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O Custo da Precipitação
Os produtos cárneos brasileiros ganham crescente
aceitação nos mercados internacionais, dentre eles os considerados de maior
exigência de qualidade sanitárias como os do Japão e dos Países Baixos. Em
2016, por exemplo, considerando as exportações de todos os tipos (bovina, de
frango, pato, perus, suína, equídeos e outros), in natura e industrializada apenas1, produziram
resultado cambial de US$13,91 bilhões, dos quais cerca de 87% foram obtidos
pelas exportações das carnes bovina e de frango. China e Hong Kong absorveram
aproximadamente um quarto daquele total de embarques brasileiros. Aproximadamente
50% das exportações são atingidas quando se acrescentam outros destinos
relevantes, como Arábia Saudita, Federação Russa, Japão e Países Baixos. O Estado de São Paulo se destacou, em 2016, nos
embarques de carne bovina, perfazendo cerca de 30% do total exportado pelo
país, contabilizando US$5,34 bilhões. Os principais destinos da carne originada
em São Paulo assemelham-se aos destacados nas exportações brasileiras, com
China e Hong Kong como principais clientes, seguidos pelos EUA, Egito e Reino
Unido. Juntos esses cinco destinos perfizeram 60% das vendas ao exterior com
origem em frigoríficos situados em território paulista. No primeiro bimestre de 2017, os embarques
brasileiros do conjunto das carnes (in
natura e industrializada, apenas) totalizaram US$2,28 bilhões,
representando expansão de 18% frente ao mesmo período do ano anterior (Tabela
1). Tal salto foi fortemente centrado no aumento das vendas internacionais de
carne de frango que, ao faturar no bimestre US$1,22, incrementou-se em 31%
frente a igual período do ano anterior. Também, se destacaram as exportações de
carne suína que, entre janeiro e fevereiro de 2017, carrearam US$250,74 milhões
com salto de 53% frente ao primeiro bimestre de 2016. No primeiro bimestre de 2017 houve, ainda,
incremento no quantum exportado pelo
país (excetuando-se a bovina), alcançando 1,03 milhão de toneladas embarcadas,
ou seja, 7,10% de expansão. Ademais, esse crescimento ocorre sob majoração do
preço médio que de US$2.016,48/t, praticado no primeiro bimestre de 2016, salta
para US$2.220,72/t no mesmo bimestre de 2017, representando, portanto, +10,13%.
Tal evolução in- dica
que os produtos cárneos brasileiros, por intermédio da qualidade intrínseca que
possuem, associada ao esforço comercial das empresas que atuam nesse ramo em
abrir novos mercados, avançam na captura de valor formado ao longo dessa cadeia
agroalimentar. As exportações paulistas de carnes in natura e industrializadas, no
primeiro bimestre de 2017, ao contrário daquilo que se verificou para o caso
nacional, recuaram 9,25% frente a igual período do ano anterior. Tal queda foi
observada em todos os itens, com destaque, porém, para as carnes bovinas em que
o declínio no bimestre foi de 13,95%. Tampouco houve incremento no preço médio,
uma vez que, no primeiro bimestre praticou-se US$2.987,51/t, enquanto no mesmo
período do ano anterior o preço médio era de 2.942.32/t, mantendo-se, portanto,
bastante estável nesse comparativo. Em 17 de março de 2017, após dois anos de
investigações sigilosas, em especial da delegacia da Polícia Federal sediada no
Paraná, desencadeou a operação denominada “Carne Fraca”, na qual se procedeu a
condução coercitiva de empresários do ramo de frigoríficos acusados de formar
conluio com fiscais agropecuários residentes nas plantas frigorificas e denúncias formais contra delegados federais do Ministério
de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e lideranças políticas, no
sentido de facilitar a liberação de lotes de produtos sem a devida segurança
sanitária exigida pela legislação. Verdadeiro pânico se instalou sem que ao
menos se comprovasse que alguém tinha sido contaminado2. Essa ação
ganhou o noticiário internacional, configurando-se em ameaça real ao comércio
brasileiro de carnes, com imediato levantamento de barreiras em vários países,
alguns de importância ímpar para as exportações brasileiras. O impacto sobre o comércio internacional da ação
pode ser quantificado a partir da compilação dos dados relativos aos embarques
de carnes in natura e industrializadas ocorridos em março de 2017. Em termos
globais, as exportações de carnes em março de 2017, ao contabilizar US$1,32
bilhão, superaram as registradas em março de 2016 em 8,67%, destacando-se o
avanço do valor das carnes de frango e suína (Tabela 2)3. Mais
relevante ainda é a constatação que esse incremento de valor ocorreu com
redução da quantidade embarcada, refletindo melhoria nos preços médios
praticados (+16,14%). As exportações brasileiras tiveram pequeno declínio
nas transações envolvendo carne bovina, tanto em valor (-3,25%) quanto em
quantidade (-11,19%). O expressivo salto nos preços médios praticados (+8,94%)
na comparação dos períodos foi o que impediu maior declínio no saldo cambial
apurado. No caso paulista, em que já havia queda nos
embarques do primeiro bimestre, constatou-se aprofundamento da tendência. Em
relação à carne bovina, segmento que São Paulo possui maior expressão frente
aos demais estados, o impacto foi tremendo, uma vez que, em março de 2017, o
valor apurado pelos embarques de US$115,67 milhões posicionou-se -19,52% em
relação ao resultado do mesmo mês do ano anterior. O quantum exportado também encolheu em 23,63%, registrando em março
de 2017 apenas 47,83 mil toneladas. O prejuízo comercial somente não foi mais
acentuado, devido à melhoria no preço médio que saltou de US$2.849,69/t para
US$3.119,05/t na comparação entre marços de 2016 e 2017. Adotando hipótese plausível de que os 9,25% de
redução nos embarques paulistas do primeiro bimestre do ano se mantivesse sobre
março de 2017, o montante apurado pelo segmento alcançaria aproximadamente
US$162 milhões. Entretanto, o saldo cambial efetivo obtido no mês de US$149,17
milhões revelou o “custo da precipitação” por parte da Polícia Federal para os
frigoríficos paulistas, estimado, assim, em US$12,78 milhões, que ao câmbio
atual equivale a R$40,25 milhões. Nesta análise não foram considerados as imediatas
repercussões da operação policial em âmbito do mercado interno. Levantamento
estatístico com 1.067 paulistanos revelou que um em cada três consumidores
diminuiu o consumo de carnes após a operação da Polícia Federal4.
Ademais, os principais grupos econômicos vinculados ao segmento registraram
expressivas baixas na cotação de suas ações5. Portanto, o “custo da precipitação”
foi muito maior do que o mensurado quando apenas se contabilizam as
exportações, particularmente, as paulistas. A recuperação da demanda no mercado
das carnes exigirá empenho e harmonização eficaz entre as esferas pública e
privada, reestabelecendo em patamar saudável, a regulação do segmento. ________________________________________________ 1As exportações das
carne in natura e industrializada
perfizeram, em 2016, 97,9% do total dos embarques. Os demais tipos não
contabilizados nesta análise são: carnes salgadas e demais carnes, preparações
e miúdos. A simplificação do levantamento não trouxe prejuízo as suas
conclusões. 2VARELLA, D. Carne Enfraquecida. Folha de S. Paulo, São Paulo, C10, 1 abr. 2017. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/colunas/drauziovarella/2017/04/1871557-carne-enfraquecida.shtml>.
Aces- so em: abr. 2017. 3MENDES, L. H.; ZAIA, C.; BITTENCOURT, R. Embarques perdem
força em março. Valor Econômico, São
Paulo, B10, 4 abr. 2017. Disponível em:
<http://www.valor.com.br/agro/4925696/embarques-perderam-forca-em-marco>.
Acesso em: abr. 2017. 4OLIVEIRA, F. 3 de cada 10 paulistanos dizem comer menos
carne após operação da PF. Folha de S.
Paulo, 11 abr. 2017. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2017/04/1874413-um-de-cada-tres- 5JBS e BRF perdem R$5 bi em valor de mercado. Portal Avicultura Industrial, 17 abr.
2017. Disponível em: <http://www.aviculturaindustrial.com.br/imprensa/jbs-e-brf-perdem-r-5-bi-em-valor-de-mercado/20170417-093612-v251>. Acesso em: abr. 2017. Palavras-chave: “Carne Fraca”, qualidade dos alimentos, Polícia
Federal, exportações financeiras.
paulistanos-afirma-comer-menos-carne-apos-acao-da-pf.shtml>. Acesso em: abr. 2017.
Data de Publicação: 20/04/2017
Autor(es):
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
José Alberto Angelo (jose.angelo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor