Evolução Tecnológica, Rede de Apoio e Perfil do Cafeicultor do EDR de Marília, Estado de São Paulo


 

1 - INTRODUÇÃO

Em 2019, o valor bruto da produção agropecuária (VPA) contabilizado pelo Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Marília2 somou R$1,2 bilhão, situando-se a cafeicultura, dentro desta regional, na terceira posição, registrando R$139,60 milhões de VPA. As atividades bovinocultura de corte, seguidas pela lavoura de cana-de-açúcar, lideram a produção de valor nesse EDR3. Esse posicionamento no ranking do valor da produção deve ser relativizado pois, em 2019, a região, assim como todo o estado, percorria o ciclo de baixa da produção cafeeira.

No EDR de Marília, uma faixa de seu território (chamada espigão Garça-Marília) possui aptidão para a exploração cafeeira. Prevalece na regional uma cafeicultura de perfil empresarial, adotando irrigação das lavouras, mecanização da colheita e preparo pós--colheita com emprego do descascamento. Tais características promovem produtividade elevada com preocupações com a qualidade final da bebida.

Diante de sua importância da região na produção cafeeira paulista, este estudo objetiva analisar os dados censitários da base produtiva cafeeira, tecnologia utilizada e a evolução do perfil dos cafeicultores do EDR de Marília a partir dos resultados comparativos obtidos pelo Projeto LUPA 2016/17, comparativamente, ao levantamento anterior LUPA 2007/08.

 

2 – MATERIAL E MÉTODO

A fonte utilizada dos dados correlacionados neste estudo foi obtida a partir dos Levantamentos Censitários de Unidades de Produção Agropecuária (Projeto LUPA), realizado pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), por meio da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) e do Instituto de Economia Agrícola (IEA), campanhas de 2016/17 e de 2007/084, 5. A unidade básica de levantamento (UPA) coincide na maioria das vezes com o imóvel rural, entendido como conjunto de propriedades contíguas do mesmo proprietário. Esse levantamento inclui todas as áreas plantadas com café, inclusive aquelas que não são de interesse para estudos socioeconômicos.

A abordagem será conduzida explicitando os resultados comparativos agregados obtidos para a cafeicultura no EDR de Marília. Para atingir os objetivos elencados, foram utilizados métodos quantitativos e cálculo de frequências simples e de taxas, com intuito de descrever a dinâmica da produção cafeeira regional no período considerado.

 

3 – RESULTADOS

A exploração de culturas perenes no EDR de Marília mantém relativa estabilidade em termos de área ocupada, regredindo apenas 3,20% no espaço intercensitário, embora se registre a queda de -12,82% em termos de UPAs. Entretanto, houve substancial adensamento dos cultivos com incremento de 17,68 milhões de pés, ou seja, expansão de 32,52%. Tal evolução denota a intensificação dos cultivos perenes, sendo o principal a cafeicultura (Tabela 1).

 

 

De fato, ao isolar os dados relativos a cafeicultura, houve redução de número de UPAs e de área, 22,65% e 10,40%, respectivamente. O avanço no número de pés, porém, foi de 15,57 milhões de pés, representando expansão de 31,58%. Conclui-se que foi, sobretudo, na cafeicultura em que ocorreu a intensificação produtiva entre os cultivos perenes.

O adensamento ao lado das podas e da irrigação constitui as tecnologias agronômicas mais adequadas para o incremento da produção e da produtividade média. No caso observado, houve expansão de 952 pl/ha, saltando a densidade média de cultivo dos 2.037 pl/ha para os 2.989 pl/ha (crescimento de 47,73%).

Ainda que se considere o recuo da área ocupada pela cafeicultura nas UPAs que possuem essa atividade, dentre aquelas que permaneceram a cafeicultura se tornou mais relevante (participação relativa de 28,77%), na medida em que houve diminuição ainda maior na área total do EDR, passando de 24% para 28,77% da área disponível (Tabela 2). A oferta de terras para a expansão das perenes permanece substancial. Ainda que se descontem os limites legais de preservação ambiental, há atualmente mais de 40 mil hectares que podem se converter em lavouras dentre as UPAs que já manejam a cultura.

 

 

O encolhimento da área abrangida pela lavoura na regional impacta negativamente os resultados obtidos para o uso de tecnologias agronômicas. No caso da conservação do solo, houve declínio tanto em UPAs como em área na cafeicultura (Tabela 3), mas que, quando descontadas as reduções de número de UPAs, evidencia estabilidade na adoção da tecnologia6. O grau de tecnificação empregado na região tem na conservação do solo um pilar crucial que, associado à característica perene e ao desenvolvimento de tecnologias de manejo do mato, oferecem alternativas sustentáveis aprimorar a conservação de solo. A prevalência da colheita mecanizadas induz a instalação de talhões alinhados para facilitar o avanço dos equipamentos e ganho de eficiência com menor número de curvas e manobras.

A maior tecnificação da cafeicultura é constatada pelo percentual de aumento de UPAs (21,46%) e área (17,24%) da adoção da análise de solo, visando balancear equilibradamente a adubação (mineral e orgânica) (Tabela 3). Os 21 mil hectares submetidos a adubação mineral indicam que essa prática abrange toda a cafeicultura regional, sendo que em outros 18,47 mil hectares são, ainda, complementados pela adubação orgânica.

 

 

A altitude média limite para a condução da lavoura de arábica conforma ambiente propício para a disseminação de pragas e doenças. Assim, é plausível que a tecnologia de manejo integrado de pragas tenha incrementado sua expressão em mais de 550% em termos de área, alcançando quase a metade do parque produtivo. Nisso também consiste outro indicativo do elevado grau de tecnificação da lavoura nessa regional.

Além do cultivo sob sequeiro, a irrigação consiste no mais disseminado sistema de produção conduzido na região. No intervalo intercensitário, houve expansão de 83,33% em termos de UPAs e 83,01% em área abrangida pela tecnologia (Tabela 4).

 

 

 

Embora em pequeno número, as 53 UPAs em sistema de arrendamento revelam a alternativa encontrada para fazer frente às dificuldades sucessórias dessas unidades. A crescente idade média dos cafeicultores demanda maior atenção com a formação de sucessores, pois, se não há êxito, volta-se para o arrendamento como solução, o que garante a continuidade da exploração.

Confirmando o diagnóstico da prevalência de áreas mecanizáveis, o avanço da colheita mecanizada no espaço intercensitário foi monumental, com 2.400% mais UPAs adotando a prática, abrangendo área de 6,85 mil hectares. Essa explosão ocorre em detrimento da área submetida a colheita manual que declina em 68,51% (Tabela 5).

 

 

Nas lavouras de menor extensão ou em que as condições de declividade impedem o transito de máquinas, a conjugação de formas mistas para a colheita do café também avançou bastante na regional, atingindo 9,73 mil hectares que praticam tal método.

A diminuição de UPAs com atividade cafeeira ocorrida no intervalo intercensitário mascara os resultados obtidos para o avanço da tecnologia da informação nos imóveis, ainda que, em termos de área, a presença de computadores tenha permanecido estável
(-1,55% apenas). As UPAs em que se empregam os computadores no último censo (314), em geral, também se encontram conectados a web (320), uma constatação muito similar à já observada em outros cinturões. Quanto à procura por crédito rural, a expansão dos números foi modesta, enquanto a contratação de seguro se elevou bastante tanto em UPAs como em área, contabilizando 53,66% e 64,97%, respectivamente (Tabela 6).

O declínio da demanda por assistência técnica (AT) privada, no intervalo intercensitário, não repercutiu em maior demanda por sua congênere pública que, em termos de UPAs, também revelou queda, embora a área sob atenção do serviço público tenha incrementado em 8,19%. Os resultados para itens como análise de solo e adubação indicam que os cafeicultores dessa regional se encontram bem atendidos quer por um ou outro serviço de AT (Tabela 7).

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A rede de apoio à produção agropecuária existente nessa regional não logrou grande atenção dos cafeicultores. Para todos os casos (associação, cooperativa e sindicato), houve queda no número de UPAs associadas. Apenas em termos de área aparece a limitada expansão de 3,46% no intervalo considerado (Tabela 7). A ruína de uma das principais cooperativas de cafeicultores do estado, com sede no principal município cafeeiro dessa regional, deixou sequelas que, ao longo da última década, ainda não foram superados.

 

4 – CONCLUSÕES

A cafeicultura no EDR de Marília tem se convertido crescentemente numa atividade empresarial, adotando padrões similares aos praticados na fronteira tecnológica agronômica para a cultura (adensamento, adubação organo-mineral, irrigação, colheita mecanizada e descascamento cereja) recomendada para a lavoura. Tais inovações conformam uma cafeicultura competitiva em preços e qualidade.

A diminuição de UPAs com lavoura cafeeira constatada no último censo denota uma higienização do segmento, excluindo aqueles que possuíam na cafeicultura atividade econômica secundária ou que, diante das cotações praticadas e das produtividades obtidas, se mostraram inviáveis. A especialização produtiva da regional a consolidará na terceira posição na produção de café no estado, podendo inclusive almejar saltos ainda mais arrojados nos próximos dez anos. 

 

1Os autores agradecem a organização do banco de dados e a tabulação conduzidas por Gilberto Bernardi, Assistente de Apoio à Pesquisa Agropecuária.

 

2Os EDRs constituem unidades de organização administrativa da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo.

 

3SILVA, J. R. et al. Valor da produção agropecuária por escritório de desenvolvimento rural do Estado de São Paulo: estimativa de 2019. Análises e Indicadores do Agronegócio, v. 15, n. 5, p. 1-8, maio 2020. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-35-2020.pdf. Acesso em: 06 jul. 2020.

 

4SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2016/17: Censo agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2019. Disponível em: http://www.cdrs.sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 17 jun. 2020.

 

5SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2007/08: Censo Agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2009. Disponível em: http://www.cdrs.sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 17 jun. 2020.

 

6Exemplificando: havia 1.351 UPAs em 2007/2008, sendo que 1.143 empregavam a tecnologia de conservação do solo, ou seja, 84,60% do total. Em 2016/17, esse percentual foi de 82,85%, pois das 1.045 UPAs total em café, 886 empregavam a tecnologia. 

 

Palavras-chave: censo agropecuário, cafeicultura regional, estatísticas agrícolas.




COMO CITAR ESTE ARTIGO

VEGRO, C. L. R.; ANGELO, J. A. Evolução tecnológica, rede de apoio e perfil do cafeicultor do EDR de Marília, Estado de São Paulo. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 8, ago. 2020. Disponível em: colocar linkdo artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.



Data de Publicação: 13/08/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
José Alberto Angelo (jose.angelo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor