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Cotação do Café sob o Impacto da Emergência Sanitária
Ao início de 2020, o mundo foi subitamente
surpreendido pelo anúncio, por parte do governo chinês, sobre a circulação de
um novo surto de doença respiratória altamente contagiosa e, em alguns casos,
fatal. A disseminação do coronavírus (2019 -nCoV) obrigou a tomada de rápidas
decisões como decretação de quarentena nas províncias onde se situam cidades
como: Wuhan (11 milhões de habitantes) Huanggang (7,5 milhões de hab.) e Hangzhou
(9,8 milhões de hab.). A população total colocada em quarentena pode superar os
40 milhões1, incluindo até a província autônoma de Macau. Os temores sobre a gravidade da
epidemia trouxeram preocupações para os investidores nos mercados de commodities. Os índices das principais
bolsas mundiais declinaram em razão das possibilidades concretas do surto
encolher o crescimento econômico chinês em até 1,2%, refletindo-se em perdas
para o PIB mundial de até 0,5%. Esse fenômeno sanitário ocorre, justamente, em
fase da economia mundial em que o crescimento segue anêmico e os bancos
centrais sem munição para atuar nas políticas monetária e fiscal. As consequências para o Brasil
dessa epidemia global são ainda mais drásticas. O anúncio de queda na produção
industrial em dezembro de 2019, por parte do IBGE, associada ao deficit na balança comercial registrado
em janeiro de 2020, tornaram muito menos plausível o cenário de retomada
vigorosa da economia. As previsões iniciais de crescimento do PIB, que rondavam
os 2,5% para 2020, são revisadas para percentual abaixo de 2,0%. Cotações do petróleo, minério de ferro, soja e milho
exibem substanciais baixas, não sendo o café uma exceção. Assim, na Bolsa de
Nova York, a tendência em janeiro de 2020 foi de persistente queda nas cotações
semanais do arábica. A média das cotações na primeira semana do mês para os
contratos futuros de jul./2020 (segunda posição) indicavam US$¢132,05/lbp,
reduzindo-se para US$¢108,07/lbp na média da quarta semana de janeiro de 2020,
ou seja, perda de mais de 18% no período (Figura 1). Os reflexos sobre a economia mundial e brasileira
não foram as únicas causas para o desabe das cotações na Bolsa de Nova York.
Previsões sobre um possível recorde de safra cafeeira no Brasil2,
também contribuíram para que os investidores se retraíssem, empurrando para
baixo ainda mais as cotações no mercado futuro. Dados do IEA/CDRS indicam que o preço médio recebido
pelos cafeicultores francanos para o tipo 6 bebida dura, em dezembro de 2019,
foi de R$458,72/sc.3 (queda do preço médio de 14,9% em 30 dias).
Esse valor representa US$110,00/sc. (média mensal de compra e venda:
US$1,0=R$4,17)4. Cotejando esse resultado do mercado à vista com
aquele praticado pelo futuro, para a média das cotações da primeira posição de
julho de 2020, de US$¢132,05/lbp resultaria em US$174,67/sc. Considerando custo
de contratação de aproximadamente 20% do ágio obtido, a vantagem de vender
futuro poderia resultar em incremento líquido no preço recebido de até
R$125,00/sc. para entrega em julho. Na Bolsa de Londres, a média das cotações semanais
em janeiro de 2020 acompanhou a tendência constatada para o arábica com
seguidas quedas nas cotações (Figura 2). O efeito sobre os mercados da epidemia
de coronavírus arrastou para baixo as cotações a expensas da queda de 30,6% dos
embarques vietnamitas5. A repentina baixa nas cotações provocou imediata
reversão nas posições dos fundos e grandes investidores. No balanço entre
comprados e vendidos, o saldo líquido diminuiu a quase metade daquilo que
contabilizava ao início do mês (Tabela 1). A disparada das vendas ocorreu mesmo
com a queda de 119 mil sacas nos estoques certificados sendo divulgada pela
Green Coffee Association6. Ainda é um bocado incerto o que poderá ocorrer com o
mercado de commodities sob o impacto
do coronavírus. Para o caso do café, analisando os dois outros surtos ocorridos
nos últimos 20 anos7, pode-se esperar inclusive elevação do consumo
a depender a extensão e duração dessa nova epidemia. 1LIY, M.V. China
amplia a quarentena pelo coronavírus e deixa 41 milhões de pessoas isoladas. El País, Pequim: 24 jan. 2020. Disponível
em:
https://brasil.elpais.com/internacional/2020-01-23/china-amplia-a-quarentena-pelo-coronavirus-e-deixa-20-milhoes-de-pessoas-isoladas.html.
Acesso em: 5 fev. 2020. 2A tradicional
exportadora COMEXIM estimou que a safra brasileira deverá alcançar 67,7 milhões
de sacas o que resultaria em excedente mundial de 3,5 milhões de sacas. Ver: EXPORTADORA
de café Comexim vê safra recorde no Brasil este ano. Centro do Comércio de Café de Minas Gerais, Varginha, 28 jan. 2020.
Disponível em: http://cccmg.com.br/exportadora-de-cafe-comexim-ve-safra-recorde-no-brasil-este-ano/.
Acesso em: fev. 2020. 3No primeiro
levantamento de safra 2020/21 a CONAB estimou colheita entre 57,2 milhões e
62,02 milhões de sacas beneficiadas. Ver: COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO.
Safra 2020. Acompanhamento da safra brasileira de café, Brasília,
v.6, n. 1, jan. 2020. Disponível em: https://www.conab.gov.br/info-agro/safras/cafe.
Acesso em: fev. 2020. 4INSTITUTO DE
ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios diários
recebidos pelos produtores. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em:
http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6.
Acesso em: 5 fev. 2020. 5PTAX. Dólar Americano (USD) – Ptax. Recife: PTAX, 2020. Disponível em: https://www.ptax.com.br/cotacao-ptax/dolar-americano-usd. Acesso em: fev. 2020. 6VIETNÃ vê queda
de mais de 30% na exportação de café em janeiro. Centro do Comércio de Café de Minas Gerais, Varginha, 29 jan. 2020.
Disponível em: http://cccmg.com.br/vietna-ve-queda-de-mais-de-30-na-exportacao-de-cafe-em-janeiro/. Acesso
em: fev. 2020. 7GREEN COFFEE ASSOCIATION. Warehouse Information. New York, Green
Coffee Association. Disponível
em: http://greencoffeeassociation.org/professionalresources/warehouse_information. Acesso
em: fev. 2020. 8VEGRO, C.L.R.
Impacto Coronavírus sobre o Consumo Potencial de Café. Análises e Indicadores Do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 2, fev.
2020. Disponível em: http://www.iea.agricultura.sp.gov.br/out/TerTexto.php?codTexto=14755. Acesso
em: fev. 2020. Palavras-chave: mercado de café, bolsas de commodities, cotações.
Data de Publicação: 18/02/2020
Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor