1. Esse modelo se caracteriza por possuir uma única equação, porém, permite a inserção de diversas variáveis independentes.

            Foram utilizadas um total de sete variáveis, as quais são fundamentais para a formação do preço do leite B em nível de produtor: preço médio recebido pelo produtor de leite B (variável dependente), preço da novilha, preço da vaca gorda, preço da vaca de 10 litros, preço de ração de novilha e vaca seca, preço de vaca de 5 litros e preço de ração de vaca em lactação.

            A fonte dos dados é o Instituto de Economia Agrícola (IEA) e o período abrangido é de janeiro de 2000 e estende-se até dezembro de 2007, com um total de 96 observações.
            Para avaliar a acurácia da previsão foi utilizado o coeficiente de desigualdade de Theil2. Em linhas gerais, quanto mais próximo de zero estiver esse coeficiente, melhor a previsão, pois as diferenças entre os valores previstos e observados serão pequenas também.

            O coeficiente de desigualdade de Theil tem valor igual a 0,0122. Dado que esse valor está mais próximo de zero do que de um, a previsão pode ser considerada satisfatória. Observa-se que a média dos valores observados (0,5125) difere levemente da média dos valores previstos (0,5122). Em função desse resultado, o viés da média (0,00%) não contribui para o erro quadrático médio. Já a proporção do viés das variâncias pouco contribui para o erro quadrático médio, pois sua participação é de apenas 1,00%. Medeiros Junior (2001)3, citando Theil, diz que 'se a habilidade do preditor não permite alcançar a perfeição, a distribuição mais desejável de desigualdade para as três fontes de erro é UM = US = 0 e UC = 1'. Nesse caso, a proporção da correlação imperfeita é a principal fonte de erro quadrático, com 99,00%. Por outro lado, o coeficiente de correlação tem valor igual a 99,00%, mostrando que há elevado grau de aderência entre valores observados e previstos (Tabela 1).

Tabela 1 - Desempenho Preditivo do Modelo de Previsão, Preço do Leite Tipo B, São Paulo, Janeiro de 2000 a Dezembro de 2008

Parâmetro
Total
Coeficiente de desigualdade de Theil (U)
0,0122
Média dos valores previstos () (R$)
0,5122
Média dos valores observados () (R$)
0,5125
Desvio-padrão dos valores previstos (SP) (R$)
0,0974
Desvio-padrão dos valores observados (SO) (R$)
0,0989
Coeficiente de correlação (r)
0,99
Proporção do viés de médias (UM)
0,00
Proporção do viés das variâncias (US)
0,01
Proporção da correlação imperfeita (UC)
0,99

Fonte: Dados da pesquisa.

            A evolução dos valores observados, previstos, máximos e mínimos para o preço recebido pelo produtor de leite tipo B, de janeiro de 2000 a dezembro de 2008 está apresentada na figura 1.

Figura 1 - Valores Observados, Previstos, Limites Inferior e Superior, Preço Recebido pelo Produtor de Leite Tipo B, Estado de São Paulo, Janeiro de 2000 a Dezembro de 2008.

Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos do IEA.

            A tabela 2 mostra os valores previstos para janeiro a dezembro de 2008. Os resultados do modelo indicam que, ceteris paribus4, a tendência de elevação dos preços do leite tipo B continuará até o final de 2008, sendo que o preço recebido pelo produtor será praticamente igual a R$0,77/litro.

Tabela 2 - Valores Previstos, Máximos e Mínimos, Preço do Leite Tipo B, Janeiro de 2008 a Dezembro de 2008

Mês
Valor previsto
Valor máximo
Valor mínimo
Janeiro
0,6617
0,7019
0,6215
Fevereiro
0,6819
0,741
0,6227
Março
0,6931
0,7673
0,6189
Abril
0,6922
0,7793
0,6051
Maio
0,6945
0,793
0,5961
Junho
0,7156
0,8241
0,6071
Julho
0,735
0,8527
0,6173
Agosto
0,7427
0,869
0,6165
Setembro
0,7498
0,8826
0,617
Outubro
0,7566
0,8956
0,6177
Novembro
0,7595
0,9044
0,6147
Dezembro
0,7698
0,9199
0,6198
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos do IEA.

3 - Modelo de Previsão para o Preço Recebido pelo Produtor de Leite C no Estado de São Paulo

            Para a análise do comportamento do preço do leite C foi empregado, novamente, o Modelo de Função de Transferência, de janeiro de 2000 a dezembro de 2007, com 96 observações. Utilizou-se um total de quatro variáveis, as quais são fundamentais para a formação do preço do leite C em nível de produtor: preço médio recebido pelo produtor de leite C, preço da novilha, preço da vaca gorda e preço da vaca de 5 litros. As variáveis preço da vaca de 10 litros, preço de ração de novilha e vaca seca e preço de ração de vaca em lactação não foram utilizadas porque o produtor de leite C é menos qualificado tecnologicamente comparativamente ao de leite B.

            Como as variáveis preço da vaca gorda e preço da vaca de 5 litros não se mostraram estatisticamente significativas, para a elaboração do modelo de previsão do preço recebido pelo produtor de leite C, utilizou-se somente como variável de entrada o preço da novilha.

            O coeficiente de desigualdade de Theil tem valor igual a 0,0134. Como esse valor está mais próximo de zero do que de um, a previsão pode ser considerada satisfatória. Observa-se que a média dos valores observados (0,4371) difere levemente da média dos valores previstos (0,4366). Em função desse resultado, o viés da média não contribui para o erro quadrático médio. O mesmo se aplica para a proporção do viés das variâncias no erro quadrático médio, cuja participação também foi igual a 0,00%.

            A proporção da correlação imperfeita é a principal fonte de erro quadrático, com 100,00%. Por outro lado, o coeficiente de correlação tem valor igual a 99,00%, mostrando que há elevado grau de aderência entre valores observados e previstos (Tabela 3).

Tabela 3 - Desempenho Preditivo do Modelo de Previsão, Preço do Leite Tipo C, São Paulo, Janeiro de 2000 a Dezembro de 2007

Parâmetro
Total
Coeficiente de desigualdade de Theil (U)
0,0134
Média dos valores previstos () (R$)
0,4366
Média dos valores observados () (R$)
0,4371
Desvio-padrão dos valores previstos (SP) (R$)
0,1003
Desvio-padrão dos valores observados (SO) (R$)
0,1005
Coeficiente de correlação (r)
0,99
Proporção do viés de médias (UM)
0,00
Proporção do viés das variâncias (US)
0,00
Proporção da correlação imperfeita (UC)
1,00

Fonte: Dados da pesquisa.

            Na figura 2, apresenta-se a evolução dos valores observados, previstos, máximos e mínimos para o preço recebido pelo produtor de leite tipo C, de janeiro de 2000 a dezembro de 2008.

Figura 2 - Valores Observados, Previstos, Limites Inferior e Superior, Preço Recebido pelo Produtor de Leite Tipo C, Estado de São Paulo, Janeiro de 2000 a Dezembro de 2008.

 
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos do IEA.

            A tabela 4 mostra os valores previstos para janeiro a dezembro de 2008. Os resultados do modelo, novamente, indicam que, ceteris paribus, a tendência de elevação dos preços do leite tipo C continuará até o final de 2008, e que o preço recebido pelo produtor será praticamente igual a R$0,70/litro.

Tabela 4 - Valores Previstos, Máximos e Mínimos, Preço do Leite Tipo C, São Paulo, Janeiro de 2008 a Dezembro de 2008

Mês
Valor previsto
Valor máximo
Valor mínimo
Janeiro
0,5808
0,6047
0,5569
Fevereiro
0,5537
0,5999
0,5075
Março
0,5468
0,6147
0,479
Abril
0,5579
0,6461
0,4697
Maio
0,58
0,6871
0,4729
Junho
0,6097
0,7301
0,4894
Julho
0,6485
0,7772
0,5198
Agosto
0,6808
0,8144
0,5472
Setembro
0,6915
0,8278
0,5552
Outubro
0,7016
0,8393
0,5639
Novembro
0,701
0,8397
0,5622
Dezembro
0,699
0,839
0,559
Fonte: Elaborada pelos autores a partir de dados básicos do IEA.

4 - Considerações Finais

            Mantidas as condições no mercado internacional de restrição da oferta de leite, de ocorrência de problemas climáticos afetando importantes players, como a Austrália, pressão de demanda mundial por proteína animal, como resultado do aumento da renda per capita em diversos países em desenvolvimento, os preços do leite no mercado externo devem continuar em trajetória ascendente.

            Para os produtores brasileiros de leite essa conjuntura é favorável, pois permite abrir novas perspectivas para o setor no comércio mundial, que poderá ser consolidada e se tornar mais um canal para a comercialização do produto.

            Além disso, os recentes programas sociais de renda mínima possibilitaram o acesso de um grande contingente da população de baixa renda a proteína de melhor qualidade. O crescimento acarretado na demanda interna por produtos lácteos, que contribuiu para pressionar os preços do leite no mercado doméstico, deverá permanecer no médio prazo.

            Essa configuração atual do mercado poderá ter efeito continuado sobre os preços do leite, forçando-os para cima, o que apenas poderá ser revertido se houver expressivo aumento da quantidade ofertada interna no curto prazo.

            Finalmente, os resultados obtidos com os dois modelos de previsão de preços de leite (B e C) apontam para elevação do preço até o final de 2008, em continuidade ao ciclo de alta iniciado em 2007. No médio prazo não há expectativa de retração nos patamares de preços atingidos pelo segmento leiteiro.

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1 Detalhes sobre o Modelo de Função de Transferência podem ser obtidos em: BOX, G. E. P.; JENKINS, G. M.; REINSEL, G. C. Time series analysis: forecasting and control. 3rd . New Jersey: Prentice Hall, 1994. 598 p.; MILLS, T. C. Time series techniques for economists. New York: Cambridge University, 1990. 377 p.; e VANDAELE, W. Applied time series and Box-Jenkins models. New York: Academic Press, 1983. 417 p.

2 THEIL, H. Applied economic forecasting. Amsterdan: North-Holland, 1966. 474 p.

3 MEDEIROS JUNIOR, H. Indicador antecedente para à economia carioca. 2001. 98 p. Dissertação (Mestrado em Economia Empresarial) - Universidade Candido Mendes, Rio de Janeiro.

4 Tudo mais permanecendo constante.

Palavras-chave: leite, preços, mercado.

Data de Publicação: 04/07/2008

Autor(es): Rosana de Oliveira Pithan e Silva (rosana.pithan@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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Mario Antonio Margarido (mamargarido@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor