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Algodão no Estado de São Paulo, 2005 a 2014
O algodão, tradicional cultura no Brasil e no Estado
de São Paulo, tem ofertado ao mercado um volume médio de 1,7 milhão de toneladas de pluma, que garante ao país
ficar entre os cinco maiores produtores mundiais, com China, Índia, EUA e
Paquistão. Além disso, ocupa a terceira posição entre os maiores exportadores
mundiais da fibra, segundo a Associação Brasileira de Produtores de
Algodão (ABRAPA).
Considerando-se a importância na geração de empregos, só o Estado do Mato
Grosso, principal produtor brasileiro, gera 37 mil empregos diretos no campo1.
Ainda sobre esse assunto, o setor têxtil e de confecção brasileiro, outro elo
da cadeia, é responsável por mais de 1,7 milhão de empregos em todo o país2.
Presente desde o início da colonização brasileira, começou a ganhar status de produto relevante para São
Paulo com a introdução de variedades herbáceas pelos ingleses, em 1861. Desde
então, o rumo da cotonicultura paulista foi direcionado principalmente para as
exportações e para o abastecimento da indústria têxtil estadual, que se
consolidou em 18903. O elo entre a cultura e a indústria têxtil foi
realmente decisivo para a consolidação da cotonicultura nacional, que adquiriu
força e cresceu também como produto relevante na pauta de exportações do país.
No Estado de São Paulo, o cultivo de algodão também esteve ligado à colonização
e à ampliação da fronteira agrícola, passando por diversos momentos de expansão
e retração, conforme os ciclos econômicos nacionais e mundiais. Na década de
1970, a produção paulista atingiu grande importância, com participação
significativa no total nacional, tanto na pauta de exportações quanto no
fornecimento de matéria-prima à indústria têxtil do estado4. A participação intensa na produção por parte de
pequenos e médios produtores caracterizou a base de produção paulista de
algodão5. A base para a participação de São Paulo no cenário
nacional desta cultura foi composta pela pequena e média propriedade, o emprego
de grande número de trabalhadores rurais como mão de obra e o fato de que, no
período áureo do algodão no Estado de São Paulo, esta cultura remunerava o
produtor. Esta fórmula garantiu que, entre períodos de alta e baixa da cultura
no mercado interno e externo, ela se desenvolvesse garantindo a permanência
desta atividade em boa parte das propriedades paulistas. Em toda a trajetória do algodão no Brasil, duas regiões
se destacaram tanto no volume produzido quanto na participação nas exportações
brasileiras: o Sudeste, com São Paulo e Minas Gerais, e o Nordeste,
representado principalmente pelo Ceará6. Destacam- -se mais
recentemente dois momentos que foram decisivos para a cultura no Brasil e no
Estado de São Paulo. O primeiro ocorreu na década de 1980, após a infestação
das plantações pela praga Anthonomus
grandis,
popularmente conhecida como bicudo, que comprometeu principalmente a produção do
Nordeste. No Estado de São Paulo, o efeito da introdução desta praga foi o de
comprometer a produção e retirar da atividade o pequeno agricultor. Para o
pequeno produtor, não houve condições de acompanhar os custos de produção, que
cresceram acentuadamente principalmente com a utilização de insumos e
defensivos apropriados para o combate da praga. O segundo período foi na década de 1990, quando
novamente alguns fatos alteraram a configuração do setor algodoeiro nacional e,
consequentemente, os rumos da produção estadual. Mudanças nas condições de
oferta no mercado internacional que, somadas à necessidade de suprir com
matéria-prima a indústria têxtil nacional, favoreceram a importação de algodão,
mudando a condição do Brasil de grande exportador para grande importador. Essas
medidas que estimularam a importação desestabilizaram o sistema de produção
paulista e abriram espaço para o surgimento de um novo polo de produção. Surge
neste momento uma nova fase da cotonicultura nacional, na qual alguns Estados
do Centro-Oeste e do Nordeste (Mato Grosso e Bahia) tornaram-se representantes. A partir deste período, as características da
cotonicultura nacional desenvolvidas nessas regiões, como plantio em
grandes áreas de até 2.500 hectares, insumos de ponta, solo de topografia
adequada para a utilização de mecanização do plantio à colheita, uso de métodos
da agricultura de precisão e baixo emprego de mão de obra passaram a nortear o
novo produtor de algodão. Consolida-se o novo modelo de produção a partir do
crescimento da importância dos Estados de Mato Grosso e Bahia como produtores
da fibra na década dos anos 2000. A cotonicultura paulista passou por diversos
ciclos críticos e, nos últimos dez anos, viu sua participação como ofertante de
algodão decrescer drasticamente frente a outros estados produtores7. A característica original da cultura do algodão em
São Paulo e nas regiões produtoras tradicionais é seu ponto fraco nas condições
atuais de produção. Inicialmente, pequenas e médias propriedades se dedicavam a
diversos produtos e a soma dos resultados econômicos das atividades compunha a
renda total da propriedade, com este arranjo viabilizando a propriedade8.
Um dos maiores demandantes de algodão no país,
responsável, porém, em 2014 por apenas 0,3% do total da área plantada9,
o Estado de São Paulo se viu na última década em trajetória decrescente em relação
a exploração dessa cultura. Com base nessa preocupante queda, o
objetivo deste artigo será determinar a taxa de crescimento das variáveis
envolvidas: área e produção10. O Estado de São Paulo, ao contrário dos
principais produtores, tem apresentado quedas constantes tanto em área quanto
em produção de algodão nos últimos dez anos, de acordo com os dados do Levantamento
Subjetivo do IEA11. Entre 2005 e 2014, houve perda em área plantada
de 98 mil hectares. A redução na área de algodão no Estado de São Paulo é
associada principalmente a mudanças nos padrões de produção, que se adaptaram
mais às exigências das questões econômicas, principalmente nas áreas do Centro-Oeste
e alguns estados do Nordeste (Figura 1). Pontua-se
que a demanda de terra para outras atividades de maior rendimento por hectare
no período analisado também foi responsável pela queda da participação da
cultura na produção do estado. São exemplos de culturas demandantes de área:
cana-de-açúcar, eucalipto e laranja. Elas absorveram maior espaço e
interferiram, direta ou indiretamente, na distribuição do espaço para o plantio
no estado12. Verifica-se, ao observar a área de
algodão no Estado de São Paulo (Figura 1), que houve queda acentuada entre 2005
e 2014, comprovada e dimensionada pelo cálculo da taxa de crescimento em -19,3%
ao ano. Nos dez anos analisados, pode-se dizer que as restrições ao plantio,
como produção em pequenas e médias propriedades, concorrência entre culturas
mais rentáveis, oscilações tanto no mercado interno quanto no internacional,
altos custos de produção e as pragas que ocorreram no estado foram obstáculos
com que a atividade se deparou e que inviabilizaram a atividade. A
produção paulista, que corresponde a aproximadamente 1,0% do total brasileiro segundo o IBGE13, foi de
2.576 mil arrobas em 2014, conforme dados IEA/CATI14, e também
apresentou no período
2005–2014 uma taxa de crescimento negativa de 14,8% ao ano. Os resultados obtidos para a área de
algodão e respectiva produção demonstram a vertiginosa queda da cultura que
marcou o comportamento da cotonicultura paulista no período (Figura 2). A tendência de redução da cultura no estado
é esperada, pois, de acordo com a estrutura de produção atual no país, São
Paulo não se enquadra quanto à necessidade de maiores áreas para viabilizar a
atividade, ou seja, a produção por pequenos e médios produtores de algodão
perde espaço frente à grande produção praticada em outros estados por grandes
propriedades e, além disso, outras explorações competem por área
para produzir15. O deslocamento da produção para o Centro-Oeste e o Nordeste
permitiu que estas regiões atingissem grandes produções após a implantação da
nova base econômica e tecnológica16. Na cotonicultura praticada hoje, a grande extensão da área
do produtor é considerada como insumo de grande importância, pois a viabilidade
econômica da cultura depende, dentre outras coisas, da escala de produção17.
No Brasil, a cultura é bastante desenvolvida nos Estados do Centro-Oeste (Mato
Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás e Tocantins) e em alguns Estados do Nordeste
(Bahia, Maranhão e Piauí). Essa mudança no eixo de produção devolveu o papel de
grande produtor e exportador de algodão ao Brasil e permitiu à indústria de
têxteis e confeccionados o suprimento do algodão necessário à sua produção. A
participação de São Paulo na produção de têxteis e confeccionados, fibras
sintéticas e naturais, e no total do faturamento do setor foi de 30% no ano de
2013. Conforme a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (ABIT), o Brasil
detém a quinta posição no mundo na produção de têxteis e a quarta posição
mundial na produção de vestuários. A produção de algodão paulista frente às atividades
econômicas do estado perdeu sua importância e está situada na 44ª posição no ranking do valor total da produção
paulista do agronegócio de 201418. Conforme a área de algodão divulgada na previsão de
safra de abril de 2015, que foi de 4,6 mil hectares, a tendência do fim do
plantio do algodão no Estado de São Paulo nos próximos anos19 parece
ser inevitável. No texto, foram abordados alguns aspectos tanto do setor
primário quanto do setor do beneficiamento do algodão, que possivelmente ajudam
a explicar o comportamento da cultura. Na produção, a
limitação pelos custos crescentes e o rendimento por área inferior, em relação
a outras atividades, parece estar influindo na decisão dos produtores em
abandonar a exploração por outras atividades, mais competitivas economicamente,
por exemplo, para cana-de-açúcar20. O destino da cotonicultura no Estado de São Paulo,
com origem na pequena e média produção, pode estar ligado a nichos de mercado
ou ao associativismo. O algodão colorido e orgânico pode constituir uma
alternativa de nicho de mercado, dado que a cultura comercial de larga escala
está sujeita a grande risco e exige elevado comprometimento de capital; o
associativismo pode ser outra alternativa dado que a somatória das pequenas
produções pode garantir escala que é restrita aos grandes produtores21. ____________________________________________________ 1BELTRÃO,
N. E.; ARAÚJO, A. E. de. Algodão: o
produtor pergunta, a Embrapa responde. Brasília: Embrapa, 2004. 265 p. 2ASSOCIAÇÃO
BRASILEIRA DA INDÚSTRIA TÊXTIL E DE CONFECÇÃO - ABIT. Agenda de prioridades têxtil e confecção 2015 a 2018. São Paulo:
ABIT. Disponível em:
<http://www.abit.org.br/conteudo/links/publicacoes/agenda_site.pdf>.
Acesso em: 8 jul. 2015. 3KOURI, J. A
recuperação da produção do algodão no Brasil. In: CONGRESSO BRASILEIRO DO
ALGODÃO, 6., 2007, Uberlândia. Anais
eletrônicos... Uberlândia: Embrapa, 2007. Disponível em:
<http://www.cnpa.embrapa.br/produtos/algodao/publicacoes/cba6/trabalhos/>. Acesso em: 25 jun.
2015. 4 Op. cit. nota 2. 5MIYAMOTO, B. C.
B. et al. A cotonicultura no Brasil e a inserção da pequena produção. In:
CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA, ADMINISTRAÇÃO E SOCIOLOGIA RURAL, 52., 2014,
Goiânia. Anais... Goiânia: SOBER,
2014. 6COMPANHIA
NACIONAL DE ABASTECIMENTO - CONAB. Banco
de dados. Brasília: CONAB. Disponível em: <http://www.conab.gov.br/>.
Acesso em: ago. 2015. 7Op. cit. nota 5. 8Op. cit. nota 5. 9INSTITUTO
BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA - IBGE. Banco de dados. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/indicadores/agropecuaria/lspa/lspa_201506_4.shtm>.
Acesso em: jul. 2015. 10RAMANATHAN, R. Introductory
econometrics: with applications. United States of America: The Dryden
Press, 1998. 664
p. A determinação da taxa de crescimento requer o
cálculo da regressão dos dados após aplicação da base logarítmica.
Utiliza-se como a variável independente (x) o tempo e como variáveis
dependentes (y) a área plantada e a produção. Finalmente, o cálculo exponencial
do resultado da regressão fornece a taxa de crescimento anual, que nada mais é
do que o logaritmo da variável dependente contra o tempo. 11O Levantamento Subjetivo é realizado em todos os municípios
paulistas nos meses de fevereiro, abril, junho, setembro e novembro, sendo que
para algodão os levantamentos de setembro a abril são previsões e o de junho é a
estimativa final de área plantada e produção obtida. Os resultados estão
disponibilizados no INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA - IEA. Banco de dados. São Paulo: IEA. Disponível em: <htpp://www.iea.sp.gov.br/out/bancodedados.html>. Acesso em: 15 maio 2015. 12OLIVETTE, M. P.
de A. et al. Evolução e prospecção da agricultura paulista: liberação da área
de pastagem para o cultivo da cana de açúcar, eucalipto, e reflexos na
pecuária, 1996-2030. Informações
Econômicas, São Paulo, v. 41, n. 3, mar. 2011. Disponível em:
<http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=12094>. Acesso em: 20
maio 2015. 13Op. cit. nota 9. 14Op.
cit. nota 11. 15Op.
cit. nota 12. 16Op.
cit. nota 5. 17Op. cit. nota 3. 18SILVA, J. R. da.
et al. Valor da produção agropecuária do Estado de São Paulo, resultado final
de 2014. Análises e Indicadores do
Agronegócio, São Paulo, v. 10, n. 6, jun. 2015. Disponível em:
<http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=13708>. Aceso em: 8
jul. 2015. 19ANGELO,
J. A. et al. Previsões e estimativas das safras agrícolas do Estado de São
Paulo, ano agrícola 2014/15, abril de 2015. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 10, n. 6, jun.
2015. Disponível em: <http://www.iea.sp.gov.br/out/LerTexto.php?codTexto=13707>.
Acesso em: 27 jul. 2015. 20Op. cit. nota 12. 21LIMA, D. A. L.
L.; FREITAS, I. S. de. A viabilidade da produção de algodão em propriedade
familiar: o caso do sudoeste de Goiás. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE ALGODÃO, 5.,
2005, Salvador. Anais eletrônicos...
Salvador: UFU/FESURV, 2005. Disponível em:
<http://www.cnpa.embrapa.br/produtos/algodão/publicações/trabalhos_cba5/001.pdf>.
Acesso em: ago. 2015. Palavras-chave:
taxa de crescimento, Levantamento Subjetivo IEA/CATI,
área e produção da cultura de algodão.
Data de Publicação: 11/09/2015
Autor(es):
Denise Viani Caser (dcaser@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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