As análises sobre as perspectivas brasileiras para a cadeia de produção de algodão1 na safra 2006/2007 apontam duas tendências divergentes. Há de um lado algumas opiniões pessimistas e, por outro, previsões mais otimistas em relação à produção, exportação e consumo de pluma de algodão nacional diante da atual conjuntura do mercado internacional.
Deve-se ter em mente que um futuro promissor, para os próximos anos, dependerá em grande parte do posicionamento do país no cenário mundial, da situação político-econômica interna e das políticas agrícolas e setoriais - caso do algodão - a serem implementadas na federação.
As projeções para o agronegócio brasileiro e mundial, sistematizadas em recente estudo realizado por técnicos do governo brasileiro2, indicam um crescimento para a produção e o consumo de algodão a uma taxa anual de 1,5%, com previsão para atingir 23,1 milhões de toneladas no ano de 2010. O estudo teve como base dados da Organização para a Agricultura e a Alimentação (FAO)3, da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE)4 e do Instituto de Pesquisa em Política de Agricultura e Alimentação (FAPRI)5.
A área colhida com algodão deve alcançar no mundo, em 2015/2016, os 37,453 milhões de hectares, enquanto a produção mundial deverá chegar a 28,774 milhões de toneladas (gráficos 1 e 2).
Gráfico 1- Projeções da área colhida com algodão
Fonte: Elaborado a partir de dados do FAPRI – Cotlook, Ltd., Liverpool, England
Gráfico 2 - Projeções da produção mundial de algodão
Fonte: Elaborado a partir de dados do FAPRI – Cotlook, Ltd., Liverpool, England
O comércio mundial de algodão deverá crescer em torno de 1% ao ano para o mesmo período, com os Estados Unidos se mantendo na liderança das exportações (gráfico 3). A esperada expansão da demanda mundial, sobretudo da China (gráfico 4), se dará em razão do crescimento econômico e populacional em paralelo às novas tecnologias e sistemas de produção.
Gráfico 3 - Projeções para as exportações de algodão
Fonte: Elaborado a partir de dados do FAPRI – Cotlook, Ltd., Liverpool, England
Gráfico 4 - Projeções para as importações de algodão
Fonte: Elaborado a partir de dados do FAPRI – Cotlook, Ltd., Liverpool, England
O estudo revela ainda que, de acordo com o FAPRI, a área cultivada com algodão no Brasil deverá ir para 1,7 milhão de hectares entre 2014 e 2015, com a produção alcançando 2,1 milhões de toneladas e as exportações saltando para 1,1 milhão de toneladas. Contudo, o país mantém a pequena participação no comércio internacional.
Já as projeções realizadas pela Assessoria de Gestão Estratégica (AGE), do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), apontam um aumento da produção, de 1,5 milhão de toneladas em 2005/2006, para 2,4 milhões de toneladas em 2014/2015, com crescimento anual de 6,53%. As exportações ficariam próximas de um milhão de toneladas para o mesmo período.
O possível aumento do uso das fibras naturais, especialmente de algodão, como principal produto na composição da cadeia dos têxteis e vestuários é um dos temas em pauta nas discussões sobre o agronegócio. Uma das razões para o novo cenário seria o aumento nos preços do petróleo, a matéria-prima utilizada na fabricação de tecidos sintéticos e o principal concorrente das fibras naturais.
Daí as boas perspectivas para o algodão no mercado internacional e, por conseguinte, para a produção e a participação do Brasil. Pelo menos, é o que tem sido apontado por especialistas do setor na mídia, bem como foi abordado no evento “Perspectivas para o Agribusiness em 2006 e 2007”, promovido pela Bolsa de Mercadorias e Futuros (BM&F) no último dia 04 de maio.
Como bem mostrou no evento o palestrante Daniel Bachner, diretor financeiro da Syngenta, as perspectivas mundiais das próximas safras para a pluma de algodão são favoráveis, sobretudo para o hemisfério sul. A maior instabilidade dos preços dos produtos sintéticos, em comparação com as fibras naturais, tem aberto novas oportunidades mundiais para as fibras de algodão. Soma-se o crescimento do consumo, por exemplo, com o uso nas indústrias têxteis da combinação poliéster/algodão na fabricação de tecidos e vestuários.
No entanto, a realidade brasileira é bem diferente. As análises mostram uma redução da área e da produção algodoeiras na próxima safra, até mesmo nos mais dinâmicos estados produtores - com exceção da Bahia -, ao lado de um consumo relativamente estável.
Entre os problemas apontados como motivo da atual crise que o setor enfrenta está o aumento nos custos de produção (alta nos preços dos insumos e do combustível) diante da queda nos preços da pluma. Os preços são afetados pela variedade plantada e a qualidade do algodão colhido, bem como pelos fortes subsídios governamentais por parte de países como os Estados Unidos.
Além disso, reforçam o panorama negativo a questão dos juros internos, as dívidas contraídas pelos agricultores e, principalmente, as restrições cambiais. Ainda assim, as perspectivas futuras para o país são favoráveis tendo em vista o cenário mundial. Ao contrário do pensamento dos órgãos e entidades com preocupações sócio-ambientais, o plantio de sementes transgênicas é tido por alguns agentes do setor como uma possível saída para a atual crise.
Outros fatores que comprometem o desempenho do país são o déficit de armazenagem, a logística mais cara e um período de vendas muito concentrado, como lembrou Marcus Vinicius Menoita, da empresa MAEDA. Para ele, a inserção dos agricultores nas novas formas de financiamento, a partir da lei 11.076 (“Novos Títulos do Agronegócio”), poderia alargar o período de vendas e dar maior liquidez ao setor.
Já Antonio Vidal Esteve, da EISA, observou que perante o aumento no consumo mundial de algodão, principalmente por parte dos países asiáticos, o Brasil tem a vantagem em relação à qualidade da fibra, por ser um dos poucos países do mundo a realizar a colheita de forma mecanizada, o que garante maior uniformidade nas fibras.
Os críticos ainda alegam que, para a efetivação do aumento da participação do país no mercado cotonicultor, há necessidade de uma melhor definição de políticas públicas ao nível do governo federal. As políticas para o setor têm de ter em vista não apenas o cenário de curto e médio prazos, mas especialmente o de longo prazo.
E segundo Hélio Tolini, da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (ABRAPA), o veículo para realizar esse debate seria a Câmara Setorial do Algodão junto ao MAPA. O objetivo a ser alcançado seria o de traçar um plano agrícola de longo prazo para além dos atuais e insuficientes planos de safras.
Essa é uma discussão importante porque pode melhorar a participação do Brasil no cenário internacional e, conseqüentemente, a situação de empresários agrícolas e trabalhadores rurais da cadeia de algodão, como também da indústria têxtil e de vestuários e dos próprios consumidores finais dos produtos confeccionados com algodão.
Parece claro que uma perspectiva de mercado favorável para as diferentes regiões do país dependerá, obviamente, das especificidades e características físico-naturais das áreas produtoras – especialmente as condições climáticas -, da conjuntura político-econômica internacional e nacional, dos preços e demanda por pluma de algodão, da política agrícola escolhida pela nação brasileira e das políticas estaduais para o setor. E, principalmente, que haja uma solução para os efeitos das atuais taxas de câmbio que tanto têm impactado a agricultura.
Ressalte-se que as políticas públicas definidas na escala federal precisam estar vinculadas a - e em consonância com – medidas adotadas em outras esferas e escalas político-administrativas, condição para um equilíbrio nos interesses regionais e setoriais.6
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1Dados coletados no Seminário “Perspectivas para o Agribusiness em 2006 e 2007”, BM&F, 04/05/2006.
2 Revista de Política Agrícola, n º 1, 2006, Secretaria de Política Agrícola do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
6 Artigo registrado no CCTC-IEA sob número HP-46/2006.