Evolução Tecnológica, Rede de Apoio e Perfil do Cafeicultor do EDR de Ourinhos, Estado de São Paulo


1 – INTRODUÇÃO

O Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) de Ourinhos2 possui na cafeicultura atividade das mais tradicionais no contexto da agropecuária regional. Situada na porção sudoeste do estado e com latitude limítrofe para a lavoura (risco de geada), essa cultura contribui na contabilização dos R$2,3 bilhões de valor bruto da produção (VBP) obtidos em 2019 (18ª posição entre as 40 regionais), embora não se encontre entre os cinco cultivos/criações geradoras dos maiores VBP da regional3.

A lavoura cafeeira no EDR de Ourinhos é conduzida, majoritariamente, em regime de agricultura familiar, com áreas em torno de 10 hectares com café. Tal perfil diferencia-se de outros cinturões cafeeiros do estado, em que a cafeicultura empresarial tem destacada relevância.

Compõem o EDR 16 municípios: Bernardino de Campos, Canitar, Fartura, Ipaussu, Óleo, Ourinhos, Piraju, Ribeirão do Sul, Salto Grande, Santa Cruz do Rio Pardo, São Pedro do Turvo, Sarutaiá, Taguaí, Tejupá, Timburí e Xavantes. Em termos territoriais, o EDR soma, aproximadamente, 485,54 mil hectares, dos quais 7,16% ocupados com culturas perenes (LUPA 2016/17)4, 5.

A ocorrência de precipitações durante o período de colheita, associada à umidade do ar sempre elevada, dificulta a produção de cafés com bebida de excelência. Nos invernos secos, a regional sempre entrega ao mercado cafés especialíssimos pois, apesar de não possuir altitude média para produção de cafés finos (excetuando-se o município de Timburi e as franjas de Sarutaiá), a condição de baixa latitude induz maturação mais lenta dos frutos e, consequentemente, colheitas mais tardias, fatores relevantes quando se busca qualidade final do produto. Para não depender do clima, muitos cafeicultores da regional adotam há muitos anos (talvez décadas) o descascamento das cerejas, produto cuja reputação conquistada orgulha a cafeicultura do EDR6.

Diante da importância da região na produção cafeeira paulista, este estudo objetiva analisar os dados censitários da base produtiva cafeeira, tecnologia utilizada e a evolução do perfil dos cafeicultores do EDR de Ourinhos a partir dos resultados obtidos pelo Projeto LUPA 2016/17, comparativamente ao levantamento anterior LUPA 2007/08.

 

2 – MATERIAL E MÉTODO

A fonte utilizada dos dados correlacionados neste estudo foi obtida a partir dos Levantamentos Censitários de Unidades de Produção Agropecuária (Projeto LUPA), realizados pela Secretaria de Agricultura e Abastecimento (SAA), por meio da Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) e do Instituto de Economia Agrícola (IEA), campanhas de 2016/17 e de 2007/08. A unidade básica de levantamento (UPA) coincide na maioria das vezes com o imóvel rural, entendido como conjunto de propriedades contíguas do mesmo proprietário. Esse trabalho inclui todas as áreas plantadas com café, inclusive aquelas que não são de interesse para estudos socioeconômicos.

A abordagem será conduzida explicitando os resultados agregados obtidos para a cafeicultura no EDR de Ourinhos. Para atingir os objetivos elencados, foram utilizados métodos quantitativos e cálculo de frequências simples e de taxas, com intuito de descrever a dinâmica da produção cafeeira regional no período considerado.

 

3 – RESULTADOS

A queda no número de UPAs com exploração de culturas permanentes (-26%) não restringiu o avanço da área ocupada por essas lavouras na regional (21,23%)7. Quase 10 milhões de plantas foram adicionadas ao parque produtivo no período intercensitário (Tabela 1). Na cafeicultura, especificamente, houve queda similar à tendência mais geral para o número de UPAs (-29,19%), mas ao contrário da expansão das demais perenes na regional, constatou-se encolhimento de aproximadamente 2,5 mil hectares de lavouras, parcialmente compensada pelo incremento da densidade de cultivo na área remanescente que alcança média de 2,92 mil pl/ha frente as 2,25 do censo anterior.

O adensamento do parque produtivo incrementa a produtividade por área, melhorando a competitividade em preços da produção. Nos 10 anos contemplados entre os censos, segundo dados do IEA/CDRS, houve evolução na regional da produção global, partindo do patamar de 350 mil sacas de café beneficiado para nova média, acima dos 415 mil sacas8 (Figura 1).

 

 

A perda de área de café na regional produziu, entretanto, ampliação da ocupação com café nas UPAs remanescentes com a lavoura no intervalo intercensitário. Ainda assim, há disponibilidade de terras suficiente (mais de 30 mil hectares já descontada a parcela destinada à preservação ambiental) para sustentar expansão da lavoura dentro das UPAs que exploram a cultura (Tabela 2).

A redução em quase 500 UPAs com café na regional interfere nos resultados apurados em relação à adoção de tecnologia agronômica na cafeicultura da regional, no intervalo intercensitário considerado. No quesito conservação do solo, tomando como referência os 14,98 mil hectares cultivados (Tabela 1), os 14,20 mil hectares que empregam a tecnologia apontada no último censo revelam que sua adoção alcança aproximadamente 95% de toda a área cultivada, sendo esse percentual acima do mesmo indicador obtido no censo anterior (88%) (Tabela 3).

 

 

Assim como a conservação do solo, a importância de sua análise também já é uma unanimidade entre os cafeicultores. Novamente, comparando as UPAs com atividade na cafeicultura, dos 50% registrados no LUPA 2007/08, os cafeicultores que realizam análise passam para 79% no censo mais recente, abrangendo 85% da área cultivada.

Como decorrência das análises de solo efetuadas, as recomendações de adubações mineral e orgânica são amplamente adotadas. Contudo, houve redução da adubação verde, com percentuais que podem estar mascarados pelas mais recentes tecnologias de manejo das entre ruas que se mostram a cada safra mais promissora em termos de melhoria das condições estruturais do solo, retenção de sua umidade, aumento da matéria orgânica, preservação dos inimigos naturais das pragas e, por consequência, maior produção.

Embora adotado em menos de 15% dá área atualmente cultivada, o MIP mostra importante crescimento em termos de área abrangida. A busca por maior sustentabilidade ambiental e rentabilidade econômica das explorações cafeeiras terá no MIP um alicerce imprescindível.

Analisando a variação nos sistemas de produção prevalecentes na cafeicultura da regional, destaca-se o avanço do arrendamento de áreas produtivas (94,16%). Tal fenômeno, comum nos EDRs que se destacam em café, decorre aparentemente da dificuldade do gestor em encontrar sucessores. Quando aparece a impossibilidade de manter a condução do empreendimento e na ausência de sucessores, o arrendamento de lavoura é a forma mais imediata de continuar no negócio (Tabela 4).

 

 

O abandono dos sistemas irrigados e dos orgânicos também foi muito expressivo na comparação no intervalo intercensitário. O regime hídrico associado às condições climáticas mais amenas e a qualidade dos solos (prevalência dos argilosos) permitem boa produção em regime de sequeiro. Por sua vez, o café orgânico, embora sob crescente demanda nos centros urbanos, não possui estrutura de comercialização consolidada que assegure aos cafeicultores acesso de sua oferta aos mercados, desestimulando a continuidade da exploração.

Diferentemente de outras regionais com expressão em café, no EDR de Ourinhos firmou-se a evolução para a colheita que combina tecnologias mecânica com a manual (327,22% em área) (Tabela 5). As cafeiculturas de perfil familiar conduzidas sob glebas de pequenas e médias dimensões tornam economicamente inviável a operação de máquinas de grande porte, sendo a combinação derriçadoras com abanação a mais conveniente para proceder com a colheita.

 

À época do último levantamento censitário, a colheita totalmente mecanizada operava em 49 UPAs da regional, com 2,41 mil hectares atendidos pela tecnologia. Embora reduzido em termos de números absolutos relativamente, exibiu crescimento similar ao da colheita combinada (manual + mecânica) e deve manter seu ritmo de expansão nos próximos anos, por ser a trajetória tecnológica de maior êxito na cafeicultura contemporânea.

Os computadores e o acesso à internet exibem crescimento em sua adoção nas UPAs da regional no intervalo intercensitário. Curiosamente, essa maior conexão com as informações não foi acompanhada pela adoção mais generalizada da escrituração agrícola, pois houve redução no número de imóveis (10,49%) que se apoiam em dados para conduzir a gestão da exploração (Tabela 6).

 

 

A tomada de crédito esteve sempre presente entre parte dos cafeicultores da regional, tendo havido crescimento apenas na margem do número de tomadores. Entretanto, em termos de área comprometida com empréstimos, aproxima-se de 70% da área de lavoura. Na cafeicultura, as operações barter (escambo insumo por produto) têm atraído muitos cafeicultores para essa modalidade de financiamento de produção em substituição ao financiamento bancário tradicional.

O risco de geada é concreto na regional. Essa condição consiste em apelo natural para que o cafeicultor procure a ferramenta de seguro agrícola. O salto tanto em número de UPAs como de área segurada (113,75% e 328,57%, respectivamente) foi expressivo, tendência esta que deve se ampliar ainda mais nos próximos anos.

O decréscimo relativo da participação da assistência técnica pública é apenas aparente, pois das 1.060 UPAs com café, 1.011 são atendidas por técnicos governamentais. Muitas propriedades passaram também buscar a assistência privada, pois houve expansão de mais de 40% para UPAs e área (Tabela 7).

 

 

O associativismo e o cooperativismo tiveram queda em termos de número de UPAs, com crescimento, porém, em área abrangida por ambos os serviços de apoio à produção agropecuária. Somente a sindicalização dos cafeicultores exibiu crescimento tanto em número de imóveis como em área. Existem provavelmente na regional lideranças sindicais capazes de oferecer serviços de interesse de seus associados, firmando-se como a principal instituição de aglutinação dos cafeicultores.

 

4 – CONSIDERAÇÕES FINAIS

A cafeicultura no EDR de Ourinhos exibiu, no intervalo intercensitário, avanços tanto na média da produção como nas tecnologias de manejo da lavoura e de colheita. A prevalência do produtor de perfil familiar ainda se mantém, mas há a expansão do tipo empresarial mais tecnificado, explorando glebas de maior extensão.

O incremento da densidade do parque produtivo tem efeito importante na maior produção contabilizada nos últimos anos. Essa intensificação produtiva consolida a regional na quarta posição na oferta de café dentro do Estado de São Paulo.

Os prêmios de qualidade já conquistados pelos cafeicultores dessa regional concedem ótima reputação ao produto ali obtido. Em determinados anos, os cafés descascados podem atingir qualidade excepcional, valorizando tanto o trabalho do cafeicultor como toda a ênfase que o serviço de extensão deposita nesse atributo junto ao trabalho para com seus assistidos.

 

 

 

1Os autores agradecem o trabalho de sistematização dos dados e elaboração dos quadros de saída conduzido por Gilberto Bernardi, Assistente de Apoio à Pesquisa Agropecuária.

 

2A Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável (CDRS) coordena a atuação de 40 EDRs no Estado de São Paulo.

 

3SILVA, J. R. da et al. Valor da produção agropecuária por escritório de desenvolvimento rural do Estado de São Paulo: estimativa de 2019. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 5, p. 1-8, maio 2020. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-35-2020.pdf. Acesso em: 15 jul. 2020.

 

4SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2007/08: Censo Agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2009. Disponível em: http://www.
cdrs.sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 11 jun. 2019.

 

5SÃO PAULO (Estado). Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo. Instituto de Economia Agrícola. Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável. Projeto LUPA 2016/17: Censo agropecuário do Estado de São Paulo. São Paulo: SAA: IEA: CDRS, 2019. Disponível em: http://www.cdrs.
sp.gov.br/projetolupa/. Acesso em: 11 jun. 2019.

 

6Por três ocasiões, o café CD oriundo da regional venceu o Prêmio Illy, considerado o Oscar da cafeicultura brasileira, a saber: Tejupá (11o prêmio); Timburi (20o prêmio) e Sarutaiá (24o prêmio). CLUBE Illy do café Linha do Tempo. Disponível em: https://clubeilly.com.br/premiacoes/premio-ernesto-illy/linha-do-tempo/. Acesso em: 15 jul. 2020.

 

7Dados dos LUPAs 2007/08 e 2016/17 indicam que nessa regional, apenas a citricultura, se expandiu em mais de 8,3 mil hectares no intervalo intercensitário.

 

8Disponível para assinantes em INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA – IEA. Banco de dados. São Paulo: IEA. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/subjetiva.aspx?cod_sis=1&idioma=/. Acesso em: 15 jul. 2020. 

 

Palavras-chave: censo agropecuário, cafeicultura regional, estatísticas agrícolas.




COMO CITAR ESTE ARTIGO

 

VEGRO, C. L. R.; ANGELO, J. A. Evolução tecnológica, rede de apoio e perfil do cafeicultor do EDR de Ourinhos, Estado de São Paulo. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 8, ago. 2020. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 11/08/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
José Alberto Angelo (jose.angelo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor