Incertezas sobre o Consumo de Café Pressionam as Cotações Futuras


 

As medidas adotadas pelas autoridades públicas de todo o mundo, visando à diminuição do contágio com o vírus da SARS-CoV-2, afetaram o mercado de café. As cafeterias, bares e restaurantes foram obrigadas a fecharem suas portas ou, alternativamente, adotarem as entregas por meio do uso dos aplicativos2. Em um primeiro momento, acreditou--se que o consumo dentro do lar seria mais que suficiente para compensar a queda que ocorreria, necessariamente, no consumo fora do lar; assim, sob a insegurança quanto ao desempenho do consumo o mercado, pressionou as cotações do produto.

O mercado de café arábica negociado na Bolsa de Nova York, em maio de 2020, exibiu tendência de contínua queda na média semanal das cotações futuras para o produto (Figura 1). A tendência de queda nas cotações foi reforçada pelo início da colheita no Brasil, que registra ciclo de alta na atual temporada, associada ao incremento das vendas externas vietnamitas e aumento da colheita colombiana em maio3, 4. Ademais, a Green Coffee Association publicou, em seu relatório de maio, que os estoques até o último dia de abril de 2020 haviam se elevado em 494,3 mil sacas, totalizando, naquela data, 6,17 milhões de sacas em seus armazéns5.

O conjunto dos fatores mencionados promoveu declínio nas cotações futuras do arábica em Nova York. As médias das cotações da primeira semana de maio para a posição de setembro foram negociadas a US$¢111,64/lbp, declinando para US$¢103,03/lbp na média da última semana do mês em igual posição, ou seja, queda de 7,71% no período.

No Estado de São Paulo, segundo dados coletados pelo IEA/CDRS em seu principal cinturão produtor, registraram-se em maio de 2020 preços recebidos cadentes (queda de R$40,00/sc. ao longo do mês), encerrando-se na média em R$576,23/sc. Considerando-se como média para a cotação do dólar em maio de R$5,43, o preço recebido equivale a US$106,12/sc. Na última semana de maio, a cotação média para entrega em setembro foi de US$¢103,02/lbp, ou seja, US$136,27/sc., que em reais equivaleria a R$739,96/sc. Descontados aproximadamente 20% relativos ao diferencial e a taxas e emolumentos cobrados na contratação de hedge, obtêm-se R$591,96/sc., representando vantagem contábil de apenas R$15,74/sc., montante pouco atrativo para se preservar dos riscos da volatilidade do mercado6.

 

As cotações do café robusta da Bolsa de Londres registradas, em maio de 2020, não seguiram o padrão delineado pelo arábica, uma vez que os preços oscilaram, na média semanal em segunda posição, entre US$¢54/lbp e US$¢55/lbp (Figura 2). Explicação possível para esse movimento dos preços pode se assentar no aumento das compras de robusta por parte das torrefadoras visando produzir blends mais baratos, reposicionando suas marcas nesse período de incertezas quanto ao desempenho das vendas.

 

Em 2020, considerando o período de janeiro a abril, no Brasil, houve incremento de 27,2% nos embarques de café conilon frente a igual período do ano anterior. Assim, o total exportado pelo país alcançou 1 milhão de sacas. Ademais, no mercado de café solúvel, o acréscimo das exportações, nos quatro primeiros meses do ano foi de 100 mil sacas em equivalente verde, totalizando 1,33 milhão de sacas7.

A saída de participantes do mercado de café representados pelos fundos e grandes investidores foi intensa ao longo do mês. Na segunda semana, a posição líquida era de 5.283 contratos comprados, declinando para apenas 47 na última semana do mês. Tal baixa na posição líquida se relaciona com o derretimento das cotações futuras observadas ao longo do mês (Tabela 1).

 

 

O avanço da colheita no Brasil e o desenho mais claro sobre o consumo da bebida no contexto da pandemia deverão manter os preços pressionados ao longo de junho. Alguns países produtores, concorrentes do Brasil, têm informado dificuldades em proceder com a colheita devido às restrições para a mobilização de mão de obra. Todavia, ainda é prematuro asseverar que possa haver quebra de safra em razão dessa problemática.

Dois aspectos estão no radar dos agentes atuantes do mercado de café: um foco para o andamento da colheita no Brasil e outro comportamento do clima nas próximas semanas. As duas últimas frentes frias que trouxeram massas polares aos cinturões produtores não foram capazes de produzir danos às lavouras. Ademais, em razão do excesso de liquidez internacional desencadeada pelo afrouxamento fiscal visando à mitigação dos estragos econômicos provocados pela emergência sanitária, um novo equilíbrio para as cotações pode ser buscado pelos investidores, o que pode trazer perdas adicionais para os preços praticados para comercialização do produto.

 

1O autor agradece o trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido pelo analista de sistemas Paulo Sérgio Caldeira Franco, Agente de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do IEA.

 

2Estima-se que entre um quarto e um quinto do consumo da bebida distribuídas nos centros urbanos ocorra fora do lar.

 

3O crescimento das exportações de café robusta vietnamita nos cinco primeiros meses do ano incrementaram--se em 4,7%, totalizando 813.000 toneladas. COOPERATIVA REGIONAL DE CAFEICULTORES EM GUAXUPÉ – COOXUPÉ. Notícias. Minas Gerais: GUAXUPÈ, 2020. Disponível em: https://bit.ly/2ZRm6eN. Acesso em: 8 maio 2020.

 

4Devido ao aumento de produtividade das lavouras, a colheita de café lavado colombiano registrou elevação de 6% frente a maio de 2019. ACOSTA, L. J. Producción colombiana de café sube 6% en mayo, exportaciones caen. Noticias de Negocios, 3 jun. 2020. Disponível em: https://reut.rs/2z6o006. Acesso em: 8 maio 2020.

 

5GREEN COFFEE ASSOCIATION. May Report. Disponível em: http://greencoffeeassociation.org/. Acesso em: 8 maio 2020.

 

6INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA – IEA. Preços médios diários recebidos pelos produtores. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6. Acesso em: 8 jun. 2020.

 

7CONSELHO DOS EXPORTADORES DE CAFÉ DO BRASIL – CECAFÉ. Relatório Mensal abril/2020. São Paulo: CECAFÈ, 2020. Disponível em: www.cecafe.com.br. Acesso em: jun. 2020. 

 

Palavras-chave: cotações futuras, mercado de café, bolsa de valores.


Data de Publicação: 22/06/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor