Derretimento das Cotações Futuras Traz Incertezas aos Cafeicultores Brasileiros


A economia brasileira alcança o segundo semestre do ano numa perspectiva muito mais favorável comparativamente ao semestre que o antecedeu. Convergem opiniões de que o surpreendente crescimento econômico associado com medidas de ajuste fiscal (arcabouço), a manutenção da meta de inflação em 3,0% e o consenso em torno da reforma tributária, possuem potencialmente a capacidade de prover a necessária estabilidade para a retomada dos investimentos, projetando ciclo de crescimento para a economia que se reflete no mercado de ações e na valorização do real (Figura 1). Em junho de 2023, a moeda brasileira exibiu trajetória sustentada de elevação frente ao dólar, situando-se na média do mês em R$4,84/US$.

Nem mesmo o ciclo de alta das taxas de juros promovidas pelos bancos centrais dos EUA e da UE impediram a apreciação do real. A escalada dos juros internacionais em mão contrária do que espera no Brasil assegura que o país se desassocia do padrão “voo de galinha” para um ciclo de expansão duradoura.

Na Bolsa de Nova York, em que são negociados os contratos futuros de café arábica, em junho de 2023, observou-se persistente queda nas médias semanais para as cotações futuras (Figura 2). A média da cotação em segunda posição para a primeira semana do mês de US$¢181,21/lbp recua a US$¢161,64 para a média da quarta semana na mesma posição futura, ou seja: queda de 10,80% no mês. Tal derretimento das cotações futuras reflete, em parte, a percepção que, com mais de 90% e de 50% do conilon e arábica colhidos respectivamente, o fluxo de abastecimento não corre risco de estresse como, ainda, contribuirá para a recomposição de estoques, especialmente para os investidores que creem que a safra brasileira superará os 65 milhões de sacas na atual temporada. Acrescente-se a essa queda a valorização do real que atua pressionando as cotações.

 

Em São Paulo, no principal cinturão cafeeiro de arábica, regional da CATI de Franca, os preços recebidos pelos cafeicultores na média do mês de junho foi R$962,22/sc.2. Todavia, houve forte desvalorização na última semana do mês, fechando em 30/06 a R$850,00/sc. Tal cotação se aproxima do custo de produção, especialmente para os cafeicultores que conduzem lavouras em sequeiro, exibindo produtividade média inferior a 25 sc./ha. Nesse contexto, e presumindo que ocorrerá El Niño de moderado a forte, há nesse momento forte estímulo para a poda de lavouras visando reduzir o custo de produção.

Em Londres, as cotações futuras do robusta exibiram declínio acompanhando a queda observada no arábica, algo esperado dado o grau de substitubilidade que possuem ambos os produtos na constituição dos blends internacionais (Figura 3). Ainda que o Vietnã tenha restringido seus embarques e o conilon brasileiro esteja quase que integralmente sendo consumido no mercado interno, as cotações não encontraram sustentação ao longo do mês. Na média da quarta semana ocorre o chamado efeito manada, pois as cotações despencam acentuadamente na média da semana para as posições mais à frente do calendário.

 

Contabilizando-se o número de contratos futuros comprados e vendidos na Bolsa de Nova York em junho de 2023, constata-se que a pressão de vendas por parte dos fundos e grandes investidores se intensificou após a terceira semana do mês, revertendo a tendência que até então pesava a favor dos comprados (Tabela 1). Esse movimento dos investidores foi o principal responsável pelas cotações caírem tão fortemente na segunda metade do mês. Dos 21 pregões em que houve negócios em NY, apenas em seis deles as cotações oscilaram positivamente, traduzindo no movimento de papéis o sentimento prevalecente entre os investidores do mercado futuro do produto.

 

 

 

Os embarques totais de café (verde, torrado e moído e solúvel) exibem queda no período janeiro a maio, comparativamente, ao mesmo período do ano anterior, uma vez que, em 2023, contabilizam-se 13,58 milhões de sacas exportadas, enquanto que, entre janeiro a maio de 2022, os embarques somaram 16,82 milhões de sacas, ou seja: 19,90% de queda (3,24 milhões de sacas)3. Tal diminuição deveria repercutir na formação de preços no mercado internacional, porém, aparentemente, ainda não é fato que preocupe os interessados no produto que observam o derretimento das cotações sem virar a chave para a posição compradora.

A formação de El Niño de moderada à forte intensidade poderá trazer estiagens prolongadas ao início do período chuvoso nos cinturões de arábica de mais baixa latitude (cerrado mineiro e Bahia) e para o robusta de Rondônia. A esperada safra recorde de 2023/2024 poderá não se concretizar, trazendo ainda mais volatilidade para a formação dos preços, pois no Brasil esgotaram-se os estoques de passagem e na ICE houve declínio acentuado dos estoques certificados naquela bolsa.


1O autor agradece pelo trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido pelo agente de apoio à pesquisa científica e tecnológica do IEA, o analista de sistemas Paulo Sérgio Caldeira Franco.

 

2CIAGRI. Preços médios diários recebidos pelos produtores. 2023. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/BancoDeDados/PrecosDiarios/Recebidos. Acesso em: 7 jun. 2023.

 

3CECAFE. Conselho dos exportadores de café do Brasil. 2023. Disponível em: https://www.cecafe.com.br/. Acesso em: 7 jul. 2023. 

  

Palavras-chave: mercado futuro, cotações do café, Bolsa de Valores.

 

 

 

 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

VEGRO, C. L. R. Derretimento das cotações futuras traz incertezas aos cafeicultores brasileiros. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 18, n. 7, jul. 2023, p. 1-5. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 14/07/2023

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor