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Um Café para o BREXIT
Por meio da convocação de plebiscito, em junho de
2016, os cidadãos pertencentes ao Reino Unido foram consultados sobre o
interesse de se manterem vinculados ao bloco europeu formado por 28 países, e
ao qual o território insular pertencia desde 1973. Sagrou--se vitoriosa (por
mínima margem) o posicionamento de rompimento com o bloco. Pelo Tratado de
Lisboa, o Reino Unido teria dois anos para concretizar seu “divórcio”1. Desde a proclamação do resultado das urnas, a falta
de consensos associada a disputas políticas internas do parlamento britânico
têm impedido o desenho de protocolo de encaminhamento do rompimento, que poderá
se concretizar sem período de transição e imposição de fronteira “dura” entre a
República da Irlanda (ainda membro da União Europeia) e a Irlanda do Norte
(estado pertencente ao Reino Unido), fato que potencialmente pode reacender
disputas entre facções favoráveis e contrárias a reunificação da Irlanda. As repercussões do impasse se acumulam. Muitas
companhias, especialmente as dedicadas às finanças e sedes de grupos
transnacionais, procuram formas de se reposicionar para evitar as perdas
econômicas estimadas com o estabelecimento de controles e taxas para as
transações comerciais e movimentação de trabalhadores. Do lado governamental,
toda uma legislação terá que ser preparada para regulamentar a nova situação
econômica, financeira, sanitária e de trânsito de pessoas. Com a aproximação das eleições para composição do
novo parlamento europeu, não há mais como adiar a implementação da decisão de
rompimento, tendo em vista que as cadeiras britânicas serão remanejadas para os
demais países membros do bloco. Sem a perspectiva de um acordo contemplando
regras de transição, o Reino Unido se encaminha para um trágico desfecho dessa
estulta decisão. As exportações do agronegócio poderão sofrer
impactos significativos. Os negociadores europeus preveem repactuar as cotas
destinadas ao ingresso de produtos brasileiros, particularmente nas carnes e no
açúcar, aspecto contra o qual se posicionam os adidos do Itamaraty2.
Para o caso do café, aparentemente, o previsto
rompimento já se traduz em maiores oportunidades de negócios. Considerando as
exportações para a União Europeia no primeiro trimestre de 2019,
comparativamente ao trimestre encerrado em 2018, constatou-se que houve
incremento de 20,34% na quantidade, sendo que nesse quesito, para o Reino
Unido, a expansão foi mais que o dobro, de 46,29% (Tabela 1). Tabela
1 –
Exportações Brasileiras de Café para a União Europeia e União Europeia exceto
Reino Unido, Primeiro Trimestre de 2018 e 2019 Item 1º trimestre 2018 1º trimestre 2019 US$ milhão 1.000 t US$ (milhão) 1.000 t UE 645,57 242,29 646,49 291,59 UE - UK 611,21 230,97 607,80 275,03 UK 34,36 11,32 38,69 16,56 Participação UK/UE (%) 5,32 4,68 5,98 5,68 Fonte:
Elaborada pelo autor a partir de dados do MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Secretaria de
Comércio Exterior. Sistema ComexStat. Brasília: ME/SECEX, 2019.
Disponível em: http://comexstat.mdic.gov.br. Acesso em: abr. 2019. Detalhando-se os resultados dos embarques
brasileiros com destino ao Reino Unido, constata-se que, no primeiro trimestre
de 2019, destacaram-se as aquisições de conilon, com incremento no período
considerado de 231% nos embarques (Tabela 2). Tabela
2 –
Exportações Brasileiras de Café para o Reino Unido, Primeiro Trimestre de 2018
e 2019 Item 1º
trimestre 2018 1º
trimestre 2019 US$ milhão 1.000 t US$ milhão 1.000 t Arábica 22,67 7,73 18,60 7,32 Conilon 4,78 2,81 13,59 9,33 Solúvel 4,35 2,38 5,60 2,39 Total 31,78 11,98 37,79 19,04 Fonte: Elaborada pelo autor a partir de dados do
MINISTÉRIO DA ECONOMIA. Secretaria de Comércio Exterior. Sistema ComexStat.
Brasília: ME/SECEX, 2019. Disponível em: http://comexstat.mdic.gov.br. Acesso
em: abr. 2019. Aparentemente, o prenúncio de rompimento do Reino
Unido sem acordo com a União Europeia, e as tão invejadas reexportações do
bloco continental para os demais membros comunitários e alhures poderão ser
capturadas pelo Brasil. A aceleração das compras britânicas pode ser indicadora
de que os operadores desse mercado (suprimento de café verde e solúvel para o
mercado doméstico) se posicionam no sentido de estabelecer canais fluentes de
negociação com os exportadores e industriais brasileiros, uma vez que, nas transações
com o bloco continental, poderão surgir taxas alfandegárias comuns a não
membros da União Europeia. Considerando que se trata de uma nação
tradicionalmente habituada ao chá, a expansão do consumo de café no mercado de
café no Reino Unido é bastante promissora. A expansão de redes de cafeterias,
associada à preferência por parte dos jovens pelas bebidas geladas a base de
café, catapultou o mercado da bebida para além da demanda por chá, sendo
atualmente o mercado de café o maior mercado de bebidas quentes naquele
território. Compete aos exportadores brasileiros acionar seus contatos para
acelerar os embarques, deslocando os ativos reexportadores situados no
continente europeu. Na atual quadra de baixa nas cotações no mercado
internacional do produto, torna--se imprescindível um trabalho de inteligência
comercial, visando dotar o Brasil das melhores condições de assumir posição
ímpar numa eventual (espera-se que breve) inversão do ciclo de preços. 1Prevê-se,
ademais, o pagamento de multa contratual de algumas dezenas de bilhões de
libras à União Europeia. 2Produtos exportados pelo Brasil como frutas, café, tabaco e
madeira recebem tributação, em média, de 6% a 18% para entrarem no Reino Unido.
Mas a primeira-ministra britânica, Thereza May, já informou que, caso, a saída
seja sem acordo, as tarifas sobre esses produtos seriam reduzidas a zero. Veja
em: ODILLA, F. Governo brasileiro tenta impedir impacto do BREXIT para empresas
no país. BBC News, Londres, 8 abr.
2019. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/brasil-47853649. Acesso em: abr.
2019. Palavras-chave: exportações
de café, BREXIT.
Data de Publicação: 26/04/2019
Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor