Efeitos Mercadológicos da Covid-19 na Cadeia Produtiva do Maracujá

 

O maracujá (Passiflora edulis) é o 18º produto mais comercializado na Companhia de Entrepostos e Armazéns Gerais de São Paulo (CEAGESP)1. Normalmente pode ser encontrado com grande disponibilidade entre os meses de março a maio, período este que está coincidindo com a época de adoção de distanciamento social e fechamento do comércio no Estado de São Paulo.

O volume médio anual do maracujá comercializado no Entreposto Terminal São Paulo, período de 2015 a 2019, correspondeu a 49 mil toneladas2. A produção vem, principalmente, das cidades de Dom Basílio/BA, Livramento do Brumado/BA, Jacinto Machado/SP, São João do Sul/BA, Ituaçu/BA e Sombrio/SC. No Estado de São Paulo, os principais municípios fornecedores são Capão Bonito, Cajati e São Miguel Arcanjo3.

Apesar de ocupar a 4ª posição na produção do maracujá, o Estado de São Paulo é o maior consumidor do produto. Neste cenário, a CEAGESP tem grande importância para a distribuição, configurando-se como o maior local de comercialização de maracujá no Brasil, responsável por comercializar mais de 7% da produção nacional4.

O preço médio do quilograma do maracujá azedo no atacado em abril de 2020 foi equivalente a R$2,68 (classificação tipo A), R$2,19 (classificação tipo B), R$1,17 (classificação tipo C). A média do preço entre 2015 e 2018 foi de R$4,32/kg da fruta. Em 2019, esse valor foi de R$3,95 (média em reais deflacionada segundo IGP-DI/FGV). A produtividade média brasileira foi de 14 toneladas por hectare5. Destaca-se que, na região Centro--Oeste Paulista, o custo de produção foi estimado em R$1,29/kg da fruta em 20196.

Nota-se, portanto, que é primordial investir em tecnologia para otimizar a produtividade e a qualidade dos frutos, visando tornar o empreendimento agrícola sustentável. Pode-se citar como exemplos a adoção de cultivares mais perenes para aumentar no ciclo da safra, bem como otimizar técnicas de polinização e monitoramento de pragas e doenças.

 As regiões Nordeste e Sudeste do país são as principais produtoras de maracujá (Figura 1). Na região Sudeste, destacam-se os Estados de São Paulo e Minas Gerais (Figura 2).

 

 

A quarentena no Estado de São Paulo para conter o avanço do novo coronavírus, com início em 24 de março de 2020, resultou oscilação nas vendas do maracujá nas duas primeiras semanas. Após a terceira semana das medidas restritivas, as vendas se normalizaram em relação às compras realizadas pelos supermercados. As vendas para feirantes, restaurantes, bares e empresas setoriais reduziram 80%. Salienta-se que, normalmente, os mercados adquirem as melhores mercadorias, pagando um pouco mais caro pela fruta.

Segundo relatos do setor atacadista e fruticultores da região Centro-Oeste Paulista que comercializam diretamente para feirantes, empresas e consumidor final, identificou--se que as vendas diminuíram em média 52%. O preço de venda foi reduzido em média 40% do valor de mercado. Apesar da redução do preço de venda, a produção apresentou excedente, com perdas em torno de 36% das produções.Os agricultores com problemas no escoamento da produção optaram por efetivar vendas regionais, mas o volume de compra foi restrito.

Estima-se que até o fim da safra, somadas as perdas de produção em decorrência de problemas fitossanitários e condições climáticas, juntamente com as perdas do produto não comercializado, a queda no faturamento dos produtores de maracujá deverá ser em torno de 46%.

Objetivando minimizar o prejuízo econômico e auxiliar os produtores e comerciantes da fruta, técnicos da Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural
de Santa Catarina (EPAGRI) e do CEAGESP indicaram algumas recomendações técnicas, tais como7:

1) Adoção dos protocolos de higiene e distanciamento social entre os trabalhadores rurais: trabalhadores do grupo de risco devem ser afastados das atividades e os demais devem ser monitorados quanto à presença dos sintomas causados pelo coronavírus. As ações de higiene devem ser redobradas a fim de garantir a inocuidade dos alimentos e a saúde dos trabalhadores.

2) Encaminhamento do maracujá de forma direta aos mercados locais: a oferta de frutos às redes de supermercados locais pode ser uma oportunidade de escoamento da safra atual e abertura de novos mercados de cadeia curta, tornando-se, inclusive, uma oportunidade de negócios.

3) Classificação mais rigorosa dos frutos na casa de embalagem: a classificação durante a embalagem do maracujá deve ser realizada de forma mais rigorosa, a fim de evitar a reclassificação nos entrepostos comerciais, preservando a saúde dos trabalhadores das centrais de abastecimento e do consumidor final, pela redução do risco de contaminação dos frutos.

4) Armazenamento dos frutos excedentes em câmara fria: os frutos que não têm destinação comercial imediata durante o pico da safra podem ser armazenados por até 15 dias em câmaras frias, a fim de aumentar o período de aptidão para o comércio in natura. Deve-se observar as indicações técnicas abaixo para aumentar a eficiência do armazenamento de maracujá-azedo:

a) Os frutos a serem armazenados devem ser colhidos no início da troca de cor (de vez), assegurando-se a manutenção do pedúnculo (cabinho da fruta) e colocados diretamente em caixas plásticas, previamente higienizadas, nas quais serão armazenados.

b) Os maracujás-azedos deverão ser colhidos e classificados imediatamente para que não haja posterior manuseio, o que deprecia os frutos e diminui o tempo de prateleira.

c) Caso seja possível e/ou necessária a realização de uma sanitização, indica-se que seja em solução de 200 ppm de cloro (1 litro de água sanitária comercial a cada 100 l de água limpa). Essa solução deve ser trocada diariamente ou quando apresentar-se turva.

d) Os frutos deverão ser minimamente manuseados e encaminhados imediatamente até seu local de armazenamento em câmara fria, que deverá ser mantida com temperatura em torno de 8°C, tendo o cuidado para que não baixe de 6°C (limite para não causar dano de frio ou chilling). Temperaturas acima de 10°C são insuficientes para diminuir o avanço da desidratação dos frutos. A umidade da câmara fria deve ser mantida acima dos 90%.

e) Estruturas móveis de armazenamento em frio (contêineres refrigerados) podem ser alugadas a fim de aumentar a capacidade de estocagem dos frutos nas propriedades e/ou casas de embalagens.

5) Industrialização: Os frutos fora de padrão para consumo, ou excedentes sem destino para comercialização in natura, poderão ser industrializados a fim de evitar perdas pelos produtores.

Salienta-se ainda que representantes da Organização Mundial do Comércio (OMC), da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e da Organização Mundial do Comércio (OMS) emitiram declaração conjunta pedindo aos governos que minimizem o impacto das restrições fronteiriças no comércio de alimentos. De acordo com os presidentes das organizações, a incerteza sobre a disponibilidade de alimentos pode desencadear uma série de restrições às exportações ocasionando escassez no mercado global8.

Nesse mesmo sentido, líderes dos países do G20 se comprometeram a tomar medidas necessárias e imediatas para facilitar o comércio de produtos agrícolas, suprimentos e outros bens e serviços essenciais neste período de crise.

 

1COMPANHIA DE ENTREPOSTOS E ARMAZÉNS GERAIS DE SÃO PAULO. Guia CEAGESP - Maracujá. São Paulo: CEAGESP, 2020. Disponível em: http://www.ceagesp.gov.br/guia-ceagesp/maracuja-azedo. Acesso em: 22 abr. 2020.

 

2Op. cit. nota 1.

 

3COORDENADORIA DE DESENVOLVIMENTO RURAL SUSTENTÁVEL. Levantamento Censitário das Unidades de Produção Agropecuária do Estado de São Paulo. São Paulo: CDRS, 2017. Disponível em: http://www.cdrs.sp.gov.br/projetolupa. Acesso em: 29 abr. 2020.

 

4Op. cit. nota 1.

 

5INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA. Levantamento Sistemático da Produção Agrícola - LSPA. Rio de Janeiro: IBGE, 2018. Disponível em: https://www.ibge.gov.br/estatisticas/economicas
/agricultura-e-pecuaria/9201-levantamento-sistematico-da-producao-agricola. Acesso em: 26 abr. 2020.

 

6AGRIANUAL. Anuário da agricultura brasileira. São Paulo: Agra FNP Pesquisas, 2019. 448 p.

 

7INDICAÇÕES técnicas para garantir renda a todos os elos da cadeia produtiva do maracujá. EPAGRI, Itacorubi, 2020. Disponível em: https://www.epagri.sc.gov.br/index.php/2020/03/25/coronavirus-em-sc-confira-as-indicacoes-tecnicas-para-garantir-renda-a-todos-os-elos-da-cadeia-produtiva-do-maracuja. Acesso em: 25 abr. 2020.

 

8SAIBA qual o impacto do coronavírus na agropecuária nos últimos dias. Agro em Dia, Brasília, 2020. Disponível em: https://agroemdia.com.br/2020/04/04/saiba-qual-o-impacto-do-coronavirus-na-agropecuaria-nos-ultimos-dias. Acesso em: 28 abr. 2020.

 

 

 

Palavras-chave: Passiflora edulis, pandemia, comercialização, atacado/varejo, Estado de São Paulo.


 

Data de Publicação: 22/06/2020

Autor(es): Fernanda de Paiva Badiz Furlaneto (fernandafurlaneto@aptaregional.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Anelisa de Aquino Vidal Lacerda Soares Consulte outros textos deste autor
Marli Dias Mascarenhas Oliveira (marlimascarenhasoliveira@gmail.com) Consulte outros textos deste autor