Plano Safra 2021/22: uma janela de oportunidades para sustentabilidade no campo


 

Em 2019, o Brasil estava diante de uma crise econômica, refletida em baixo crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), que acentuou as dificuldades no âmbito fiscal e, portanto, a capacidade de apoio do Estado. Em 2020 e 2021, somaram-se os problemas acarretados pela pandemia da covid-19, prolongada até o presente momento. Dessa forma, os três últimos planos de safra foram desenhados diante de situações desafiadoras que, felizmente, encontraram o setor agrícola em boas condições de produção e mercado, e com perspectivas de sair fortalecido. Um indicador dessa situação foi o crescimento de 5,7% do PIB agrícola no primeiro trimestre de 2021, em relação a igual período de 2020.

O Plano Agrícola e Pecuário 2021/22 (PAP) foi lançado em 22 de junho, após o Conselho Monetário Nacional (CMN) aprovar as condições das linhas de crédito rural para o próximo ano-safra.

A divulgação do PAP 2021/22 ocorreu apenas oito dias antes do início de sua vigência, trazendo dificuldades tanto para a programação dos agricultores, que há muito solicitam planos agrícolas e pecuários plurianuais, como para a preparação dos trâmites burocráticos e administrativos pelos agentes financeiros.

O atraso no lançamento do PAP 2021/22 tem como pano de fundo a restrição fiscal. Foram necessárias diversas negociações para garantir maior oferta de recursos ao setor, especialmente com relação àqueles a serem disponibilizados pelo Tesouro para garantir a equalização das taxas de juros e outros custos administrativos e tributários, além da subvenção ao prêmio de seguro rural. Foram liberados R$13 bilhões para esses fins, R$1,5 bilhão a mais que em 2020, mas inferior aos R$15,0 bilhões pretendidos pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA). No entanto, esse volume permitirá a equalização de 65,0% do montante total de recursos, mesmo percentual equalizado no plano anterior, e R$1,0 bilhão para o seguro rural (Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural - PSR).

Os destaques do PAP 2021/22 são para o fortalecimento da agricultura familiar e os investimentos na capacidade de armazenamento e em tecnologias que minimizem os impactos negativos das atividades sobre o meio ambiente, que foram beneficiados por maiores montantes de recursos e melhores condições nas taxas de juros.

O volume total de recursos programado para o PAP atual, que se inicia em primeiro de julho, é de R$251,2 bilhões, 6,3% maior do que no ciclo 2020/21, sendo R$177,8 bilhões destinados ao custeio, comercialização e industrialização, e R$73,4 bilhões ao investimento, finalidade essa que recebeu 29,0% a mais que na safra passada.

A política de crédito oficial adotada pelo governo considera que os grandes produtores são capazes de obter e gerir recursos provenientes do mercado financeiro privado, a taxas de juros competitivas, além de terem capacidade de autofinanciamento.

O apoio prioritário à agricultura familiar se reflete no acréscimo de 19,1% nos recursos destinados ao Pronaf (R$39,3 bilhões). Ressalta-se que R$17,6 bilhões visam atender as linhas de investimentos, montante 29,4% maior que no ciclo anterior, enquanto R$21,7 bilhões vão para o custeio, com um aumento de 11,1%, confirmando o direcionamento do PAP 2021/22 para investimentos. Os recursos destinados aos demais produtores e cooperativas tiveram aumento de 4,0%, totalizando R$211,9 bilhões, dos quais R$34,0 bilhões foram destinados ao Pronamp, representando um montante 2,7% maior que em 2020/21.

Diante da elevação da SELIC, de 2,25% para 4,25%, e a taxa de inflação acima da meta de 5,25% para 2021, foram definidos acréscimos nas taxas de juros. Para o PAP 2021/22, a taxa mínima é de 3% (Pronaf) e a máxima de 8,5% (Moderfrota), enquanto na safra 2020/21 as taxas variaram de 2,75% a 7,0%, o que implicou aumentos de 9,1% para a menor taxa e 21,4% para a maior (Tabela 1).

Para os programas destinados aos pequenos e médios agricultores, Pronaf e Pronamp, ocorreram alterações nas taxas de juros, tornando o crédito mais caro, o que deverá pressionar os custos dos produtores, já com expectativa de aumento devido ao preço dos insumos.

A necessidade de melhorar e ampliar a capacidade de armazenamento na propriedade deverá ser atendida pelo Programa para Construção e Ampliação de Armazéns (PCA), que recebeu incrementos consideráveis, de 84%, no total de R$4,12 bilhões. O governo estima que esse montante será suficiente para financiar 500 novas plantas, ampliando a capacidade de armazenamento em 5,0[A3]  milhões de toneladas.

 

O Programa de Subvenção ao Prêmio do Seguro Rural deverá receber R$1,0 bilhão, volume semelhante ao ciclo anterior. Segundo estimativas do governo, esse volume de recursos permitirá contratar aproximadamente 158.500 apólices, cobrindo uma área total de 10,7 milhões de hectares e um valor total segurado de R$55,4 bilhões.

O Plano Safra 2021/22 também continua direcionando o setor agropecuário para o uso de técnicas que minimizem os impactos negativos das atividades sobre o meio ambiente. As tecnologias que se harmonizam com a preservação dos recursos ambientais (clima, solo e água) trazem efeitos positivos sobre a renda do produtor, uma vez que interferem diretamente na produtividade da agropecuária e proporcionam melhor qualidade de vida à sociedade.

Nesse sentido, o agricultor familiar pode contar com o Pronaf Bioeconomia, que estendeu o financiamento para Sistemas Agroflorestais e para a construção de unidades de produção de bioinsumos e biofertilizantes.

Os agricultores que não se enquadram no Pronaf podem recorrer a outros Programas com viés ambiental: Inovagro (Inovação Tecnológica na Produção Agropecuária), Proirriga e Programa ABC (Programa para Redução de Emissão de Gases de Efeito Estufa na Agricultura). Para todos eles, o montante dos recursos programados para a safra 2021/22 foi significativamente superior aos oferecidos no plano anterior (Tabela 1).

O Proirriga, programa destinado ao financiamento da agricultura irrigada, terá R$1,35 bilhão, com juros de 7,5% ao ano. Já o Inovagro, voltado para o financiamento de inovações tecnológicas nas propriedades rurais, ficou com R$2,6 bilhões, sem alteração na taxa de juros, que permaneceu em 7,0% ao ano (Tabela 1).

O programa mais favorecido foi o Programa ABC, que apresenta uma interface maior com o meio ambiente. O reconhecimento da importância em fortalecer uma agropecuária sustentável, com baixa liberação de gases de efeito estufa, foi demonstrado pela destinação de maior aporte de recursos para investimentos (R$5,05 bilhões), com taxa de juros de 5,5% e 7,0% ao ano, carência de até 8 anos e prazo máximo de pagamento de 12 anos. Apesar de pouca alteração nas taxas de juros com relação à safra anterior, houve aumento de mais de 140,0% nos recursos financeiros destinados a esse programa.

A pretensão do plano em expandir as tecnologias que preservem os recursos naturais, com concomitante aumento da renda agrícola, fica mais evidente com a inclusão, no Programa ABC, de financiamentos para autoprodução de energia a partir dos resíduos gerados nas atividades agropecuárias - bioinsumos, biofertilizantes e energia elétrica (geração distribuída). O limite de crédito coletivo para projetos de geração de energia elétrica a partir de biogás e biometano será de até R$20,0 milhões.

O Plano Agrícola e Pecuário é uma importante ferramenta de intervenção sobre as práticas de manejo dos agrossistemas produtivos e, nos últimos anos, tem buscado tornar as atividades agroeconômicas mais sustentáveis. O plano atual explicita grande interesse na ampliação da renda do agropecuarista via investimentos em tecnologias limpas, os quais se revertem em aumento de produtividade agropecuária. No entanto, o nível de sustentabilidade do agro brasileiro enfrenta pelo menos dois entraves: a dificuldade de acesso, pelo produtor, à assistência técnica e à extensão rural, que nem sempre está capacitada para a introdução e condução das novas tecnologias, bem como a falta de profissionais capacitados tanto para a elaboração dos projetos como para sua avaliação nas instituições financeiras. Parte da resolução desses problemas está na capacitação e treinamento desses agentes.

Cabe também frisar a necessidade de transformar os planos safras em plurianuais, pois trarão benefícios para o planejamento dos produtores, a organização dos agentes financeiros e o fortalecimento da política agrícola. A definição de ações de médio e longo prazo contribuiria para tornar mais objetiva a determinação de programas e distribuição dos recursos, facilitando o acesso na ponta.

É importante destacar que a utilização de fundos do tesouro para o fomento à agropecuária contribui para a manutenção, fortalecimento e crescimento da atividade produtiva, com consequente elevação da arrecadação direta e indireta, por parte do estado, promovendo um círculo virtuoso, pois leva à dinamização dos setores transversais.

No entanto, o recurso do Tesouro utilizado para a equalização possivelmente  apresentaria melhores resultados se aplicados a política de garantia de preços e renda, inclusive ampliando o alcance dos instrumentos de política agrícola já existentes como: Financiamento para Garantia de Preços ao Produtor (FGPP), o Financiamento para Proteção de Preços em Operações no Mercado Futuro e de Opções, Contratos de Opção de Compra e Venda Como Instrumento de Política Agrícola, entre outros, intensificando as condições de gestão de risco de mercado (volatilidade dos preços), além da ampliação do seguro de produção.

 

 

1PIB CRESCE 1,2% no 1º trimestre de 2021. Agência de notícias IBGE: Editoria de Estatísticas Econômicas, Rio de Janeiro, 1 jun. 2021. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-sala-de-imprensa/2013-agencia-de-noticias/releases/30822-pib-cresce-1-2-no-1-trimestre-de-2021#:~:text=O%20PIB%20cresceu%201
%2C2,Extrativas%20(3%2C2%25)
. Acesso em: 24 jun. 2021.

 

 

Palavras-chave: Plano Agrícola e Pecuário 2021/22, Plano Safra 2021/22, investimento, Programa ABC, agricultura familiar.

 

 


 

 

COMO CITAR ESTE ARTIGO

FRANCA, T. J. F.; FREITAS, S. M. de. Plano Safra 2021/22: uma janela de oportunidades para sustentabilidade no campo. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 16, n. 6, jun. 2021, p. 1-5. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.



Data de Publicação: 25/06/2021

Autor(es): Terezinha Joyce Fernandes Franca (terezinha.franca@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Silene Maria de Freitas (silene.freitas@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor