Florestas: novas opções de investimentos (investir no não-uso)

            A atividade florestal em São Paulo está  ingressando na etapa de sua maioridade. O Agronegócio Florestal Paulista - a cadeia produtiva que vai da semente ao consumidor final - tem um peso expressivo no emprego (quase 150 mil postos de trabalho); no produto e na renda (mais de R$ 7 bilhões anuais) da economia paulista1.
            Os segmentos mais organizados do setor (celulose/papel e chapas) possuem visão gerencial moderna e utilizam tecnologias de ponta. Mais de 16% do território estadual é ocupado por florestas - a segunda maior área ocupada do Estado, só perdendo para as pastagens -, podendo chegar a 25% ou 30%2 sem comprometer qualquer setor produtivo agropecuário; pelo contrário, reforçando-o.

Novos papéis das florestas

            A partir da Agenda 21 3 aprovada na Eco-92 4, o setor passou a ser considerado um componente fundamental do desenvolvimento sustentável, o que sem dúvida é um apelo de repercussões mundiais, notadamente nos mercados dos países da OCDE5. Produtos como filtro de água; seqüestro de CO2 atmosférico; proteção de hábitat; guardião de biodiversidade; fonte de combustível renovável e natural; e embelezamento de paisagens colocam as florestas como opções novas de investimentos no panorama da economia mundial, construindo uma imagem positiva para seus investidores.
            Esta visão está  intimamente ligada a conceitos atuais sobre qualidade e padrões de vida, que derivam dos chamados valores intangíveis da floresta, dentre os quais o seu não-uso. A par disso, as atividades florestais continuam com seus papéis clássicos de fornecedores de matéria-prima de inúmeros empregos e funções.
            Tais atividades, assentadas em longos ciclos de produção, geram postos de trabalho permanentes, colaborando para minimizar a crise estrutural do emprego, pois contribuem para fixar contingentes populacionais no meio rural. Assim, podem se constituir também numa alternativa à marginalidade que se sedimenta nas populações periféricas das grandes cidades.
            Em termos de geração de empregos, cada 10 hectares de florestas empregam um trabalhador, considerando as atividades de plantio, manutenção, exploração e utilização industrial (na fase de implantação, cada 4 hectares geram um emprego direto)1. Isto além de diversificar atividades que podem ser terceirizadas como viveiros, projetos, corte, transporte e classificação.
            Além do mais, utilizando rendimentos anuais sem consumir o estoque, a floresta garante fornecimento de matéria-prima indefinidamente. Isto interessa sobremaneira aos consumidores externos, que dependem de contratos de longo prazo e não possuem espaços para plantios em seus países.

Parceiros potenciais

  • O produtor rural
            O potencial econômico da atividade fica ainda mais evidente ao poder ser estendido, diretamente, no processo agroflorestal a quase 250 mil unidades produtivas agrícolas só no Estado de São Paulo. Esse verdadeiro exército de fazendeiros e sitiantes possui um estoque de terras de mais de 3,5 milhões de hectares2, constituído em sua grande maioria por solos com aptidão para uso florestal, cujos melhores rendimentos estão na silvicultura.
            As condições ecológicas do Estado favorecem uma alta produtividade florestal nessas terras: 30 toneladas por hectare/ano (50 estéreos por hectare/ano, no plantio de eucalipto), a baixos custos de plantio, exploração, transporte e mesmo de operações portuárias. O custo de produção pode ser estimado em US$ 9.00/m3, incluindo remuneração da terra e seguro, para um ciclo de produção de 10/12 anos.
            A adoção da atividade florestal por esses produtores, todavia, ainda encerra uma série de limitações, como falta de capital para aplicações de longo prazo; necessidade de obtenção de uma renda extra nos anos iniciais; e garantias de preço e de mercado, além de confiança no Governo e facilidades de pagamento de eventuais financiamentos. Essas limitações, no entanto, poderão ser perfeitamente contornadas em um processo integrado como proposto no transcurso desta reflexão.
  • O consumidor
            O consumidor de produtos e serviços florestais, por seu turno, forma um contingente muito maior que o dos potenciais produtores. Esses agentes, internos e externos, estão envolvidos com uma gama de mercadorias e de serviços bastante ampla e vêm incorporando, paulatinamente à sua demanda, os valores intangíveis das florestas, criando-lhes um mercado globalizado.
            Assim, o abastecimento irregular das matérias-primas; a incerteza do seu fornecimento no longo prazo; os custos de transporte; as condicionantes legais como reserva florestal obrigatória, reposição florestal e  áreas de preservação permanente, aliadas às questões do excesso de carbono; mudanças climáticas; destruição da biodiversidade e novas formas de turismo acabam se constituindo em fatores indutores a investimentos na área florestal. Esses segmentos, entretanto, carecem de capitais para imobilizar em terras para florestas "vis a vis" aplicá-los no setor industrial e comercial.
  • O técnico
            Ainda como agentes desse processo existem os profissionais ligados ao setor, que, com seu conhecimento técnico e sua capacidade de deslocamento, são elementos fundamentais como propulsores da terceirização da atividade. Movimentos da sociedade civil, cristalizados em associações, por exemplo, garantem um arcabouço técnico e agilidade de atuação que podem facilmente se associar a setores fornecedores de insumos e equipamentos, inclusive veículos.
            O envolvimento de órgãos públicos e universidades, de qualquer esfera e nível, através do seu potencial técnico, sua produção supletiva e até mesmo de eventuais condições operacionais é uma garantia de avanços tecnológicos consistentes no longo prazo.
  • As comunidades
            Por último, mas não menos importante, existe por parte das comunidades um desejo de melhoria que se manifesta pelo engajamento de Prefeituras no processo de busca de alternativas de desenvolvimento para seus municípios.

Os novos mercados florestais

            Existem atualmente excelentes condições, particularmente no Estado de São Paulo, para o desenvolvimento de uma atividade florestal vigorosa e inovadora do ponto de vista de oportunidades de investimentos e de adequação ambiental. O quadro desenhado revela com clareza que estão dadas as condições para uma verdadeira explosão de inversões nesse setor, que conjuga variáveis econômicas, sociais e ambientais coincidentes, com boas possibilidades de investimentos de longo prazo para redução do efeito estufa e geração de novas oportunidades em atividades relacionadas à floresta.
            A criação de um mercado supra-nacional caminha no sentido da complementaridade, consciente da interdependência que a questão ambiental tornou possível e presente. Assim, a queima de carbono excessiva no hemisfério norte pode vir a ser compensada pela captura desse superávit no sul, onde as condições de crescimento vegetativo das florestas são tais que nem mesmo vinte vezes mais superfícies boreais seriam suficientes para realizar tal tarefa.
            Está  brotando um mercado totalmente novo, no qual o principal produto é a melhoria do ambiente através da floresta e do seu crescimento. Este é um conceito que vai além dos princípios "poluidor-pagador" ou "consumidor-repositor", criando uma dinâmica de longo prazo que traduz, na prática, pressupostos do desenvolvimento sustentável, dado que se baseia num material renovável e que utiliza quase que apenas a energia solar.
            Nesse ambiente de transformações, existe uma busca incessante de oportunidades para investir capitais que necessitam prazos longos em face de exigências e características próprias. Aí se encontram os fundos de previdência, as carteiras de resseguros, os pecúlios privados e os títulos de dívidas, além de pequenos investidores em busca de solidez para o futuro.
            Existem também nessas condições aqueles investimentos oriundos das obrigações internacionais decorrentes dos acordos firmados no bojo da Agenda 21 3. Entre eles, o Tratado da Biodiversidade6 e a Convenção Climática7 têm papel preponderante, sem desconsiderar o Acordo sobre as Florestas8 que, mesmo pendente, tem peso significativo na opinião pública dos países desenvolvidos e pode definir aplicações.

Uma política de incentivos

            A situação colocada até agora - produtores receptivos, com condições materiais propícias; consumidores querendo se garantir quanto ao fornecimento de longo prazo, aliado a capitais procurando um nicho para se alocar; profissionais e organizações disponíveis com conhecimento técnico e vontade e, ainda, comunidades abertas a novas oportunidades - cria condições propícias para investimentos florestais em São Paulo.
            Existe uma conjugação de prazos, capitais, mercados, segurança e promoção institucional inusitada que pode envolver desde o aplicador externo, passando pela intermediação da rede bancária nacional e das bolsas de valores e mercadorias, até os produtores rurais espalhados por todo o território estadual.

O suporte institucional

            Nesse quadro é que se coloca a necessidade de um instrumento regulador dessas atividades e indutor de um processo de longo prazo. A idéia-força de um plano nesse sentido é a da parceria que, ao permitir a criação de condições de potencializar ações, reduzindo custos e tempos, multiplica a geração de novas oportunidades de investimentos.
            O esquema geral de funcionamento dessa verdadeira revolução produtiva no espaço rural do Estado pressupõe, portanto, quatro agentes principais: o produtor rural; o consumidor de matéria-prima florestal; o investidor e o técnico. As relações entre eles passam, necessariamente, pelas suas respectivas organizações, que em São Paulo atingiram um grau de complexidade e sofisticação elevado. Isto permite o estabelecimento de contratos bem elaborados entre as partes e garantia de perenidade nesses relacionamentos.
            A floresta, ao vender um produto que é o seu próprio crescimento e a sua conservação, ou seja, sua existência, passa a ser um conceito que não pode ser negligenciado neste momento de redefinições das relações econômicas internacionais. Essa opção é particularmente atraente para empresas que buscam aliar sua imagem à da contemporaneidade, traduzida por preocupações ambientalistas, atitudes participativas em termos comunitários e gestão descentralizadora; enfim, uma postura moderna.
            Os setores que possuem maior potencial de engajamento se situam na esfera industrial (celulose/papel/embalagens, químico, petróleo, álcool, borracha, automobilístico e mineração/metalurgia/siderurgia, além de têxtil, moveleiro, alimentos e construção civil), bem como na esfera de serviços (bancário/financeiro, seguros, fundos de pensão e previdência, mercados acionário e de "commodities"). Dentre eles, alguns têm interesse direto na matéria-prima a ser produzida e, portanto, um envolvimento maior em investimentos próprios. Outros aplicariam institucionalmente com o propósito de retorno de longo prazo, aliando suas empresas àquelas imagens contemporâneas como estratégia de "marketing".
            Enfim, aglutinação de objetivos existe; basta saber direcioná-la e torná-la realidade.9

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1 Agronegócio florestal em São Paulo e o mercado de carbono. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=7264
2 Plano de Desenvolvimento Florestal Sustentável, Fundação Florestal de São Paulo /1993
3 Documento produzido e aprovado na Rio 92 que propõe balizamentos para o desenvolvimento no próximo século
4 Reunião das Nações Unidas para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente, Rio de Janeiro, 1992
5 Organização que reúne os sete principais países desenvolvidos do Mundo
6 Tratado da Biodiversidade, Rio–92
7 Convenção sobre o Clima Protocolo de Kyoto
8 Tratado sobre as Florestas, Rio–92
9 Artigo registrado sob número HP-103/2006.

Data de Publicação: 11/10/2006

Autor(es): Eduardo Pires Castanho Filho (castanho@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor