Plano de Safra 2015/16: medidas para um ano difícil

         Após um período de expectativa, o Plano de Safra 2015/16 foi anunciado em 2 de junho no Palácio do Planalto – deverão ser disponibilizados para o setor R$187,7 bilhões para o financiamento da produção, 20,2% acima dos R$156,1 bilhões da safra atual, e as taxas de juros foram, em geral, aumentadas, passando a encargos que variam de 7,5% a 10,5% ao ano.

         Estes dois pontos, prioritários na lista de preocupações do setor produtivo, vieram com resultados já esperados. Apesar do aperto proveniente da contração dos depósitos à vista e da redução na poupança, lastro para boa parte do crédito rural, os volumes programados superam os da safra anterior, especialmente na finalidade custeio com taxas de juros controladas. E os juros, para a maior parte dos recursos de financiamento, ainda se mantêm subsidiados, quando comparados a taxa básica de juros da economia brasileira, SELIC, estipulada em 13,75% a.a.

 

1 - VOLUME, DISTRIBUIÇÃO DOS RECURSOS E TAXAS DE JUROS

         De acordo com o anunciado, o custeio e a comercialização deverão receber R$149,5 bilhões e o investimento R$38,2 bilhões. Do total, aproximadamente dois terços serão aplicados a taxas de juros controladas e um terço a taxas de juros livres. Aos médios produtores, deverão ser destinados R$18,9 bilhões.

         Para as modalidades custeio e comercialização, R$94,5 bilhões serão aplicados a taxas de juros controladas, sendo R$80,9 bilhões para o produtor comercial que pagará 8,75% a.a. e R$13,6 bilhões para o médio produtor, por meio do Programa de Apoio ao Médio Produtor (PRONAMP), com encargos de 7,75% a.a.2

         Em ambos os casos, houve a decisão de ampliar o volume para o custeio com taxas de juros controladas relativamente à safra passada, promovendo a correção dos recursos a taxas semelhantes ao do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), anualizado em maio. Foi priorizada a capacidade do produtor para as fases plantio e custeio da produção. Nessa linha, foram aumentados os limites de financiamento por tomador – de R$1.100,00 milhão para R$1.200,00 milhão para o produtor comercial, e de R$660,00 mil para R$710,00 mil para o produtor, acompanhando, em parte, a elevação dos custos.

         O volume proposto para a finalidade investimento é de R$38,2 bilhões, sendo R$33,3 bilhões aos juros controlados. Do total, R$5,3 bilhões destinam-se aos médios produtores. Para investimentos, o limite com recursos obrigatórios para o médio produtor foi mantido em R$385 mil e a taxa de juros passou de 6,5% a.a. para 7,5% a.a.

         Para o recurso global, está previsto que 63,2% do custeio e comercialização e 87,2% dos investimentos devem ser financiados às taxas de juros controladas.

         No entanto, a parcela de recursos controlados para a nova safra está prevista em R$129,8 bilhões, inferior ao volume da safra passada, que somou R$132,7 bilhões. Apesar da redução, o montante destinado às operações de custeio a essas taxas cresceu 7,5%, de R$87,9 bilhões para R$94,5 bilhões, acompanhando a inflação, o que se relaciona à parte da elevação dos custos a serem enfrentados pelos produtores.

         O volume de recursos programado para os investimentos foi reduzido - de R$44,0 bilhões programados para 2014/15 para R$38,2 bilhões, queda de 13,2%. Em um momento de crise, talvez seja mais importante para o produtor evitar a contração de dívidas, o que de certa forma se alinha às decisões do governo na escolha para a distribuição do volume total. Cabe salientar que houve redução na destinação de recursos para a grande maioria dos programas de investimento, à exceção do Moderfrota e PSI Rural, que receberam juntos R$10 bilhões, acima dos R$8,0 bilhões (R$3,5 bilhões + R$4,5 bilhões, respectivamente) da safra anterior. As taxas de juros foram definidas em 7,5% para produtores com renda bruta anual até 90 milhões e em 9,5% para produtores com renda superior a esse limite3.

         Para complementar a descrição dos recursos, está prevista a ampliação dos contratos financiados com recursos livres e provenientes das Letras de Crédito do Agronegócio (LCAs), uma novidade do atual plano. Dos R$24 bilhões previstos na safra anterior, os valores foram estimados em R$54 bilhões. Essa diferença deverá vir das LCAs. É uma aposta que está sendo feita em um instrumento que foi criado com a finalidade de dire­cionar e prover recursos ao setor. No entanto, as taxas devem girar em torno dos 15% a.a.

 

2 - CONTINUIDADE DE MEDIDAS DE INCENTIVOS

         A pecuária foi mantida como foco de apoio governamental. Permaneceram os limites adicionais de financiamento de custeio e de investimento em estímulo aos processos de: engorda em sistema de confinamento; aquisição de matrizes e reprodutores bovinos e bubalinos; e manutenção da linha de retenção de matrizes para evitar seu descarte precoce.

         Por meio do Programa Inovagro, medidas foram mantidas para incentivar a inovação tecnológica para a avicultura, suinocultura, os hortigranjeiros e a pecuária de leite.

         Entre as ações previstas para o setor de florestas plantadas, destacam-se o estímulo ao aumento da produtividade e da área plantada, a ampliação da participação de pequenos e médios empreendedores florestais e o aumento de limite de financiamento para florestas plantadas no Programa Agricultura de Baixa Emissão de Carbono (ABC). Para o grande produtor (que possui mais de 15 módulos fiscais) será de R$5 milhões, e para o médio (até 15 módulos fiscais) permanece o limite de R$3 milhões. Por meio do Programa ABC, o produtor poderá realizar financiamento de custeio para tratos culturais, desbastes e condução de florestas plantadas.

 

3 - DESTAQUES

3.1 - Positivos

· O aumento no total dos recursos disponibilizados somado ao aumento nos limites de financiamento – fundamentalmente, garante à grande parte dos produtores a possibilidade de dar continuidade à sua atividade;

· Manutenção do apoio aos médios produtores, com ampliação dos recursos e elevação do limite de financiamento para o custeio - promove a continuidade das medidas já anunciadas nos planos anteriores;

· Não alteração das linhas e programas de investimento - apesar da redução no volume de recursos e elevação das taxas de juros;

· Criação do grupo de Alto Nível da Lei Plurianual da Produção Agrícola Brasileira (LPAB)4 - primeiro passo efetivo para a concretização do necessário plano plurianual para o setor, que vem sendo colocado como prioridade há mais de cinco safras e que visa dar aos produtores maior previsibilidade e possibilidade de planejamento; e

· Manutenção dos subsídios às taxas de juros – comparados a SELIC definida em 13,5% a.a. no dia 3 de junho.

 

3.2 - Negativos

· Elevação das taxas de juros - um dos problemas do plano, pois as elevações que iniciaram na safra passada foram acentuadas na atual. Os aumentos, que em pontos percentuais foram de 2,25 para o custeio comercial (variou de 6,5% para 8,75%) e para o custeio PRONAMP (5,5% para 7,75%), representam um aumento nas taxas de juros de 35% e 41%, respectivamente, em relação ao ano passado. No caso das linhas de investimentos, as elevações atingiram 75%; e

· Redução no volume de recursos para o Programa de Subvenção ao Programa de Seguro Rural - do que foi possível apurar, o volume proposto é de R$638 milhões, sendo R$300 milhões para pagamentos de operações da safra anterior, deixando disponíveis para o ciclo 2015/16 apenas R$368 milhões, praticamente metade do proposto para a safra 2014/15, que foi de R$700 milhões. Essa situação é muito negativa, pois leva à fragilização da organização de um conjunto de atores além da perda de credibilidade de uma política pública ainda pouco robusta.

 

4 - CONSIDERAÇÕES

         O PAP 2015/16, anunciado com atraso ao previsto e motivo de grande expectativa, não decepcionou os produtores e o setor. Por outro lado, representa um desafio ao desenvolvimento do agronegócio brasileiro, principalmente por conta de uma maior disponibilidade de financiamentos com juros livres de mercado, apontando para um aumento de custos, apesar de ter sido planejado para um ponto de inflexão em que a economia busca recuperação.

         De certa forma, isso, por um lado, justificaria a decisão em manter recursos a taxas de juros controladas para a produção e reduzir os volumes de recursos para investimentos que, em geral, representam compromissos de longo prazo e que perpetuariam uma taxa de juros hoje elevada, o que explicaria um comportamento cauteloso do produtor.

         Por outro, a redução dos depósitos à vista encareceu o crédito em um momento em que os preços das commodities caíram e que os insumos se tornaram mais caros devido à desvalorização do real. Esse é um desafio que o governo espera vencer com recursos livres, especialmente provenientes das LCAs. Esse título, por ser isento de Imposto de Renda e de Imposto sobre Operações Financeiras (IOF), constitui-se em uma das melhores alternativas de investimento no mercado financeiro e pode atender ao setor rural.

         Pela Resolução do Banco Central n. 4.415, de 02/06/20155, que torna as LCAs uma das fontes de recursos do Sistema Nacional de Crédito Rural, passou a haver direcionamento de inicialmente 50% e, a partir de junho de 2016, de 100% dos recursos captados por meio da emissão de LCAs, quando estas forem lastreadas em operações com recursos obrigatórios, recursos da poupança rural ou com recursos controlados. Para que se concretize, é necessário que existam tomadores (produtores) dos recursos à taxa remuneradora para os investidores.

         O governo continua caminhando no sentido de apoiar soluções de financiamento ao mercado para os produtores de maior porte e bem estruturados, ao passo que mantém políticas de maior apoio aos produtores familiares e médios. Na comercialização tem buscado atuar por meio de mecanismos nos quais garante o preço mínimo com as subvenções. Trata-se de forma de seguro de preço e, portanto, de renda ao produtor, que necessita ser ampliado e fortalecido.

         Da mesma forma, o Programa de Subvenção ao Programa de Seguro Rural é um excelente instrumento para redução do risco de produção e que tem sofrido retrocesso. Do anunciado - criação do sistema integrado de informações do seguro rural (SIS-Rural) e a formação de grupos de produtores para negociação com as seguradoras - pouco ficou esclarecido. Por outro lado, é um ponto positivo a determinação governamental de que só terá acesso à subvenção o produtor que contratar um seguro com no mínimo 60% de cobertura.

 

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1As autoras agradecem à pesquisadora do IEA Samira Aoun pela colaboração.

2BANCO CENTRAL DO BRASIL - BACEN. Resolução n. 4.412, de 2 de junho de 2015. Altera normas para contratação de operações de crédito rural a partir de 1. de julho de 2015. Diário Oficial da União, 3 jun. 2015. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/res/2015/pdf/res_4412_v1_O.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.

3______. Resolução n. 4.413, de 2 de junho de 2015. Define os encargos financeiros dos programas de investimento agropecuários amparados por recursos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a partir de 1 de julho de 2015. Diário Oficial da União, 3 jun. 2016. Disponível em: <http://www.bcb. gov.br/pre/normativos/res/2015/pdf/res_4413_v1_O.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.

4O GT foi instituído por meio da FRENTE PARLAMENTAR DA AGROPECUÁRIA - FPA. Portaria n. 115, de 2 junho de 2015. Diário Oficial da União, 3 jun. 2015. Disponível em: <http://fpagropecuaria.org.br/diario-oficial-da-uniao/dou-03-de-junho-de-2015#.VYArdvlVhBc>. Acesso em: 10 jun. 2015. O GT, além de avaliar os instrumentos de política agrícola existentes e propor seu aprimoramento também irá identificar os instrumentos e mecanismos de política agrícola que constituirão a lei plurianual e proporá estudos de suporte para a elaboração da Lei Plurianual da Produção Agrícola Brasileira (LPAB). Esses estudos deverão ser realizados pela Secretaria de Política Agrícola. O GT terá um prazo de 180 dias, contados a partir da publicação da portaria no DOU, para a conclusão dos trabalhos. Além da ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Kátia Abreu, vão compor o GT o secretário de Política Agrícola, André Nassar, o ex-ministro e economista Antonio Delfim Neto, os economistas e doutores Antônio Salazar Brandão, Cláudio Adilson Gonzales e Juliano Assunção, o engenheiro agrônomo e doutor Eliseu Alves, e o doutor Elísio Contini, podendo contar também com convidados e colaboradores eventuais.

5BANCO CENTRAL DO BRASIL - BACEN. Resolução n. 4.415, de 02 de junho de 2015. Dispõe sobre o direcionamento dos recursos captados por meio da emissão de Letra de Crédito do Agronegócio (LCA) lastreada em direitos creditórios originados de operações sujeitas aos direcionamentos de que tratam o MCR 6-2 e 6-4 ou contratadas com recursos de que trata o MCR 6-1-2 e veda gravame em duplicidade na emissão desse título. Diário Oficial da União, 3 de junho 2015. Disponível em: <http://www.bcb.gov.br/pre/normativos/res/2015/ pdf/res_4415_v1_O.pdf>. Acesso em: 10 jun. 2015.

 

Palavras-chave: plano agrícola e pecuário 2015/16, política agrícola, crédito rural, seguro rural.

 

 

 

Data de Publicação: 22/06/2015

Autor(es): Terezinha Joyce Fernandes Franca (terezinha.franca@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
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