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Desempenho do Emprego Formal¹ na Agropecuária Paulista, 2013
Segundo informações do Cadastro
Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), do Ministério do Trabalho e
Emprego (MTE), em janeiro de 2014, o Estado de São Paulo expandiu 7.949 postos
de trabalho formal. Isso representa um crescimento de 0,06% em relação ao estoque
de assalariados com carteira assinada de dezembro de 2013,
devido à geração de empregos nos setores da indústria de transformação e da construção
civil, cujos saldos superaram a perda de
emprego registrada no comércio e na agropecuária2. Uma avaliação mais detalhada do declínio do
emprego formal na agropecuária deve considerar a existência de dois tipos de
desemprego: o conjuntural e o estrutural. O primeiro considera as oscilações do
ciclo das culturas e suas especificidades sazonais, enquanto o segundo relaciona-se
ao uso de novas tecnologias em substituição à mão de obra braçal. Uma relação formal de
trabalho consiste basicamente em um contrato trabalhista, no qual um indivíduo
cede seu trabalho em troca de alguns direitos (amparados pela legislação) e de
uma remuneração pré-determinada (salário), a qual lhe possibilita acessar os
bens e serviços de que necessita, seja para a melhoria de sua qualidade de vida,
seja para garantia de sua sobrevivência. É nesse sentido que se pode compreender
a definição de Woleck3, segundo a qual o emprego formal é “a pedra
angular para o funcionamento da economia”, já que a renda (ou remuneração) do
indivíduo vincula-se diretamente ao seu poder de compra. Embora a remuneração
esteja presente em ambas as tipologias de emprego, formal ou informal, somente
a primeira embute a ideia de “segurança”, pois, com o prévio conhecimento de
sua renda, o indivíduo pode planejar melhor como alocar seus recursos. Este trabalho analisa
o desempenho do emprego formal no setor agropecuário paulista, em 2013, tendo
por base o CAGED4 do MTE. Por tratar, periodicamente, das admissões
e desligamento de trabalhadores com carteira assinada, o CAGED possibilita uma
melhor distinção do tipo de desemprego que vem ocorrendo no setor agropecuário
paulista. Em 2013, o setor agropecuário paulista admitiu
253.494 trabalhadores com carteira assinada, sendo que o cultivo de lavouras
(temporárias e permanentes) respondeu por 57,4% deste total (Tabela 1). Tabela 1 – Admissões,
Desligamentos e Saldo do Emprego Formal no Setor Agropecuário, Estado de São
Paulo, 2012 e 2013 (em número) Grupo do setor agropecuário 2012 2013 A1 D2 Saldo3 A D Saldo Cultivo de lavouras temporárias 86.253 80.873 5.380 76.218 76.068 150 Cultivo de lavouras permanentes 81.359 93.603 -12.244 69.337 80.152 -10.815 Apoio à agricultura e pecuária 52.137 48.774 3.363 49.895 55.288 -5.393 Pecuária 33.290 35.537 -2.247 35.700 34.781 919 Horticultura e flores 10.449 10.860 -411 10.142 10.343 -201 Outras atividades 9.335 9.846 -511 9.368 9.054 314 Produção de mudas e sementes 3.364 3.423 -59 2.834 3.008 -174 Total 276.187 282.916 -6.729 253.494 268.694 -15.200 1Admissões. 3Demissões. 3Saldo é a
diferença entre os números de empregados admitidos e demitidos (ou desligados).
Se A for maior que D, tem-se geração de emprego. Fonte:
Elaborada pelos autores a partir de dados do MINISTÉRIO DO TRABALHO E EMPREGO -
MTE. Cadastro geral de empregados e
desempregados (CAGED). Brasília: MTE. Disponível em:
<http://www.mte.gov.br>. Acessado em: fev. 2014. Em 2013, a cana-de-açúcar, classificada pelo CAGED
como lavoura temporária, concentrou 22,6% dos empregos formais da agropecuária
estadual, seguida das lavouras permanentes, nas quais se enquadram laranja e
café. Estas absorveram, respectivamente, 18,4% e 6,5% dos empregos celetistas
do setor. A cana-de-açúcar é uma atividade em pleno processo
de adoção tecnológica, com uso intensivo de colhedoras em substituição ao
trabalho manual de corte, etapa que mais demanda mão de obra. Esse processo é
impulsionado por marcos regulatórios implementados para o setor sucroalcooleiro
no Estado de São Paulo: a Lei 11.241/20025 e o Protocolo
Agroambiental6, acordado em 2007. Ambos preocupam-se com as emissões
de gases poluentes oriundos da queima da cana-de-açúcar, etapa que precede à
colheita, com o objetivo de facilitar o seu corte manual. Os marcos diferem
entre si, porque o primeiro é uma imposição e o segundo é um acordo de
intenções, ou seja, os que aderirem ao último e cumprirem suas exigências
recebem a certificação do Selo Verde. Outra diferença refere-se aos prazos dos
cronogramas de erradicação da queima: a Lei 11.241/2002 estabelece o ano de 2021
para áreas mecanizáveis (declividade baixa dos terrenos), e 2031 para áreas não
mecanizáveis (terrenos mais íngremes e/ou com alto declive). Já o Protocolo
antecipa os prazos: para áreas mecanizáveis, o limite é 2014 e, para as não
mecanizáveis, 2017. A diversidade de prazos, por conta da declividade
dos solos, bem como o alto custo para aquisição de máquinas fazem com que a
demanda por mão de obra braçal na colheita de cana ainda seja necessária, o que
justifica o alto número de admissões formais no segmento, quando comparado ao
total da agropecuária paulista. No entanto, cabe mencionar que o número de
admissões com carteira assinada, em 2013, foi 11,6% menor que o verificado para
2012 (Tabela 1). Segundo Fredo et al.7, os marcos
regulatórios têm resultado na eliminação/expulsão da categoria “cortador de
cana-de-açúcar”. Os autores ressaltam que a área de cana-de-açúcar colhida
mecanicamente no Estado de São Paulo avançou de 41,7% para 69,8%, no período
2007-2011, e cerca de 100 mil cortadores de cana deixaram de ser absorvidos no
setor sucroalcooleiro. No grupo de lavouras permanentes, identificou-se
uma redução de 10.815 postos de trabalho celetistas (Tabela 1). Considerando-se
que o cultivo de laranjas é uma importante atividade do estado, o qual responde
por cerca de 74,0% da produção brasileira, este desempenho decorre em parte da
crise do setor citrícola. Historicamente, a citricultura brasileira passou
por diversas adaptações devido a problemas com pragas e doenças, retenção dos
preços e problemas com a indústria de suco, resultando muitas vezes em aumento
de custos da cultura8. Segundo Gomes et al.9, desde 2011, a
crise da citricultura paulista tem reduzido os pomares e levado muitos
produtores a saírem da atividade. Os autores citam informações da Coordenadoria de Defesa Agropecuária do Estado de São
Paulo (CDA), para a qual, de 2011 até 2013, foram erradicados cerca de 62,7
milhões de árvores – o equivalente a 150 mil hectares. Além disso, dados
do Instituto de Economia Agrícola (IEA) registram que a produção estadual de
laranjas caiu 19,4%10 no período 2012-2013. Assim, a redução no número de trabalhadores com
carteira assinada na citricultura paulista encontra respaldo na queda da
produção de laranjas. No entanto, as alterações no perfil do citricultor também
podem ter contribuído para a evasão de empregos celetistas no setor. Segundo a Companhia Nacional de Abastecimento
(CONAB), citada por Azevedo et al.11, a queda da produtividade e a
falta de condições dos produtores em adotar inovações tecnológicas para a
cultura os tornaram pouco competitivos, promovendo uma mudança no perfil que
tradicionalmente era composto por pequenos produtores. Mais de 60% da produção
de laranja em São Paulo ficou concentrada com apenas 1% dos citricultores.
Observação similar foi feita por Gomes et al.12, para os quais a
combinação de preços em queda, aumento dos custos e maior incidência de greening
diminuíram a rentabilidade
da cultura, levando à redução drástica do número de citricultores. Nota-se que, além da produção concentrada em
poucos produtores, a redução no número de citricultores leva a um menor número
de declarantes no CAGED, o que também pode ter contribuído para acentuar o
declínio no montante de empregados celetistas na citricultura paulista. O desempenho do emprego formal citrícola se
contrapõe às expectativas previstas pelo setor, com a inclusão da técnica de
adensamento que vem ocorrendo nos laranjais paulistas. Segundo Piteli13,
com o adensamento, a expectativa era de que a demanda de trabalho por hectare
de laranja aumentasse 15%, em média, para uma produção 30% superior, uma vez
que a técnica propicia mais plantas por hectare. Entretanto, quando analisada a
evolução do uso de mão de obra e de máquinas por hectare nos últimos três anos safras,
este autor observou que a demanda por mão de obra e máquinas não evoluiu como
esperado; pelo contrário, houve pequenas retrações registradas14. O
autor acredita que a crise do setor possa ter imposto uma redução das
atividades realizadas nos pomares. Enquanto inovação no
processo produtivo, o adensamento de plantio exige o aprimoramento nos tratos
culturais, principalmente no tocante à poda das árvores.
Azevedo et al.15 atentam que essa técnica promove melhoria na
qualidade dos frutos, facilita a colheita e melhora a relação entre a raiz e a
parte aérea. Mas alerta que uma poda inadequada pode levar a atrasos na
produção, prejuízos na qualidade dos frutos e até mesmo a propagação de
diversas doenças. Nesse sentido, a consolidação da nova técnica exige mão de
obra mais preparada para a execução das podas, o que pode trazer alterações no
perfil dos trabalhadores envolvidos nos tratos culturais da laranja. No grupo de pecuária, a criação de bovinos
(6,81%), tanto para corte quanto para leite, e a criação de aves (5,83%) são as
atividades que mais admitem trabalhadores com registro em carteira. Neste grupo,
o número de admissões em 2013 superou o registrado no ano anterior, bem como o
número de desligamentos foi inferior ao de 2012, acarretando na geração de 919
postos de trabalho formal (Tabela 1). As “atividades de apoio à agricultura e pecuária”
correspondem às empresas que oferecem mão de obra para atender os
estabelecimentos rurais em diversas tarefas (tratos culturais, colheita,
pós-colheita, criação e manejo de rebanhos, etc.), pois muitos empreendimentos agropecuários
optam por terceirizar seus serviços a fim de reduzir os custos com
contratações. Em 2013, cerca de 19,5% do total
de admissões formais no setor agropecuário paulista foram realizadas pelas “atividades
de apoio à agricultura e pecuária”. Porém, este grupo não teve um bom
desempenho em 2013 quando comparado ao ano anterior. Tanto houve queda no
número de admissões, como um aumento no número de demissões, ocasionando uma
retração no nível de emprego formal equivalente à perda de 5.393 postos de
trabalho (Tabela 1). Por fim, os
dados de 2012 e 2013 mostram que, enquanto o volume de contratações no setor
reduziu em 9,5%, o de desligamentos registrou uma retração menor (5,3%). No
entanto, o saldo empregatício foi negativo em ambos os anos e, em 2012-2013, o
emprego formal na agropecuária paulista decaiu 125% (Tabela 1). Woleck16
cita um estudo do próprio MTE, realizado em 2000, no qual demonstrou que, ao
mesmo tempo em que o índice de trabalhadores com carteira assinada estava em
declínio, um segmento de trabalhadores por conta própria e sem carteira assinada
crescia de forma exponencial. Portanto, a continuidade do
processo de mudanças no mercado de trabalho rural tem seguido a mesma
trajetória dos demais setores econômicos. __________________________________________________________ 1Forma de
emprego no qual, ao contrário de emprego informal, os trabalhadores estão
protegidos por contratos de trabalho e por legislação, que lhes garantem alguns
direitos, tais como: 13º salário, abono de férias, Fundo de Garantia pelo Tempo
de Serviço (FGTS), etc. 2MINISTÉRIO
DO TRABALHO E EMPREGO - MTE. Banco de
dados. Brasília: MTE. Disponível em: <http://portal.mte.gov.br/data/files/8A7C816A43DF98FC01444BA7FB2B625E/SP%20janeiro%2014.pdf>.
Acesso em: fev. 2014. 3WOLECK, A. O trabalho, a ocupação e
o emprego: uma perspectiva histórica. Instituto Catarinense de Pós--Graduação,
Santa Catarina, 15 p. Disponível em: <http://www.iesc.ufrj.br/cursos/saudetrab/ 4MINISTÉRIO DO
TRABALHO E EMPREGO - MTE. Cadastro geral
de empregados e desempregados (CAGED). Brasília: MTE. Disponível em:
<http://www.mte.gov.br>. Acesso em: fev. 2014. 5SÃO PAULO (Estado). Lei n.
11.241, de 19 de setembro de 2002. Dispõe sobre a eliminação gradativa da
queima da palha da cana-de-açúcar e dá providências correlatas. Diário Oficial do Estado de São Paulo. 20
set. 2002. Disponível em:
<http://governo-sp.jusbrasil.com.br/legislacao/94008/lei-11241-02>.
Acesso em: fev. 2014. 6______.
Protocolo agroambiental: protocolo
de cooperação que celebram entre si, o Governo do Estado de São Paulo, a
Secretaria de Estado do Meio Ambiento, a Secretaria de Estado da Agricultura e
Abastecimento e a União da Agroindústria Canavieira de São Paulo para a adoção
de ações destinadas a consolidar o desenvolvimento sustentável da indústria da
cana-de-açúcar no Estado de São Paulo. São Paulo: GESP/SMA/SAA/UNICA, 04 jun.
2007. 3 p. Disponível em: <http://homologa.ambiente.sp.gov.br/etanolverde
/oquee/protocolo.pdf>. Acesso em: 22 mar. 2014. 7FREDO, C. E. et al. Efeito
da mecanização nos empregos. Revista
Agroanalysis, São Paulo, v. 32, n. 4, p. 24-25, abr. 2012. 8COOPERATIVA DE PRODUTORES
RURAIS - COOPERCITRUS. Adensamento de
plantio é estratégia para melhorar produtividade e lucratividade da laranja. São
Paulo: COOPERCITRUS, 2010. Disponível em: <http://www.revista coopercitrus.com.br/?pag=materia&codigo=5921>.
Acesso em: fev. 2013. 9GOMES, F. G. et al. Citrus. Revista Hortifruti Brasil, São Paulo,
fev. 2014. 34 p. 10INSTITUTO DE ECONOMIA
AGRÍCOLA - IEA. Banco de dados. São
Paulo: IEA. Disponível em: <http://ciagri.iea.sp.gov.br/nia1/subjetiva.aspx?cod_sis=1&idioma=1>.
Acesso em: fev. 2014. 11AZEVEDO, F. A. de. et al. Poda na citricultura. Citrus Research &
Technology, Cordeirópolis, v. 34, n. 1, p. 17-30, 2013. 12Op. cit. nota 9. 13PITELI,
L. Uso de mão de obra e de máquinas no cultivo da laranja. Revista Citricultura Atual, São Paulo, ano 17, n. 98, fev. 2014. 30
p. 14Op.
cit. nota 13. 15Op.
cit. nota 11. 16Op.
cit. nota 3. Palavras-chave: CAGED, emprego formal, mercado
de trabalho rural.
trabalho%20ocupa%E7%E3o.pdf>. Acesso em: fev. 2014.
Data de Publicação: 11/04/2014
Autor(es):
Silene Maria de Freitas (silene.freitas@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Malimiria Norico Otani (maliotani@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Carlos Eduardo Fredo (cfredo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor