Artigos
2012: Difícil Ano Para a Laranja
Indubitavelmente, 2012 pode
ser considerado como um ano 'azedo' para a citricultura brasileira, setor com
grande importância na balança comercial brasileira e no qual uma grande crise
vem afetando vários segmentos da economia.
Contudo, há tempo a citricultura paulista vem enfrentando grandes desafios
quanto a problemas fitossanitários, à diminuição da demanda internacional por
suco de laranja, em decorrência da crise econômica financeira, e, em parte, pela
presença de produtos concorrentes mais baratos nas gôndolas de supermercados,
tais como néctares, refrescos e bebidas aromatizadas. A
variedade de sabores se multiplicou e os teores de suco de frutas nessas bebidas
são menores, o que torna o produto final mais barato do que FCOJ (Frozen
Concentrate Orange Juice)1 ou que o suco de laranja não
concentrado, NFC (Not From Concentrate)2. Uma
crise (de preços) poderia já ter ocorrido a partir de 2004, a qual acabou sendo
adiada por causa dos furacões que em 2004 e 2005 atingiram as áreas de pomares
da Flórida (USA), provocando enorme queda de produção e substancial aumento das
cotações recordes do suco concentrado de laranja no mercado
internacional. No
entanto, com a crise na economia mundial a partir de meados de 2008, diante da
grande colheita de laranja em São Paulo e parcial recuperação na Flórida, os
preços recebidos pelos citricultores paulistas caíram abruptamente por causa da
redução na demanda por suco e agravados pela taxa de câmbio (valorização do
real), prejudicando todos os setores exportadores brasileiros.
Outro
fato relevante que afetou o setor ao final de janeiro de 2012 foi a descoberta
de vestígios do fungicida carbendazim pelo FDA/EUA, órgão regulador para
alimentos e saúde dos EUA, onde esse produto é proibido no mercado e os
carregamentos de suco concentrado congelado (FCOJ) provenientes do Brasil foram
barrados.
Todavia, existem riscos crescentes de novos desequilíbrios por conta de outras
pragas e doenças (greening) que oneram os custos de produção e reduzem as
vantagens comparativas da citricultura brasileira, que estaria perdendo
competitividade no cenário internacional. Não
obstante, é na safra industrial 2012/13 que o citricultor paulista esta vivendo
sua pior crise. Com elevados estoques de suco e demanda no mercado externo em
baixa, a indústria não processou a quantidade de laranja esperada. Muitos
produtores que já vinham se descapitalizando ao longo dos anos, não só pelos
baixos preços recebidos pela caixa da fruta, mas também pelo aumento de custo de
produção devido ao aumento de problemas fitopatológicos, sofreram forte golpe:
endividados, sem mercado para escoar sua produção, deixaram a fruta no pomar, o
que pode causar problemas fitossanitários gravíssimos, com danos irreversíveis
nas plantas e até erradicação completa de pomares, com comprometimento da
citricultura paulista.
Dentre as diversas pragas e doenças que incidem na citricultura mundial, devem
ser citadas no caso do Brasil e, em particular no Estado de São Paulo, o cancro
cítrico, clorose variegada dos citros (CVC), morte súbita, podridão floral dos
citros (PFC, também conhecido como estrelinha), bicho furão, leprose, pinta
preta3 e mais recentemente o huanglongbing
(HLB-greening). O HLB
(greening), da mesma forma que o cancro cítrico, tem como único e efetivo
controle o arranquio das plantas infectadas e o controle químico dos insetos
transmissores da doença, ocasionando aumento de custo de produção e,
consequentemente, a descapitalização do citricultor, sendo responsável pelo
êxodo das culturas. A Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA) da Secretaria
de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo informou que os
citricultores paulistas erradicaram, em 2011, por causa do greening,
cerca de 5,2 milhões de pés de laranja. As Regiões Administrativas (RA) com
maior participação de plantas eliminadas devido a essa doença foram: Ribeirão
Preto, Araraquara e Limeira4.
Diante do volume de negócios gerados, a citricultura é uma atividade de grande
importância social. Por isso todos os esforços são voltados para garantir a
fitossanidade dos pomares, a modernização do setor e as condições para
comercialização da produção. Em época de crise é quando se devem procurar
alternativas, muitas vezes criativas, para solucionar problemas que há muito têm
sido sinalizados pelo setor, destacando-se a necessidade de desenvolver o
mercado doméstico do suco de laranja já pronto para beber e que continua
incipiente no Brasil.
Apesar de não ser o principal setor empregatício do agronegócio em São Paulo, a
citricultura é uma das maiores na ocupação de mão de obra, principalmente na
etapa de colheita da laranja que é realizada quase exclusivamente por braços
humanos. Ao se considerar a produção estimada de 585,4 milhões de caixas (25 a
27kg), com média de 64,5 caixas de 25/27kg/dia de laranja colhidas por um homem
e 235 dias trabalhados na safra, pode-se estimar em torno de 38,9 mil pessoas
envolvidas nessa atividade no Estado de São Paulo (Tabela 1).
Tabela 1 – Estimativa da Produção de Laranja, Quantidade e Preço Colhido por Homem/Dia, Total de Colhedores e Renda, por Escritório de Desenvolvimento Rural, Estado de São Paulo, 2012
EDR |
Produção1 |
Quantidade colhida2 |
Estimativa de colhedores na safra3 |
Preço da caixa colhida2 |
Renda colhedor (R$1.OOO) |
(1.000 cx. 25-7kg) |
(cx. 25-27kg/homem/dia) |
(R$/cx. 25-27kg) | |||
Barretos |
62.565,8 |
68,4 |
3.890 |
0,76 |
47.550,04 |
S. J. da Boa Vista |
48.301,2 |
67,8 |
3.032 |
0,74 |
35.742,87 |
Araraquara |
42.280,7 |
58,0 |
3.102 |
1,08 |
45.663,18 |
Avaré |
39.749,5 |
62,2 |
2.719 |
0,66 |
26.234,67 |
Mogi-Mirim |
39.339,0 |
80,0 |
2.093 |
1,04 |
40.912,61 |
Jaboticabal |
37.144,9 |
61,8 |
2.557 |
0,92 |
34.173,30 |
Bauru |
34.391,3 |
71,7 |
2.042 |
0,69 |
23.730,00 |
Limeira |
32.049,3 |
58,7 |
2.322 |
0,65 |
20.832,07 |
Itapetininga |
30.485,0 |
52,5 |
2.471 |
0,54 |
16.461,92 |
Jaú |
26.274,8 |
67,5 |
1.656 |
0,51 |
13.400,15 |
Botucatu |
25.944,9 |
64,3 |
1.717 |
0,41 |
10.637,40 |
Lins |
23.993,0 |
72,7 |
1.404 |
0,75 |
17.994,73 |
S. J. do Rio Preto |
23.659,4 |
68,8 |
1.464 |
0,87 |
20.583,71 |
Itapeva |
18.916,8 |
71,7 |
1.123 |
1,00 |
18.916,77 |
Catanduva |
16.826,9 |
56,3 |
1.273 |
0,74 |
12.451,88 |
Jales |
15.723,0 |
72,9 |
918 |
1,03 |
16.194,74 |
Demais EDRs |
67.787,5 |
56,0 |
5.151 |
1,07 |
72.532,64 |
Estado |
585.433,1 |
64,5 |
38.935 |
0,86 |
474.012,67 |
1Informação originalmente obtida em caixa de 40,8kg da Previsão de Safras de setembro de 2012 do IEA/SAA.
2Levantamento de Preços Correntes de junho de 2012 do IEA/SAA.
3Tempo de colheita estimado no ano – 235 dias.
Fonte: Dados básicos do Instituto de Economia Agrícola e Coordenadoria de Assistência Técnica Integral.
Assim, a renda potencialmente aferida pelos colhedores seria de R$474 milhões,
cabendo observar que acima de R$20 milhões teriam ocorrido nos EDRs de
Araraquara, Avaré, Barretos, Bauru, Jaboticabal, Limeira, Mogi-Mirim, São João
da Boa Vista e São José do Rio Preto (Tabela 1).
Evidencia-se, portanto, que esse setor tem injetado nas regiões onde está
instalado efetivo dinamismo, tanto na renda dos colhedores, quanto em recursos
humanos nos demais elos da cadeia produtiva. A importância da atividade
laranjeira para a economia regional e, principalmente, nos EDRs onde preponderam
cidades de menor porte é ainda mais relevante. Além disso, há de se considerar
que a exploração da laranja no âmbito dos municípios não ocorre de forma
isolada, ou seja, está inserida no contexto da economia regional e, portanto,
alterações em seu padrão de produção têm amplitude ainda maior. Isso significa
que erradicação de pomar e/ou a não colheita por diferentes motivos pode
acarretar num impacto social muito grande em termos de ocupação e renda para o
trabalhador agrícola, com reflexos diretos e indiretos sobre os setores de
comércio e serviços.
Prefeitos e associações de municípios paulistas vêm alertando sobre situação
crítica da safra de laranja em 2012. Para estes municípios, a substituição da
laranja por outras culturas, como por exemplo a cana-de-açúcar, também tem
impactos significativos na arrecadação. Como muitas cidades não têm usinas de
açúcar e álcool, elas deixam de receber os impostos e ficam apenas com o ônus de
abrigar trabalhadores que vêm de outros estados brasileiros onerando, ainda
mais, as prefeituras no âmbito da saúde, da assistência social, da segurança
pública, dentre outros setores5.
Diante desse cenário, é lícito estimar de quanto pode ter sido a redução do
montante de salários que teriam sido pagos apenas aos colhedores (menor receita)
ao admitir-se que deixaram de ser colhidas de 10% a 15% da produção estimada
para a safra 2012/13, ou seja, da ordem de 58,5 milhões a 87,8 milhões de caixas
de 25 a 27 kg, o que resultaria ao redor de R$ 60 milhões a menos em termos de
renda para os colhedores.
A tais aspectos se poderia também aduzir a redução do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e outras receitas tributárias que teriam gerado renda às prefeituras e ao Estado e que seriam ainda maiores ao somar custos de transporte desse volume de frutas, bem com na arrecadação de pedágios e outros tributos.
_____________________________________________________________
1Existem dois produtos
fabricados e exportados: o suco de laranja concentrado chamado de FCOJ (Frozen
Concentrate Orange Juice) e o suco de laranja não-concentrado, NFC (Not From
Concentrate). O concentrado é resfriado à temperatura de 10º negativos, tornando
o produto viscoso, porém não congelado. No NFC o produto não é congelado e não
possui conservante. DOMINGUEZ, C. O suco de maior consumo também é o mais
exportado. Santos, 2005. Disponível em:
<http://www.portogente.com.br/texto.php?cod=3027>. Acesso em: 04 dez.
2012.
2LOPES, F. Consumo de suco de laranja cai mais em 2011. Valor Econômico, São Paulo, 30 jul. 2012. Agronegócios, p. B11.
3Na safra 2012/13 o controle da doença pinta-preta deve ter seu custo elevado. Com a restrição do uso do fungicida carbendazim nos laranjais, as opções são de ingredientes ativos mais caros, bem como, há menos opções para a rotação de defensivos. O custo de controle desta doença pode impactar em 30%, pois os fungicidas do grupo das estrobilurinas quanto ao uso do cobre apresentam custos superiores aos do carbendazim. ESCOLA SUPERIOR DE AGRICULTURA 'LUIZ DE QUEIROZ'. Centro de Estudos Avançados de Economia Aplicada – ESALQ/ CEPEA. Citros: inseticida já é o maior gasto com defensivos. Porto Alegre: AGROLINK, 2012. Disponível em: <http://www.agrolink.com.br/noticias/ClippingDetalhe.aspx?CodNoticia=169050>. Acesso em: 04 jun. 2012.
4DIÁRIO DO COMÉRCIO & INDÚSTRIA - DCI. Citricultores eliminam 5,2 mil pés de laranja. Porto Alegre: AGROLINK, 2012. Disponível em: <http://www.agrolink.com.br/noticias/ClippingDetalhe.aspx?CodNoticia= 165251>. Acesso em: 31 jan. 2012.
5INFORMATIVO ASSOCITRUS.
Crise no campo: municípios citrícolas sofrem com desemprego. Bebedouro;
ano 8, n. 43, out./nov. 2012.
Palavras-chave: produção de laranja, trabalho rural, renda do colhedor.
Data de Publicação: 17/12/2012
Autor(es):
Celma Da Silva Lago Baptistella (csbaptistella@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Maria Carlota Meloni Vicente (carlota@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Priscilla Rocha Silva Fagundes (prsfagundes@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Antonio Ambrósio Amaro (amaro.pingo@gmail.com) Consulte outros textos deste autor