Estimativa de Excedente Produtivo Pressiona as Cotações Futuras do Café


 

Em junho de 2020, grande parte do ocidente e porções do oriente ainda se encontrava sob o domínio da furiosa pandemia. O isolamento social, que em um primeiro momento mobilizou os indivíduos a formarem estoques de alimentos (inclusive café), arrefeceu a demanda por gêneros de primeira necessidade a partir da percepção de que os sistemas logísticos não haviam sido comprometidos, tampouco os polos de originação dos alimentos essenciais.

O ambiente de negócios excessivamente incerto (depois da primeira onda, segue uma segunda ainda pior e a distância para o fim deste cataclismo se alarga) reflete-se na formação dos preços. Assim, em Nova York as cotações para o café arábica estiveram pressionadas. Para o vencimento do contrato C em segunda posição (contrato mais negociado), a média das cotações na primeira semana do mês foi negociada a US$¢100,16 /lbp, declinando para US$¢97,29/lbp na média da quarta semana para igual posição, ou seja,2,86% de queda (Figura 1).

A revisão estatística do cálculo do excedente produtivo conduzida pelo Departamento Americano de Agricultura (USDA) indicando elevação dos estoques finais foi, também, determinante para que as cotações no mercado futuro de Nova York andassem de lado em junho de 20202 (em parte confirmado pela elevação em 300 mil sacas dos estoques certificados pela Green Coffee Association)3. Concomitantemente, a intensificação das aquisições de suprimentos por parte dos importadores e das torrefadoras internacionais, ocorridas entre abril e maio, retornaram ao patamar normal de trabalho nesse mercado. Por fim, a entrada do verão no Hemisfério Norte adicionou mais pressão sobre os preços, pois nessa estação climática há menor demanda sazonal pela bebida.

Refletindo aspectos edafoclimáticos observados ao longo da corrente safra, a antecipação da maturação das lavouras no Brasil adiantou o início dos procedimentos de colheita. Por se tratar de ano de ciclo de alta da oferta, o mercado reagiu pressionando as cotações em Nova York.

Outro fator que contribui para a baixa registrada nas cotações do arábica foram os impactos sobre o segmento representado pelos cafés especiais (gourmet, origem, certificados etc.), bastante afetado pelas restrições impostas pela pandemia. O fechamento de cafeterias, quiosques, restaurantes, bares e similares gerou efeito dominó para a demanda dos produtos superiores que foram, parcialmente, compensadas pelo consumo doméstico, insuficiente, porém, para impedir maior pressão baixista sobre as cotações.

A queda nas cotações ao longo do mês somente não foi mais prejudicial para os cafeicultores em razão da substancial desvalorização do real observada especialmente no segundo trimestre do ano, ou seja, os produtores mantiveram sua receita em reais, aparentemente suficiente para cobrir seus custos e extrair algum benefício econômico.

Segundo dados sistematizados pelo IEA/CDR, para o Estado de São Paulo, a média dos preços recebidos pelos cafeicultores na região de Franca, em junho de 2020, foi de R$482,39/sc. para o tipo 6 bebida dura4. Considerando-se como média para a cotação do dólar médio em junho de R$5,19 por US$ (PTAX)5, o preço recebido equivale a US$92,94/sc. Para a média da segunda posição na última semana do mês, a cotação atingiu US$¢99,57/lbp que, após efetuadas as devidas conversões, representa US$122,21/sc. Descontados aproximadamente 20% relativos ao diferencial e taxas e emolumentos cobrados na contratação de hedge, obtêm-se US$97,77/sc., ou seja, R$507,41, representando vantagem financeira de R$25,02/sc., montante suficiente viabilizar a contratação do hedge.

Na Bolsa de Londres, as cotações do robusta exibiram trajetória diferenciada do arábica em Nova York, uma vez em que, entre as médias da primeira e da segunda semana de junho de 2020, houve elevação nas cotações que declinam nas terceira e quarta semanas do mês (Figura 2).

        

A estimativa de aumento das exportações de robusta vietnamita no primeiro semestre, associado ao início dos embarques de conilon brasileiro da corrente safra, pode ter pressionado as cotações a partir da segunda quinzena do mês.

O balanço semanal dos contratos de café arábica negociados em Nova York mostra aderência ao comportamento das cotações. No percurso das semanas do mês, a posição dos grandes investidores demonstra avanço progressivo da posição vendida, incrementando o balanço líquido em 16.506 contratos (27.669 menos 11.163) (Tabela 1). A percepção dos investidores é de que não há risco de estresse sobre o suprimento, mas ao contrário cresce o excedente de produto contabilizados durante a passagem para a próxima safra.

 

O segundo semestre antecipa a retomada econômica, seguindo rígidos protocolos, em importantes países importadores de café. A potencialmente safra recorde brasileira e as expectativas de aceleração dos embarques no segundo semestre devem manter as cotações pressionadas para os próximos meses deste ano e quiçá do próximo. Felizmente, percentual significativo de cafeicultores, orientados por suas cooperativas e corretores, antecipou suas vendas contratando hedge em fevereiro e março de 2020, quando as cotações atingiram mais de R$600,00/sc., preservando assim sua rentabilidade e assegurando que a próxima safra brasileira não careça de recursos financeiros em sua condução.

 

 

1O autor agradece o trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido pelo analista de sistemas Paulo Sérgio Caldeira Franco, Agente de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do IEA.

 

2ALBUQUERQUE, N.; PRESSINOTT, F. Commodities: aumento de estoques nos EUA pressiona café em Nova York. Jornal Valor Econômico, São Paulo, 16 jun. 2020. Disponível em:https://valor.globo.com/agronegocios/noticia/2020/06/16/commodities-aumento-de-estoques-nos-eua-pressiona-cafe-em-nova-york.ghtml. Acesso em: 3 jul. 2020.

 

3GREEN COFFEE ASSOCIATION. Database. New York, Jun. 2020. Disponível em: http://greencoffeeassociation.org/. Acesso em: 3 jul. 2020.

 

4INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA – IEA. Banco de dados. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6. Acesso em: 3 jul. 2020.

 

5BANCO CENTRAL DO BRASIL – BCB. Banco de dados. Brasília: BCB, 2020. Disponível em: www.bcb.gov.br . Acesso em: jul. 2020. 

 

Palavras-chave: cotações futuras, mercado de café, bolsa de mercadorias.


Data de Publicação: 13/07/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor