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Diagnóstico da Produção e Consumo de Leite no Estado de São Paulo
Grande consumidor de lácteos, o Estado de São Paulo
tem um desafio crescente em relação à sua produção que, nos últimos dez anos,
vem se mantendo estável. Esse fato gera um deficit
crescente que é suprido por leite e produtos lácteos importados de outros
estados brasileiros ou mesmo de outros países. Produtos como queijos, leite em
pó e soro de leite são tradicionais na pauta de importações brasileiras do
exterior e, mais recentemente de forma crescente, a aquisição também de leite
fluido de outros estados, pasteurizados longa vida ou leite cru resfriado para
beneficiamento em laticínios paulistas. Um
aspecto importante para a produção de leite é o comportamento da área de
pastagens, que no Estado de São Paulo apresenta quedas ao
longo dos últimos anos, de acordo com os dados do levantamento subjetivo do
IEA/CATI1; nos últimos 4 anos, porém, nota-se uma estabilização na
área de pastagens no estado (Figura 1). A perda em área se dá por conta da expansão de outras culturas,
como cana-de- -açúcar e eucalipto2.
Diversas causas podem ser associadas como corresponsáveis para este quadro de
falta de evolução da produção leiteira do estado. Uma razão que explica essa
configuração é o maior rendimento financeiro por hectare atribuído a estas
culturas que estão ampliando suas áreas com a consequente incorporação de áreas
de pastagens para sua produção. Pode-se considerar ainda que outros fatores
indiretos também estão contribuindo para esse movimento: aspectos como o
envelhecimento da população do campo, a falta de interesse dos jovens em dar
continuidade nas atividades dos pais, o custo e a dificuldade de contratação de
mão de obra especializada para o trabalho com o leite, a escala de produção e o
nível tecnológico dos produtores são bons exemplos que podem justificar e ajudar
a esclarecer os motivos para essa estagnação na produção. A concorrência em
relação à produção de outros estados também tem sua parcela nos obstáculos que
a produção paulista tem de superar. Os custos de produção destes estados são
inferiores aos dos produtores paulistas, tornando o mercado de São Paulo
interessante para colocar parte da sua produção a preços mais competitivos, o
que acaba conferindo um quadro que desestimula o crescimento da atividade
leiteira no Estado. Esse conjunto de considerações também influencia e é influenciado
pela dinâmica de composição dos rebanhos. Em 2017, o número total de bovinos
destinados à produção de leite no Estado de São Paulo foi estimado em 1,2
milhão de cabeças3, conforme dados da pesquisa subjetiva IEA/CATI
(Figura 2) e, da mesma forma que na área de pastagem, houve uma redução no
total de animais. Ainda de acordo com a figura 2, no período de 2008 a 2017
houve pouca variação no rebanho de gado leiteiro, oscilando entre 911 mil e 1,4
milhão de cabeças, com média anual de 1,2 milhão no período considerado. A essa população de vacas classificadas como leiteiras, deve-se
acrescentar o rebanho de gado misto, que também contribui para a produção
leiteira. No levantamento por municípios realizado pelo IEA, o número de animais
classificados como gado misto, de dupla aptidão que tanto fornecem animais para
o abate como também produzem leite, acompanhou esse movimento de queda
e limitada variação no número total de cabeças (Figura 2). Observa-se para esse
grupo de animais uma queda mais acentuada no plantel nos últimos dez anos. As figuras 1 e 2 são coerentes
e pode-se verificar que os indicadores apontam na mesma direção: área de
pastagem em queda, rebanho leiteiro em queda e rebanho misto também.
Completa-se esse quadro ao verificar-se que a produção de leite, ao longo dos
anos, também evidencia uma clara inclinação negativa da curva (Figura 3).
Observa-se uma tendência de estabilização da produção de leite no estado nos
últimos anos, seguindo a mesma tendência apresenta na figura 1 em relação ao
comportamento das áreas de pastagem. Como consequência
deste declínio, a participação do Estado de São Paulo na produção brasileira de
leite em 1996 ocupava a terceira posição (10,7%), em 2006 passou para a quinta posição
(6,9%), e em 2016 estava na sexta colocação (5,0%), conforme apontado em estudo
sobre a cadeia leiteira brasileira e seus derivados (IPECE)4. Nos últimos anos, a produção de São
Paulo em relação à brasileira corresponde a aproximadamente 5% do total (Tabela
1), com base nos dados da Pesquisa Pecuária Municipal (PPM) do IBGE5.
Os dados de 2016 indicam uma produção nacional de 33,6 bilhões de litros,
enquanto a produção paulista naquele ano foi de 1,7 bilhão de litros de leite. Considerando-se a base
da produção de leite paulista, nota-se que o rebanho especializado leiteiro é
composto por produtores de diferentes níveis tecnológicos distribuí- O desnível tecnológico
e de escala na produção primária torna difícil a permanência na atividade, o
que resulta no decréscimo do leite produzido. O segmento mais vulnerável deste grupo que compõe
esta cadeia é o de produtores que, no caso de São Paulo, é ainda mais crítico,
pois, apesar de o processo de formação do cooperativismo leiteiro ter sido
liderado pelo Estado, iniciado em 1931 no Vale do Paraíba, vários fatores
contribuíram para que o sistema tenha perdido sua eficiência7. Esse
tipo de associação, nos estados do Sul, devido a questões culturais, auxiliou
muito quanto aos aspectos econômico-administrativos da atividade o que
viabilizou o crescimento da produção leiteira. Milinski, Guedine e Ventura8 definem a
cadeia do leite como: um sistema agroindustrial aberto e complexo, em transformação e formado por
múltiplos setores que são interdependentes e que interagem entre si buscando a
ampliação da competitividade da atividade leiteira. A cadeia do
leite no Brasil é composta por múltiplos setores: empresas responsáveis por
insumos (máquinas e equipamentos, embalagens, rações, produtos veterinários e
base genética, uso de inseminação artificial), empresas processadoras de
diferentes capacidades de beneficiamento e por empresas da rede varejista.
Todos eles buscam ampliar suas margens, e pode-se dizer que na realidade a meta
de crescimento de cada componente dessa cadeia não considera a origem do
produto, o produtor de leite, que por sua vez está em meio à uma verdadeira
disputa entre os diversos segmentos componentes desta cadeia. A união de produtores em
cooperativas ou associações de produtores contribui, como se verifica em alguns
estados, para facilitar a administração e a organização da produção de leite
bem como dos próprios produtores, reduzindo custos de administração e de
produção por meio da compra de insumos em conjunto. Além disso, aspectos de melhoria no
produto implementadas por estas organizações, considerando a qualidade e sanidade
do leite produzido, vão resultar em aumento na produtividade, dado que melhorar
geneticamente o rebanho passa a ser condição para que o aumento na produção
também melhore a competitividade. Essa estrutura se constitui em uma forma de
fortalecer o segmento produtor. A produção
brasileira de leite tem uma evolução que é a somatória das características de
todos os estados que a compõem e seu crescimento não é exuberante; em relação a
isso, a produção paulista tem decrescido e nos últimos anos está praticamente
estagnada, embora o consumo cresça no mínimo o equivalente ao crescimento
populacional. De que forma o estado está complementando suas necessidades dessa
proteína? O volume de leite que é
importado de outros países e o que vem de outros estados da Federação, tanto
cru resfriado para o beneficiamento em São Paulo quanto o leite UHT longa vida,
acabam por complementar esse gradual declínio da participação da produção
estadual no consumo paulista, garantindo a oferta. De acordo
com a tabela 2, o Estado de São Paulo importou aproximadamente 38% do volume
total de lácteos que entrou no país9. Este volume, quando
transformado em leite que entra sob a forma desses produtos para o consumo, é
um indicador da demanda maior que a produção. Ele, no entanto, representa uma
pequena parcela do total de leite consumido tanto no Estado de São Paulo quanto
em todo o território nacional. Além do
leite importado, há também o leite produzido em outros estados, que complementa
a produção de São Paulo. Em 2017, passaram pelos laticínios paulistas
inspecionados pelo SIF10 2,9 bilhões de litros de leite fluido,
conforme os indicadores do IBGE de março de 201811, e deste total,
1,2 bilhão de litros são oriundos de outros Estados12 (Figura 4). É
possível perceber o crescimento do volume recebido em São Paulo de procedência
de outros estados brasileiros no período considerado na análise da figura 4
(2009 a 2017). A soma dos volumes de leite com origem
nos três principais Estados de origem dos lácteos recebidos em São Paulo, que
são Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina, chegou a mais de 1 bilhão de litros
em 201713(Figura 5). Em resumo, a
coleta e discussão das informações relacionadas a aspectos importantes da
produção leiteira no Estado de São Paulo mostram mudanças qualitativas e
quantitativas que evidenciam a redução dos rebanhos leiteiro e misto, assim
como da produção de leite. Apesar disso, a atividade ocupa posição de destaque
na agricultura paulista ao figurar, em 2017, como a oitava atividade dentre as
mais bem colocadas no total do Valor da Produção Agropecuária Paulista (VPA)14,
considerando a produção efetiva do plantel paulista
de bovinos destinados a produção de leite. A combinação dos vários pontos que
incidem sobre a produção, o beneficiamento e a comercialização do leite estão
configurando o ambiente produtivo em que toda a cadeia está inserida. Diante
do cenário de estagnação e poucos indícios de mudança na tendência apresentada
nos últimos anos, resta questionar quais as possibilidades e caminhos de
recuperação e construção de um novo futuro para a atividade leiteira no Estado
de São Paulo. Nesse contexto, estudos conduzidos pela
Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo resultaram no
Plano Mais Leite, Mais Renda15, cujo propósito era fortalecer a
competitividade na produção leiteira paulista, tendo como ponto de referência o
diagnóstico da cadeia produtiva. Espera-se que, por meio de medidas propostas
neste plano, seja possível atingir os objetivos propostos, que são: “incremento
da produção e produtividade, da qualidade do leite produzido, bem como o
aumento da renda, principalmente dos produtores familiares” por meio da adoção
de práticas sustentáveis de gestão e produção, tendo como meta principal o
aumento da produtividade por vaca. _______________________________________________________ 1Levantamento por
município ou levantamento subjetivo, como também é conhecido,
é realizado em todos os municípios, nos meses de
fevereiro, abril, junho, setembro e novembro, sendo que em junho (previsão) e
novembro (estimativa final) inclui em sua pesquisa questões sobre a população e
a produção animal do estado. As informações sobre as cadeias animais,
levantadas nos meses de junho e novembro, têm por base os municípios e são
relativas às populações e às produções animais do Estado de São Paulo,
agrupadas por Escritório de Desenvolvimento Rural (EDR) e totalizadas para o
Estado São Paulo. Elas estão disponibilizadas no Banco de Dados do IEA
(www.iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html) e na Série Informações
Estatísticas da Agricultura: anuário IEA. 2OLIVETTE, M. P. A. et al.
Evolução e prospecção da agricultura
paulista: liberação da área de pastagem para o cultivo da cana-de-açúcar,
eucalipto, seringueira e reflexos na pecuária, 1996-2030. Informações Econômicas, São Paulo, v. 41, n. 3, p. 37-67, mar.
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formação de um sistema cooperativista no Brasil. São Paulo: HRM Editores
Associados, 1983. 246 p. 8MILINSKI, C. C.; GUEDINE, P. S. M.; VENTURA, C. A. A. O sistema
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BRASILEIRO DE SISTEMAS, 4., 2008, Franca. Anais eletrônicos... Franca: Uni-FACEF,
2008. p. 1-17. Disponível em: <http://legacy.unifacef.com.br/quartocbs/artigos/C/C_151.pdf>.
Acesso em: set. 2018. 9MINISTÉRIO
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Acesso em: set. 2018. 10MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO - MAPA. Serviço de Inspeção Federal (SIF).
Entrada de leite de outros estados, 2009 a 2017. Brasília: MAPA. Disponível em:
<http://www.agricultura.gov.br/assuntos/inspecao/produtos-animal/sif/servico-de-inspecao-federal-sif>.
Acesso em: set. 2018. 11INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Sistema IBGE de Recuperação Automática (SIDRA). Pesquisa trimestral
do leite. Rio de Janeiro: IBGE, 2018. Disponível em:
<https://sidra.ibge.gov.br/pesquisa/leite/tabelas>. Acesso em: set. 2018. 12Op. cit. nota 10 e nota 11. 13Op. cit. nota 10 e nota 11. 14SILVA,
J. R. et al. Valor da produção agropecuária do Estado de São Paulo: resultado
final, 2017. Análises e Indicadores do
Agronegócio, São Paulo, v. 13, n. 5, p. 1-7, maio 2018. Disponível em: <http://www.iea. 15PAGANI
NETTO, C. et al. Mais leite, mais renda: plano de desenvolvimento da bovinocultura
leiteira paulista. Campinas: CATI/SAA, 2017. 72 p. Disponível
em:
<http://www.cati.agricultura.sp.gov.br/portal/themes/unify/arquivos/projetos-e-programas/Bovinocultura%20de%20Leite.pdf>.
Acesso em: set. 2018. Palavras-chave: produção de leite, levantamento subjetivo IEA/CATI, efetivo
e produção da bovinocultura de leite.
dos entre pequenos, médios e grandes produtores. Entre os pequenos produtores,
a atividade leiteira geralmente não é a principal fonte de renda da propriedade
que consequentemente apresenta índice de produtividade baixo. Os outros
segmentos, médios e grandes produtores, costumam apresentar melhores índices de
produtividade por animal. O rebanho misto, da mesma forma que os pequenos
produtores do rebanho leiteiro, não tem na atividade leiteira sua principal
fonte de renda. Há nessa categoria grande número de produtores com baixos
índices zootécnicos, tanto na produção de animais para corte quanto na produção
de leite6.
www.ipece.ce.gov.br/informe/ipece_informe_128_30_Maio_2018.pdf >. Acesso
em: 18 jun. 2018.
ibge.gov.br/estatisticas-novoportal/economicas/agricultura-e-pecuaria/9107-producao-da-pecuaria-municipal.html>.
Acesso em: 14 jun. 2018.
sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-28-2018.pdf>. Acesso em: set. 2018.
Data de Publicação: 17/09/2018
Autor(es):
Carlos Nabil Ghobril (nabil@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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Rosana de Oliveira Pithan e Silva (rosana.pithan@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor