Café: efeitos das mudanças climáticas vão além do imaginado

            A primeira estimativa oficial da nova safra de café confirmou aquilo que já havia sido aqui antecipado. Ou seja, uma temporada em que a oferta será bastante reduzida frente às necessidades de abastecimento do mercado interno e ao atendimento dos clientes internacionais, ainda que se recorram aos parcos estoques existentes.
            Nesse contexto e sem desprezar notícias como a da já anunciada produção de cerca de 15 milhões de sacas no Vietnã, as cotações persistiram pressionadas. Em dezembro, na Bolsa de Nova Iorque, o café arábica acumulou ganho de 6,49%, contrato C para a segunda posição, frente à média do mês anterior, contabilizando US$ 168,87 a saca. Esse valor representou mais de US$ 10,30/saca de incremento nas cotações somente no último mês do ano. Todavia, para essa bolsa, no acumulado do ano, a média das cotações permaneceu praticamente estável, com apenas ligeiro aumento de 0,66% frente a 2005 (gráfico 1).

Gráfico 1 - Cotações médias mensais do café em diferentes mercados de futuros (segunda posição) e do OIC-Composto diário, jan.2004 a dez.2006

 

Fonte: Elaborada a partir de dados da Gazeta Mercantil

            Na Bolsa de Londres, as cotações de dezembro de 2006 para o café robusta registraram declínio de 0,38% frente ao mês anterior. Diferentemente daquilo que se observou para o arábica, a evolução das cotações do café robusta ao longo de 2006 exibiu ganho de aproximadamente US$ 18,00/saca, com preço médio no ano de US$ 79,28/saca.
            No mercado de futuros da BM&F, bastante aderente ao que foi observado em Nova Iorque, as cotações apresentaram ganho de 6,52% (segunda posição). Essa variação positiva, entretanto, foi incapaz de sustentar uma média das cotações para 2006 superior à de 2005, pois se situou em US$ 132,69 (enquanto no ano anterior registrou US$ 134,05).
            Finalmente, o indicador OIC-Composto diário apresentou incremento de 4,48% em relação à média do índice de novembro (gráfico 1). Para o fechamento do ano, o indicador exibiu crescimento de aproximadamente 7,15% frente a 2005.
                O diferencial das cotações observadas entre a BM&F e Nova Iorque cresceu para US$ 15,63/saca, cerca de 0,50% superior à média do mês anterior. A recomposição de margens dos traders e exportadores foi tendência bastante forte em 2006, já que o diferencial exibia o valor de apenas US$ 8,92/saca (gráfico 2 ).

Gráfico 2 – Cotações médias mensais do café arábica, segunda posição, nos mercados de Nova Iorque e BM&F, 2006

 
Fonte: Elaborada a partir de dados da Gazeta Mercantil

            As cotações do arábica, contrato C, segunda posição, na Bolsa de Nova Iorque, exibiram grande volatilidade (mínimo de US$ 164,29/saca e máximo de US$ 174,41/saca), porém com tendência prevalecente de ganho ao longo do mês de dezembro (gráfico 3 ).

Gráfico 3 - Cotações diárias na Bolsa de Nova Iorque, para café arábica, Contrato C, segunda posição, dezembro 2006

 

Fonte: Elaborada a partir de dados da Gazeta Mercantil

            O comportamento das cotações no mercado de robusta, na Bolsa de Londres, foi mais firme do que aquele exibido pela Bolsa de Nova Iorque, uma vez que apresentou um movimento de baixa enquanto os demais tiveram alta. Ao primeiro dia do mês, a cotação praticada foi de US$ 86,76/saca e, no último dia de movimentação na bolsa (29/12), essa cotação batia na casa dos US$ 95,40/saca (gráfico 4).

Gráfico 4 - Cotações diárias para o café robusta, segunda posição, na Bolsa de Londres, dezembro de 2006
 
 

 
Fonte: Elaborada a partir de dados da Gazeta Mercantil

            No mercado para a cafeicultura paulista, as cotações médias de dezembro do arábica (em R$/sc) cresceram mais de 13% em relação à média de novembro de 2006, em função dos ganhos registrados para o produto no mercado internacional. Mesmo diante dessa majoração positiva, na média do ano, houve declínio nos preços de 10,67% em 2006, frente à média ano de 2005 (gráfico 5).

Gráfico 5 - Preços médios mensais recebidos pelos produtores de café arábica, Estado de São Paulo, jan. 2002 a dez. 2006

 

Fonte: Elaborado a partir de dados do Instituto de Economia Agrícola

Mudanças climáticas e o consumo de café

            O inverno com aparência de primavera no hemisfério norte tem assustado a maior parte dos climatologistas, pois confirma a hipótese de que o globo está a se aquecer. Em decorrência dessas elevadas temperaturas, o mercado de commodities já exibe suas primeiras vítimas.
            Inverno mais ameno significa menos consumo de derivados de petróleo para gerar energia utilizada no aquecimento das residências. Menor demanda traduz-se de imediato em menores cotações, que no atual momento verdadeiramente desabaram. No mercado de café, fenômeno de mesma natureza está a se processar.
            A estação invernal do hemisfério norte é sempre muito aguardada pelos agentes do mercado de café, pois há, efetivamente, maior consumo da bebida não apenas por causa do frio em si, mas, sobretudo, pela dificuldade imposta ao deslocamento. E, estando mais tempo em seus lares, as pessoas acabam por consumir mais café. Entretanto, as temperaturas mais elevadas registradas até agora deverão ser interpretadas como um indicador indireto de menor demanda pela bebida, que com certeza será traduzida por baixa nas cotações.
            Antes de se configurar esse 'tórrido' inverno no norte, todos os analistas do mercado de café eram unânimes em afirmar que os preços deveriam seguir pressionados desde o final de 2006 e até pelo menos março de 2007. Porém, o atual calor pode ser um balde de água fria nas expectativas quanto à evolução das cotações.
            A discussão sobre os impactos das mudanças climáticas sobre os cinturões produtores de café no Brasil já aparece no desenho de cenários futuros para essa cultura. O aspecto novo nesse debate é que o consumo da bebida também está negativamente afetado pelas altas temperaturas globais. Ações corretivas precisam ser imediatamente implementadas, pois nada mais assustador que um mundo consumindo menos café. 2

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1 A primeira estimativa da Companhia Nacional de Abastecimento - CONAB (www.conab.gov.br) para a safra 2006/07 previu colheita entre 31,5 milhões e 32,7 milhões de sacas
2 Artigo registrado na CCTC-IEA sob número HP-04/2007

Data de Publicação: 09/01/2007

Autor(es): Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor