Artigos
Agricultura paulista e aparelho estatal: falta de recursos ou de conteúdo?
As deficiências da estrutura estatal de sustentação da agricultura paulista vêm sendo tratadas como tendo entrado em franco processo de depauperação em função da redução dos orçamentos destinados às atividades públicas setoriais. Por certo, há muito a agricultura deixou de ser prioridade para os sucessivos governos estaduais que cada vez mais se vêem pressionados por outras demandas sociais de uma sociedade que, mais que urbanizada em termos populacionais, também urbanizou a miséria. _____________________________
Isto se reflete no fato de que há absoluta convergência nos percentuais de recursos aplicados no denominado tripé básico da ação estatal para a agricultura, formado por pesquisa, defesa e extensão rural. Uma leitura dos orçamentos federal, estaduais e municipais leva à conclusão de que se aplica algo em torno de 0,3% dos recursos totais nessas funções públicas.
No caso paulista, isso corresponde a algo em torno da metade do verificado no final do primeiro qüinqüênio dos anos 1980. E essa situação se torna ainda mais dramática quando se agrega o argumento de que mais de 80% desses valores se destinam à folha de pagamento.
Em função dessa constatação, a solução parece óbvia; ou seja, basta simplesmente que o próximo governo estadual priorize a agricultura e passe a aplicar recursos adicionais na execução das políticas públicas para a agricultura estadual que os problemas estariam resolvidos. Noutras palavras, o diagnóstico detecta como causa fundamental da crise institucional a progressiva redução dos orçamentos setoriais; assim, em se tratando de falta de recursos, a solução se mostraria simples: basta aplicar mais recursos.
Isto com certeza revigoraria a ação do aparelho estatal. Mas seria essa uma medida capaz de revigorar a dinâmica da agricultura paulista e sustentar um novo ciclo de desenvolvimento setorial? A resposta, para desespero dos corporativistas de todos os matizes, é definitivamente não.
Há que primeiro entender o que ocorreu com a agricultura paulista nas últimas décadas para que sejam estruturadas políticas estatais compatíveis com o ciclo presente de desenvolvimento da agricultura. E também vislumbrar a capacidade dos instrumentos disponíveis ao nível das unidades da federação para intervir na sua dinâmica.
A agricultura paulista incorporou na plenitude o padrão agrário da denominada 2ª Revolução Industrial nos anos 1970, tendo sido exatamente para isso montada a atual estrutura do aparato estatal paulista na chamada 'reforma de 1969'. Em relação aos pressupostos daquela reforma, avanços fundamentais não foram concretizados. Persistiu o modelo difuso de pesquisa para agricultura, em função de que nesse quesito a força do corporativismo impediu e vem impedindo os avanços necessários. Mas, se o problema de conteúdo já se mostrava latente no final dos anos 1960, agora é uma questão dramática.
A partir dos anos 1970, o desenvolvimento da agricultura paulista baseou-se na expansão agroindustrial e nas alterações profundas na composição de culturas. Tanto assim que a fronteira de expansão havia se esgotado, com a área agropecuária ocupando em torno de 18,0 milhões de hectares para uma área total das propriedades rurais de 22,0 milhões de hectares.
Na composição de culturas, as pastagens que cobriam 12,0 milhões de hectares no final dos anos 1960 ocupam atualmente cerca de 10,0 milhões de hectares, para um rebanho bovino que cresceu de 7,0 milhões de cabeças para 14,0 milhões de cabeças. Logo, isso implicou no substantivo aumento da produtividade da pecuária pela proliferação da raça zebuína nelore (ou anelorados) e a disseminação da braquiária, que se tornou a espécie vegetal mais cultivada em solo paulista com cerca de 8,0 milhões de hectares. O papel da ação pública estadual na concretização dessa mudança foi muito reduzido.
Nas denominadas lavouras, cuja superfície cultivada saltou de 6,0 milhões de hectares para 8,0 milhões de hectares, a ocupação do solo por parte da cana para indústria subiu de 740 mil hectares em 1970 para 3,8 milhões de hectares nos dias atuais. Assim, no desenvolvimento da agricultura paulista, há nítida prevalência do complexo sucroalcooleiro que, territorialmente, avançou em 3,0 milhões de hectares nas últimas três décadas e meia. A explicação para o dinamismo canavieiro também não está associada às políticas públicas estaduais de pesquisa, defesa e extensão, mas às políticas federais de desenvolvimento que incorporaram a dinâmica agroindustrial, primeiro para o açúcar e depois para o álcool, e aos estímulos dos preços internacionais.
A integração vertical do complexo sucroalcooleiro praticamente eliminou o segmento da agropecuária canavieira, na medida em que a cana própria representa a esmagadora proporção da matéria-prima moída. Esse mecanismo de coordenação vertical também consiste na base de outro segmento relevante da agricultura estadual, representado pela agroindústria de produtos florestais, uma vez que as lavouras florestais ocupam pouco menos de 1,0 milhão de hectares de terras paulistas e apresentam como característica a quase inexistência do segmento agropecuário dada a hegemonia das florestas próprias. Mais uma vez, tem-se um segmento que sequer está no campo de atribuições da Secretaria de Agricultura e Abastecimento.
Há que se destacar os principais grãos e fibras, representados por soja, algodão e milho. Essas três lavouras, que no final dos anos 1970 ocupavam 2,1 milhões de hectares, refluíram para 1,9 milhão de hectares nos anos recentes. Enquanto a soja avançou (67 mil hectares para 670 mil hectares), o milho recuou (1,5 milhão de hectares para 1,2 milhão de hectares) menos que o algodão (585 mil hectares para 72 mil hectares), que praticamente desapareceu da agropecuária paulista.
Nessas lavouras, ocorreu uma redução da ação pública estadual. A dinâmica foi dada pela hegemonia quase absoluta do material genético exógeno a São Paulo, o que vem se aprofundando com a generalização do uso da transgenia. Por certo, isso tem a ver com equívocos da política estadual, em especial no caso do algodão, mas forjou-se uma realidade quase irreversível pela destruição da base produtiva consistente do algodão meridional brasileiro para privilegiar os cerrados.
Na soja, no algodão e no milho, se não existem as agroindústrias, há a presença das tradings companies na governança desses agromercados. O mecanismo de integração contratual, com base nas vendas antecipadas que lastreiam o novo padrão de financiamento dessas commodities, cria vinculação direta entre as empresas fornecedoras de insumos e máquinas e os agropecuaristas.
Com isso, a ação pública desenhada no final dos anos 1960 reduziu-se de forma significativa e inexorável, com fragilização da capacidade estadual de promover políticas públicas de conteúdo territorial. As decisões principais são federais e o Governo de São Paulo tem relutado (de forma coerente) em usar o único instrumento consistente para alterar a lógica setorial representado pela guerra fiscal.
E o novo padrão de financiamento mediante vendas antecipadas, com uso de derivativos agropecuários ou não, promoveu uma mudança fundamental na lógica da irradiação da base técnica na agropecuária. As empresas de insumos 'vendem financiamento', na medida em que diferenciais de produtividade associados a diferentes fornecedores de um mesmo insumo levam os agropecuaristas a tomar decisão com base nas condições do negócio que prevalecem sob os elementos qualitativos de características agronômicas. Isto numa realidade de lavouras profissionalizadas onde o dinheiro para custeio da safra se mostra escasso.
Um primeiro subtotal das atividades consideradas mostra que em 16,7 milhões de hectares, de uma área agropecuária de 18,0 milhões de hectares, o espaço para políticas estaduais no modelo pensado no final dos anos 1960 se mostra quase inexistente. Isto devido à concentração dos instrumentos no governo federal numa tendência que foi acirrada nas últimas décadas; ou seja, ainda em decorrência de que as estruturas agroindustriais ocuparam os espaços onde a ação pública estadual se realizava.
Na agropecuária paulista, tem-se uma ação estadual expressiva na definição dos contornos da base técnica na laranja e no café, enquanto lavouras relevantes, que em conjunto ocupavam 970,0 mil hectares no final dos anos 1960 e 913,0 mil hectares nos dias atuais. Os cafezais recuaram de 785,0 mil hectares para 250,0 mil hectares, enquanto os laranjais aumentaram de 185,0 mil hectares para 666,0 mil hectares.
Há que ser frisado aqui que as técnicas de adensamento das lavouras perenes permitiram amplos ganhos de produtividade e eficiência, tanto em cafezais como em laranjais e outras frutas. Isto gerou a base técnica compatível com a proliferação de elevado contingente de propriedades médias com padrão de renda bruta maiores que as demais lavouras.
De qualquer forma, os indicadores apontam para a realidade de que o modelo institucional do aparato estatal paulista se esgotou, atendendo a uma parcela reduzida da agropecuária estadual. Tanto assim que, nas duas últimas décadas, os indicadores, tanto da renda bruta (valor da produção) como do valor adicionado (produto interno bruto), crescem de forma consistente, quando os recursos orçamentários estaduais alocados nas atividades clássicas de pesquisa, extensão e defesa despencam para alcançar níveis insignificantes face à magnitude da relevância setorial.
Esse paradoxo torna visível que a questão da crise do aparato estatal paulista não se resume à falta de recursos, mas está associada a um problema nítido de conteúdo. Isto sem contar o ultrapassado sistema jurídico-institucional que sequer incorporou avanços constitucionais e legais das últimas décadas, como as autonomias das instituições científicas e tecnológicas e as normas relativas à legislação de propriedade intelectual.
Ao ultrapassar os horizontes das porteiras das propriedades rurais, essa questão de crise de conteúdo fica mais contundente. As transformações econômicas dos anos 1960 e 1970 processaram-se de forma profunda na agricultura estadual, na medida em que elevou São Paulo da condição de primário-exportador à de agroindustrial-exportador, em que cerca de 80% das vendas externas da agricultura estadual consistem de produtos processados. Com isso, a agricultura paulista diferencia-se das praticadas nas demais unidades da federação brasileira que se mantêm ainda primário-exportadoras.
Desse modo, mais que políticas agropecuárias na agricultura paulista, só fazem sentido políticas agroindustriais integradas. A visão setorial, do fluxo da produção ao consumo que vai do campo à mesa, deve sair da retórica e ser incorporada à essência da ação publica como axioma ordenador da reestruturação do aparelho estatal. Em função disso, o modelo institucional do aparelho estatal paulista, estruturado para dar conta do ciclo de desenvolvimento dos anos 1960 a 1980, não mais se mostra funcional com as necessidades do dinamismo setorial.
Ressalte-se que foi meritória a contribuição institucional na construção do processo de 'agroindustrialização' correspondente à internalização dos padrões da 2ª Revolução Industrial. Mas essa missão esgotou-se com o sucesso dessa perspectiva de transformação da agricultura paulista
Entretanto, de maneira alguma a perda de conteúdo do modelo institucional forjado nos anos 1960 representa a desnecessidade de ação estatal. Apenas o conteúdo configura-se como outro, por diversas razões além de já se ter uma agricultura industrializada em São Paulo.
O novo tempo histórico exige o rompimento com os pressupostos do desenvolvimentismo, nos quais, para superar o atraso estrutural da agricultura, se exigia uma ação estatal marcada pelo estímulo ao uso de insumos e máquinas, pela uniformidade de processos para elevar os rendimentos operacionais das agroindústrias e pelo fornecimento de um insumo estratégico representado pelo material genético. Tanto assim que o indicador era o ganho de produtividade, para o que a assistência técnica integral atuava na irradiação dos insumos modernos e a pesquisa estadual era concentrada e avaliada com base nas variedades (e cultivares) produzidas pelo seus projetos de melhoramento genético.
A defesa agropecuária consistia numa ação secundária. Tanto assim que a reforma de 1969 da Secretaria de Agricultura extinguiu a unidade autônoma e especializada em defesa sanitária. O conteúdo do aparato estatal paulista está ainda condicionado a um tempo histórico no qual a modernidade significava tão-somente produtividade. E isso foi fundamental para o desenvolvimento da agricultura estadual.
Mas os tempos contemporâneos são outros. A hora consiste em agregar qualidade a um sistema moderno e de alta produtividade, numa agricultura que se destaca no contexto internacional pelo elevado padrão de produtividade que lhe confere competitividade em muitos segmentos produtivos relevantes. Assim, o conteúdo da institucionalidade forjada nos anos 1960 tornou-se pretérito em função de seu inquestionável sucesso em produzir transformações relevantes na agricultura paulista.
Nesses novos tempos, a qualidade passa a ser um elemento fundamental na determinação da competitividade. E nos insumos a estrutura privada já desenvolveu mecanismos que garantem a sua oferta para os principais segmentos produtivos.
Nem poderia ser diferente. Junto com o modelo institucional, esgotou-se o padrão de financiamento baseado no dinheiro barato dos subsídios ao crédito dos anos 1970, que em última instância correspondia à multiplicação da dívida pública. Conquanto muitos ruralistas não tenham percebido, isso não faz mais sentido; nem as contas públicas permitiriam algo parecido com os mecanismos de política agrícola dos anos 1960.
Se a característica da agricultura dos agronegócios consiste na modernidade e eficiência, não se sustenta a multiplicidade de subsídios públicos para garantir a sustentabilidade setorial. Mais transferência de renda se torna cada vez mais indefensável. A ação estatal, em especial para a agricultura paulista, exige um novo conteúdo na forma de um novo modelo institucional que responda aos novos desafios das transformações setoriais.
A estrutura do aparelho estatal de desenvolvimentismo dos anos 1960 conforma um conteúdo pretérito que não dá conta do desenvolvimentismo deste novo século e dos desafios outros que estão colocados para a agricultura paulista. Dentre os elementos fundantes do novo conteúdo, está a qualidade de produtos e processos. Esta consiste num estratégico elemento formador de futuro.
Não se trata de meramente de priorizar mais recursos para a defesa sanitária, buscando zerar riscos sanitários. Isto se mostra um conteúdo ultrapassado. Há que se erguer um poderoso arsenal regulatório de produtos e processos que configure uma agricultura baseada na lógica de 'food safety' que vai muito além do combate a zoonoses, pragas, moléstias e parasitas.
Por exemplo, as principais decisões produtivas da principal lavoura paulista, representadas pela cana para indústria, não estão no campo institucional da Secretaria de Agricultura e Abastecimento, mas no da Secretaria do Meio Ambiente. Estão associadas ao controle da queima da cana para colheita e à obrigatoriedade de recomposição da reserva legal. Isto coloca na agenda a questão ambiental tão cara a uma sociedade urbanizada que, de outro lado, quer segurança alimentar pelo controle não apenas de produtos, mas principalmente de processos.
Logo, há que ser pensado não apenas a necessidade de alocar-se mais recursos em 'defesa agropecuária', mas também numa eficiente agência regulatória de produtos e processos da agricultura, com a amplitude que englobe todo o fluxo da produção ao consumo e que elimine as 'disputas' internas ao aparelho estatal, seja entre política ambiental e de produção, seja aquela que tenta opor saúde pública às decisões de produção. Como se trata de atribuição federal com parcela de sua execução delegada à instância estadual, o Governo do Estado de São Paulo deve assumir para si a formulação e a defesa de avanços fundamentais nesse campo.
Os rebates na pesquisa pública são diretos. Isto porque a regulação da qualidade de produtos e processos traz para a primeira prioridade o desenvolvimento de padrões analíticos e de certificação laboratorial compatíveis com as necessidades de um novo aparato regulatório. Tal exigência inicia-se nas análises de solos, passa pela defesa animal e vegetal e chega aos padrões de embalagens e de produtos finais processados. Isso implica numa mudança de lógica na qual os laboratórios de análises ocupam no novo conteúdo o lugar que antes era dos campos de multiplicação de sementes dos anos 1970.
Mais ainda, o desafio da pesquisa está em buscar vantagens de origem na forma de complementaridades que ampliem as possibilidades das atividades especializadas hegemônicas em dado território, com a construção de possibilidade para as diferentes potencialidades locais, de que uma cultura complementar seja associada a essa principal. Isto, numa agropecuária cuja produtividade está sendo multiplicada com insumos privados (inclusive os da genética) e a especialização produtiva se conforma na marca da ocupação territorial pelo próprio desenho do entorno das agroindústrias, dos 'packing houses' e dos armazéns das 'tradings'.
A presença de grãos nas áreas de renovação de cana não precisa ser uma opção única para todo o imenso território canavieiro paulista, bem como a ampla adoção de sistemas diferenciados de integração lavoura-pecuária que incrementem a produtividade de ambas. O axioma determinante do sucesso da complementaridade entre atividades agropecuárias consiste no aproveitamento de potencialidades regionais objetivas, que transformem vantagens comparativas em vantagens competitivas. ]
Isto, por si mesmo, define que o foco da pesquisa deve ser pensado e desenvolvido a partir do local, e não simplesmente como pesquisa no local típica do velho conteúdo do pacote tecnológico dos anos 1970. Isso exige prioridade para pesquisa regional, e não para pesquisa na região, que da ótica estrutural responde a perspectivas muito distintas e que não devem ser confundidas.
A questão da visão de totalidade da territorialidade da agricultura paulista já está dada, e não exige ação estadual explícita. Seu dinamismo deriva de políticas federais e dos estímulos do mercado internacional que conformam forças tão poderosas que retiram a capacidade estadual de encaminhar desdobramentos. Tanto assim que a carne bovina, o açúcar e álcool e o papel e celulose ganharam e vêm ganhando espaço geográfico a despeito do aparato estatal paulista.
Essa consiste na realidade das últimas décadas e tudo indica que vai continuar assim. O máximo que pode acontecer é que decisões governamentais desastrosas acabem por afugentar investimentos. Daí que a regulação da qualidade de produtos e processos seja feita por consenso, e não proibição que produza decisões sem conserto.
O desenvolvimento da agricultura paulista não se deu de maneira homogênea em todo território estadual. Ao contrário, há diferenças significativas entre as regiões por qualquer indicador de desenvolvimento econômico e social que seja utilizado na sua aferição. E a agricultura, como atividade estritamente associada à ocupação do espaço geográfico, joga papel fundamental na redução dessas disparidades.
Mais uma vez, o conteúdo do aparato estatal forjado nos anos 1960 joga contra essa prioridade de políticas públicas. E por duas razões. A primeira, o fato de que a esmagadora maioria da capacidade intelectual da Secretaria de Agricultura e Abastecimento esteja lotada no eixo das rodovias Anhanguera e Bandeirantes, onde estão os municípios paulistas de melhores indicadores de desenvolvimento econômico e social. Mais dramático ainda, mais de dois terços da capacidade técnica está localizada nas três grandes regiões metropolitanas, formando enormes vazios de presença pública nas regiões de piores indicadores econômicos e sociais.
A segunda razão decorre de que não basta haver estruturas regionais para que as regiões deprimidas se desenvolvam. Não foi por acaso que ficaram à margem do processo de desenvolvimento. Há que serem pensados, a partir das lógicas territoriais típicas dessas regiões deprimidas, estratégias de desenvolvimento que produzam um ciclo virtuoso com base em atividades que representem a estruturação de vantagens competitivas a partir de vantagens comparativas existentes ou pela superação de obstáculos estruturais identificados na realidade. E as potencialidades locais determinam essa possibilidade, notadamente se exploradas singularidades que possam conferir vantagens de origem.
Novamente, isso não faz parte do conteúdo do aparato estatal criado nos anos 1960. É preciso pensar projetos de desenvolvimento territorial que, mais que ações técnicas localizadas, englobem mecanismos de atração e de sustentação do investimento, criando não apenas novas estruturas produtivas locais, mas, principalmente, capacidade empresarial orgânica e compatível com o patamar mais elevado de desenvolvimento capitalista. Sem isso serão meros paliativos sem resultado.
Nessas regiões, sim, faz sentido um trabalho intenso de organização e extensão rural, associado a pesquisa local aplicada de adaptação de tecnologias. Para diferenças regionais tão extremas, há que se pensar grande, na amplitude das diferenças, se o objetivo consiste em reduzi-las ou elimina-las.
Por fim, a agricultura paulista precisa ser realmente uma prioridade política, na dimensão de sua representatividade, enquanto mais importante e especialmente mais distribuído setor da economia paulista. Dessa maneira, o Governo do Estado de São Paulo como um todo, na figura de seu Governador, deve ser mobilizado na defesa dos interesses dos agentes produtivos da agricultura estadual. Mais ainda que suas atribuições técnicas, o conteúdo do aparelho estatal estadual deve configurar-se como um produtor de idéias e de formulações de propostas de políticas nacionais de interesse dos brasileiros residentes em São Paulo.
Há que se fazer a hora e não deixar que aconteçam decisões federais que não contemplem os interesses da agricultura estadual. Trata-se do desenho de um novo conteúdo para que o aparelho estatal promova a construção de um novo ciclo virtuoso de desenvolvimento da agricultura com redução das diferenças de todos os matizes. E os recursos... devem ser dimensionados na magnitude e amplitude dos desafios perseguidos.1
1 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número 120/2006.
Data de Publicação: 18/12/2006
Autor(es): José Sidnei Gonçalves (sydy@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor