Custo de Produção da Borracha Natural no Estado de São Paulo


A conjuntura econômica da produção de borracha natural no Brasil apresenta uma dinâmica complexa, marcada por desafios e oportunidades. A produção tem sido afetada por quedas nos preços internacionais e domésticos, comportamentos climáticos atípicos, aumento dos custos de produção e falta de mão de obra.

No estado de São Paulo, maior produtor nacional, tem ocorrido perdas de área, produção e produtividade. Dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA)2 apontam que está previsto, para a safra em curso, área total plantada em 115,4 mil hectares, o que representa declínio de 3,8% em relação ao espaço ocupado na safra anterior. Desse total, 102,5 mil hectares referem-se a área em produção (-2,6%) e 12,9 mil hectares à área em formação (-13,0%). A produção caiu de 282,1 mil toneladas em 2022/23, para 273,5 mil toneladas em 2023/24, um recuo significativo para a heveicultura paulista (3,2%).

Os custos de produção são fundamentais para embasar a alocação de recursos e a criação de incentivos concedidos pelas políticas públicas, tais como a creditícia (para cobrir as despesas com os processos produtivos e a de garantia de preços mínimos ao agropecuarista etc.). Sob o ponto de vista empresarial, os custos de produção são importantes para avaliar a competitividade e viabilidade de um processo produtivo.

Assim, com a situação evidenciada em relação a área e produção da cultura da seringueira no estado de São Paulo, levantou-se o custo de produção da cultura em dez propriedades agrícolas com vistas a compor um sistema de produção representativo da região noroeste do Estado de São Paulo. Em seguida elaborou-se uma análise de indicadores econômicos para averiguar a rentabilidade e a situação econômica da atividade3.

Utilizou-se a metodologia de Custo Operacional do Instituto de Economia Agrícola4 que preconiza a concepção de curto prazo, sendo que as remunerações do capital, terra e empresário não são computadas, supondo-se que isso se fará pela renda líquida.

A estrutura de custos do sistema é composta de:

a)  custo operacional efetivo (COE): despesas efetuadas com mão de obra, encargos sociais (40% sobre o valor da despesa com mão de obra), operações de máquinas/equipamentos, veículos e materiais consumidos ao longo do ciclo da cultura; e

b)  custo operacional total (COT): refere-se ao COE acrescido da contribuição à seguridade social rural (CSSR), -1,5% do valor da renda bruta; depreciações tanto de máquinas quanto do seringal; juros de custeio à taxa de 8,0% a.a. sobre o COE; e despesas com serviços de assistência técnica.

Os indicadores de análise de resultados econômicos utilizados são os seguintes:

·      Receita bruta (RB): produção x preço;

·      Margem bruta (MB): dividida pelos custos tanto para o COE como para o COT, em percentagem;

·      Ponto de equilíbrio (PE), que é a produção necessária para remunerar os custos;

·      Lucro operacional (LO), que é a receita bruta menos o COT;

·      Índice de lucratividade (IL), que é a relação percentual entre LO e MB5.

Na região Noroeste do Estado de São Paulo, pelo Sistema de produção D4 (é aquele onde o sangrador realiza a sangria da árvore a cada quatro dias), apurou-se o volume médio de 2.800kg de coágulo/por hectare. O COE para o quilograma de coágulo foi estimado em R$5,88 e R$16.454,64/ha. O COT atingiu o valor de R$19.928,68/ha ou R$7,12 por kg de coágulo (Tabela 1).


O item de maior participação percentual no custo de produção total (COT) é o da mão de obra, que soma 35,2% (comum, sangria, tratorista e fiscal), seguido dos custos dos encargos sociais (14,1%) e transporte de pessoal (7,9%). A seguir, as maiores despesas são com operação de máquinas (10,4%), defensivos (6,9%) e adubos (5,8%). Note-se que da parcela de custos fixos, a depreciação do seringal assume 7,1% das despesas. Esse valor se justifica pelo alto custo de implantação da cultura, base de cálculo desse item que tem sido onerado pelos custos da mecanização impactados pela alta nos preços das máquinas e combustíveis e seus derivados6.

Conhecendo os itens que mais oneram os custos de produção, pode o heveicultor exercer maior controle sobre o uso de insumos substitutos e preços de prestadores de serviços e, assim, determinar prioridades em sua gestão.

No caso da seringueira, observa-se que os gastos associados ao uso da mão de obra representam 42,7% do COE, e que ao somar-se aos de transporte de pessoal atinge 59,8% do COE, atingindo a participação de 69,4% quando são imputados os valores dos encargos sociais, incorrendo nesse fator de produção o maior impacto nos custos de produção da borracha. Deve-se observar que somente as despesas com a sangria oneram a produção em 25,0% e o sangrador é o trabalhador que passa maior tempo em contato com a planta. Essa atividade é responsável pela obtenção do produto final.

Observa-se o aumento da participação percentual dos itens operações de máquinas, defensivos, adubos e depreciação do seringal nos custos de produção da seringueira, que têm sofrido forte impacto de reajustes ocorridos nos preços dos insumos utilizados na produção do coágulo. A alta do dólar, em relação ao real, bem como o aumento nos custos internacionais de matérias-primas e transporte estão entre as causas da elevação do preço os insumos agrícolas no Brasil7.

Os indicadores de rentabilidade foram calculados para a produtividade média observada na pesquisa de campo de 2.800kg/ha e com os preços médios recebidos pelos produtores de borracha do estado de São Paulo em outubro de 2024, publicados pelo IEA (R$4,96/kg)8 e o preço mínimo de garantia do governo federal estabelecido pelo Ministério da Agricultura e Pecuária do Brasil (MAPA), através da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab) (R$4,05/kg), a partir de julho de 20249 (Tabela 3).

Analisando-se os indicadores de rentabilidade para a produção da borracha natural observa-se que os valores são negativos para os dois diferentes preços recebidos pelos heveicultores. O valor do preço médio recebido pelos produtores paulistas, levantado pelo IEA, de R$4,96/kg de coágulo (DRC 53%), não é suficiente para remunerar nenhum nível de custo, tão pouco o Preço Mínimo de R$4,03/kg. Essa situação já foi evidenciada em outras publicações e na safra atual se mostra bastante severa, acentuando a crise pela qual passa o setor10.

 

Os resultados negativos apresentados na análise de desempenho econômico acima foram impactados pela integração de dois fatores: alto custo de produção e preços de mercado que não conseguem remunerar os fatores de produção. Ao se observar os valores obtidos, pela margem bruta COE, nota-se que a renda obtida não cobre tais gastos, o que implica certamente na falta de capital de giro para realizar todas as operações de manejo do seringal, levando a perda de produção e queda na produtividade devido ao preço recebido. Outra consequência observada foi a erradicação de seringais em fase produtiva e migração para outras culturas, como a cana-de-açúcar e o abandono dos seringais11.

A figura 1 mostra os preços recebidos pelos produtores nos anos de 2023 a 2025. Observa-se que o ano de 2023 apresentou valores médios recebidos pelos produtores menores que R$3,00/kg de coágulo no DRC53% (coágulo virgem). Tais preços mostraram recuperação a partir de agosto de 2024 na entressafra. A partir do mês de setembro de 2024, princípio da safra em andamento, iniciou-se um movimento de aumento dos preços (estimulado por perdas de produção nos países asiáticos, maiores produtores mundiais). 

 

Essa tendência de alta nos preços permaneceu até o mês de janeiro de 2025, quando os preços nas bolsas internacionais mantiveram-se em patamares acima de US$2,00/kg do produto importado, que é utilizado na elaboração do preço referência de importação da borracha natural de acordo com o índice IEA/CNA, que orienta a referência da formação de preços no Brasil. Com a recuperação da produção asiática e menor demanda chinesa, os preços dos contratos despencaram, aliado a esse fato a queda nos fretes internacionais e a valorização do Real ocorrida nesse período. A referência de preço para o mercado nacional também baixou, refletindo na queda dos preços no campo, quando se observa na Figura 1 a tendência de valores em baixa a partir do mês de fevereiro.

Por outro lado, observa-se que houve aumento das importações de borracha natural pelo Brasil. Embora se saiba que a produção não atenda a demanda nacional, os dados mostram que a quantidade da borracha importada do tipo tecnicamente especificada – TSNR, semelhante ao Granulado Escuro Brasileiro – GEB10, matéria prima industrial, aumentou nos quatro primeiros meses de 2025 em 12,2% em relação a 2023 e 50% em relação a 2024, no mesmo período (Figura 2).

 

 

Os principais consumidores de borracha natural no Brasil são a indústria de pneumáticos e de artefatos de borracha (como itens automotivos, luvas, artigos médicos, etc). Cerca de 80% da borracha produzida no país vai para fábricas de pneus, o que evidencia o vínculo estreito entre a heveicultura nacional e o setor automobilístico. Dado o caráter estratégico da borracha natural, é necessário manter uma base de abastecimento doméstica para os setores demandantes, sendo imprescindível que a produção nacional e paulista se mantenham no longo prazo, para que não se dependa exclusivamente do material externo. Ao se observar a figura 3 evidencia-se que o crescimento das importações não parece ter sido afetado pelo alto valor do produto importado.

Nos quatro primeiros meses de 2025 o valor das importações de borracha natural tecnicamente especificada aumentou em 57,3% em relação a 2023 e 95,2% em relação a 2024, no mesmo período. No mês de abril de 2025 o valor FOB da mercadoria atingiu US$2,17/kg, conforme os dados disponíveis no Sistema ComexStat do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços.

Apesar de as estimativas apontarem para a recuperação da produção paulista, mesmo com perda da área, no ano de 2025, há ainda muitos desafios a serem enfrentados pelos produtores de borracha natural: a eminente pressão baixista dos preços recebidos, pois analistas internacionais apontam estabilidade das cotações das bolsas asiáticas que formam o preço do produto, entre US$1,65 e US$1,75/kg para os próximos anos; o aumento dos custos de produção, incluindo mão de obra, encargos sociais e transporte, tem impactado a rentabilidade da atividade, dificultando o investimento em melhorias e tecnologias; a falta de mão de obra qualificada e a migração de produtores para outras atividades têm reduzido a produção e a capacidade de investimento, entre outros10.

No geral, a produção de borracha natural no Brasil e em São Paulo enfrenta desafios, mas também apresenta oportunidades para o desenvolvimento e crescimento do setor. A implementação de políticas públicas, o uso de tecnologias, a busca por novas estratégias de produção e a remuneração pelos serviços ambientais prestados pela cultura podem impulsionar o crescimento do setor e garantir a sustentabilidade da atividade para as próximas décadas.


1Este trabalho contém similaridades textuais com artigos anteriores de mesma metodologia, pois é necessário que determinados trechos sejam descritos novamente para manter a consistência e a comparabilidade das informações ao longo do tempo.

 

2MIURA, M. et al. Previsões e estimativas das safras agrícolas do Estado de São Paulo: levantamento parcial do ano agrícola 2022/23 e levantamento final do ano agrícola 2023/24, novembro de 2024. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 20, n. 3, p. 1-15, mar. 2025. Disponível em: https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/TerTexto.php?codTexto=16257. Acesso em: 11 maio 2025.

 

3Outros dados relativos a metodologia e o levantamento de campo podem ser obtidos em:  OLIVEIRA, M. D. M.; GONÇALVES, E. C. P.; NINA, L. C. D.; SOBRINHO, J. J.; PUTZ, P. Custo de implantação, produção e rentabilidade do cultivo da seringueira no Estado de São Paulo, 2016. Informações Econômicas, São Paulo, v. 47, n. 1, p. 31-49, jan./mar. 2017. Disponível em: https://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/ie/2017/tec3-0117.pdf. Acesso em: abr. 2025.

 

4MATSUNAGA, M. et al. Metodologia de custo de produção utilizada pelo IEA. Agricultura em São Paulo, São Paulo, ano 23, t. 1, p. 123-139, 1976. Disponível em: https://www.iea.sp.gov.br/out/verTexto.php?codTexto=11566. Acesso em: 29 jul. 1976.

5MARTIN, N. B.; SERRA, R.; OLIVEIRA, M. D. M.; ANGELO, J. A.; OKAWA, H. Sistema integrado de custos agropecuários – CUSTAGRI. Informações Econômicas, São Paulo, v. 28, n. 1, p. 7-28, jan. 1998. Disponível em: https://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/ie/1998/tec1-0198.pdf. Acesso em: jan. 1998. 

 

6OLIVEIRA, M. D. M.; GONÇALVES, E. C. P. Custo de implantação e formação da cultura da seringueira no Estado de São Paulo. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 20, n. 5, p. 1-7, maio 2025. Disponível em: https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/TerTexto.php?codTexto=16289. Acesso em: 27 maio 2025.

 

7EXAME AGRO. Aumento de custos, menos crédito e mais exportação: como o dólar alto afeta o agro brasileiro. [S. l.]: Exame, 2025. Disponível em: https://exame.com/agro/aumento-de-custos-menos-credito-e-mais-exportacao-como-o-dolar-alto-afeta-o-agro-brasileiro/. Acesso em: 12 maio 2025.

 

8INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Banco de dados: preços médios mensais recebidos pelos agricultores. São Paulo: IEA, 2025. Disponível em: https://www.iea.agricultura.sp.gov.br/out/Bancodedados.php. Acesso em: 2 maio 2025.

 

9BRASIL. Ministério da Agricultura e Pecuária. Portaria MAPA nº 700, de 15 jul. 2024: normas específicas de borracha natural, safra 2024/2025. Brasília, DF: MAPA, 2024. Disponível em: https://www.conab.gov.br/images/arquivos/moc/59_NORMAS_ESPECIFICAS_DE_BORRACHA_NATURAL_SAFRA_2024_2025.pdf. Acesso em: 15 maio 2025.

 

10OLIVEIRA, M. D. M.; GONÇALVES, E. C. P. Custo de produção e rentabilidade da produção de borracha natural: uma análise em tempos de crise. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 19, n. 5, p. 1-8, maio 2024. Disponível em: https://iea.agricultura.sp.gov.br/out/TerTexto.php?codTexto=16206. Acesso em: 10 maio 2025.

 

11PAINEL ABERTO. Análise: correção de preços no mercado da borracha natural. [S. l.]: Painel Aberto, 2025. Disponível em: https://www.painelaberto.com.br/analise-correcao-de-precos-no-mercado-da-borracha-natural/. Acesso em: 9 maio 2025. 

 

Palavras-chave: custo de produção, seringueira, borracha natural, custo de borracha.

 

 

 

 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

OLIVEIRA, M. D. M.; GONÇALVES, E. C. P. Custo de Produção da Borracha Natural no Estado de São Paulo. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 20, n. 6, p. 1-9, jun. 2025. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 03/06/2025

Autor(es): Marli Dias Mascarenhas Oliveira (marlimascarenhasoliveira@gmail.com) Consulte outros textos deste autor
Elaine Cristine Piffer Gonçalves (elaine.piffer@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor