Os Preços dos Ovos e a Diminuição do Poder de Compra do Salário Mínimo no Estado de São Paulo durante a Pandemia da Covid-19

 

A inflação é o aumento dos preços de bens e serviços causada por pressões de demanda e aumento nos custos, entre outros fatores (como emissão de papel-moeda e diminuição da taxa de juros). Trata-se de um conceito importante em nosso dia a dia, porque diz respeito a uma diminuição no poder de compra da moeda. A inflação passou a ser uma realidade em várias economias do mundo no decorrer da pandemia da covid-19, atingindo dos países mais desenvolvidos aos com maior nível de pobreza1.

Para se compreender o efeito da inflação, primeiro há necessidade de entender o impacto da alta nas commodities, produtos que servem como a matéria-prima para fabricação de alimentos, como é o caso do milho e da soja, que são cotadas em dólar, e que são insumos para a fabricação de rações e posteriormente a produção de ovos.

De acordo com Costa2, com a alta das commodities se privilegia o lucro que o agronegócio pode gerar com a exportação dos produtos em detrimento do mercado interno do país. Ela pontua que o equilíbrio entre a exportação e o armazenamento de alimentos para o consumo da população local é um dos fatores que ajudam a estabilizar os preços dos alimentos. Contudo, o cenário de crise que o Brasil vivencia está tornando todo o processo, desde a produção até o consumo final, mais caro, chegando aos preços observados nos mercados.

O setor de alimentos se apresenta como um dos que têm sofrido os maiores impactos, com gargalos que atingem elos inteiros das cadeias de produção, desde o suprimento de insumos até o consumidor final no varejo3.

Analisando-se a cadeia de produção de ovos no estado de São Paulo, identifica-se um movimento no qual ocorreu a diminuição do poder de compra da população, o aumento do desemprego e a queda na renda, direcionando fluxos de consumo substitutos das carnes (principalmente a bovina) para os ovos4. Em função do exposto, este trabalho teve como objetivo apresentar a evolução do movimento de preços no mercado de ovos paulista, demonstrando os repasses dos reajustes nos principais elos da cadeia de produção, finalizando com a abordagem da relação entre o salário mínimo e sua capacidade de compra diante da inflação no varejo do produto.

Para realização deste estudo, as estatísticas de preços foram obtidas no banco de dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA) da Secretaria da Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo5.

Como um indicativo da evolução dos custos de produção das granjas no território paulista, foram calculadas as relações de troca insumo-produto entre milho, soja e ovos de setembro de 2015 a setembro de 2021.

Também foram levantados os preços dos ovos no atacado e no varejo, com ênfase para o intervalo compreendido entre os meses de setembro de 2019 e setembro de 2021.

No caso do salário mínimo, considerou-se a tabela regional sancionada em 2007 pelo estado de São Paulo sob formulação da Secretaria de Desenvolvimento Econômico.

De setembro de 2015 a setembro de 2019, as agregações nos preços dos ovos atingiram patamares de reajustes maiores (+36,04%) que os principais insumos que compõem a dieta alimentar das poedeiras. Nesse intervalo, milho e soja apresentaram aumentos respectivos de +30,07% e +13,73% (Figura 1).

 

Analisando-se isoladamente as relações de troca insumo/produto nos cinco anos iniciais na série apresentada (Figura 1), nota-se que o melhor momento para os avicultores de postura paulista foi o ano de 2017.

A tabela 1 apresenta as relações de troca entre insumos e produtos no período 2015 a 2021.

 

 

Observa-se no levantamento feito (Tabela 1) que, no ano de 2017, no mês de setembro, a capacidade de compra foi 30 dúzias de ovos vendidos em torno de 3,63 sacas de milho (60 kg) e de 1,38 saca de soja (60 kg).

Já nos últimos dois anos (2020 e 2021), com o advento da pandemia de covid-19, a desestruturação do mercado de suprimento de insumos, aprofundada pela valorização do dólar (que baliza os preços da composição das rações da avicultura), diminuiu as margens obtidas pelas granjas de postura no estado de São Paulo.

A tabela 2 apresenta os preços dos ovos pagos ao produtor, no atacado e varejo da capital, no estado de São Paulo. Houve repasses de reajustes de preços em todos os elos da cadeia de ovos vigentes em terras paulistas, mas observa-se que os aumentos tanto do atacado quanto do varejo não foram repassados na totalidade no comparado com os verificados no elo anterior.

 


Daí se verifica que as margens do atacado de outubro de 2019 para outubro de 2021, em relação aos preços recebidos pelos produtores, passaram de 34,20% para 13,41%.

Num mesmo movimento de redução dos repasses de preços, no varejo, para o mesmo intervalo, as margens no comparado aos preços do atacado caíram de 121,90% para 95,84% (Tabela 2).

A tabela 3 apresenta os valores de salário mínimo, preço de ovos no varejo (dz.) e poder de compra, no período de outubro de 2019 a outubro de 2021.

 

Fonte de proteína de origem animal mais barata no mercado e produto substituto das carnes mais demandado no período da pandemia de covid-196, o reajuste verificado nos preços dos ovos de 2019 (período anterior à crise sanitária) ao final de 2021 superou em muito a capacidade de acesso ao mercado da população (calculada em salário mínimo).

Com o agravamento da crise financeira causada pela pandemia e as constantes altas do preço da carne, aliados à perda da renda e do emprego e sabedores de que o ovo é a principal fonte de proteínas de muitas famílias e a mais barata no mercado comparada a outros produtos de origem animal durante o período da pandemia de covid-197, verifica-se que todo esse processo de desarranjo na cadeia de produção de ovos atingiu fortemente o poder de compra da população. 

 

 

 

 

 

 

 

 

1GOMES, S.; ISKREV, N.; RIBEIRO, P. P. Expetativas de inflação na área do euro durante a pandemia de COVID-19, Revista de Estudos do Banco de Portugal, v.7, n.4, 2021.

 

2COSTA, P. O que influencia o aumento no preço dos alimentos? Entenda! Politize! 2021. Disponível em: https://www.politize.com.br/o-que-influencia-o-aumento-no-preco-dos-alimentos/. Acesso em: 04 jan. 2022

 

3BARROS. G. S. C. A inflação nos preços dos alimentos em 2022 e 2021 e perspectivas. Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada ESALQ/USP. Piracicaba. Setembro de 2021. Disponível em: https://cepea.esalq.usp.br/upload/kceditor/files/Inflação%2020-21-set21.pdf. Acesso em: 09 dez. 2021.

 

4GALINDO, E.; TEIXEIRA, M. A.; ARAÚJO, M.; et al. Efeitos da pandemia na alimentação e na situação da segurança alimentar no Brasil, Food for Justice Working Paper, Series, no. 4. Berlin: Food for Justice: Power, Politics, and Food Inequalities in a Bioeconomy, 2021. DOI 10.17169/ refubium-29554 Disponível em: https://refubium.fu-berlin.de/bitstream/handle/fub188/29813/WP_%234_final_version.pdf?sequence=2. Acesso em: 09 dez. 2021.

 

5INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios mensais recebidos pelos produtores. São Paulo: IEA, 2022. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/precos_medios.aspx?cod_sis=2.  Acesso em 09 dez. 2021. 

 

6Op. cit. nota 4.

 

7Op. cit. nota 4. 

 

Palavras-chave: preços relativos, relação de troca, ovos, salário mínimo, São Paulo. 

 

  

COMO CITAR ESTE ARTIGO

BINI, D. L. de C.; MORAES, J. E. de; PIZZOLANTE, C. C.; MIGUEL, F. B. Os Preços dos Ovos e a Diminuição do Poder de Compra do Salário Mínimo no Estado de São Paulo durante a Pandemia da Covid-19. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 17, n. 3, p. 1-6, mar. 2022. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 04/03/2022

Autor(es): Danton Leonel de Camargo Bini (danton.camargo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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Fernando Bergantini Miguel (fbmiguel@aptaregional.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor