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As Tecnologias da Informação na Atividade Canavieira
Implementada nos países mais desenvolvidos depois da Segunda Guerra Mundial e no
Brasil nos anos 1970, a união entre a ciência, a técnica e a informação como
eixo normatizador das relações hegemônicas universais atinge sua fase madura com
a globalização iniciada nos anos 19901. Assim, com a abertura
comercial projetada pelas reformas neoliberais, os atores econômicos que
desenvolvem inovações possibilitadoras de menores custos de produção passam a
resistir à competitividade globalizada e a se assegurar no mercado via maiores
margens de lucro obtidas por meio de monopólios temporários2. Sendo a
técnica da informação – através da precisão e controle que ela estabelece – o
principal elemento inovador que capacita a diminuição dos gastos no processo de
produção, sua instalação, acoplada aos objetos e ações desse novo momento
histórico, é norma para a subsistência no mercado
global3.
No
atual período, a informação tem sido usada como instrumento primordial na
padronização das cadeias de produção dos diversos setores da economia
capitalista. As mais recentes técnicas surgidas com a necessidade de
competitividade atingem escalas além dos territórios nacionais e vêm anexadas a
programas computadorizados que disponibilizam controles mais precisos das
informações de todo o processo de produção. Essa precisão minuciosa,
possibilitada pela informatização das cadeias de produção, iniciou sua
disseminação em todos os circuitos da produção hegemônica do sistema
capitalista, diminuindo os custos, aumentando a produtividade e levando o
território a constituir-se no que se denominou de meio
técnico-científico-informacional4.
Na
agricultura, com o aparecimento de tecnologias da informação, como os Sistemas
de Informações Geográficas (SIGs) e de rastreamento via satélite, iniciou-se uma
revolução no gerenciamento e no monitoramento das operações nas lavouras e nas
fábricas agropecuárias mais modernas. Apresentando no início maiores
incompatibilidades na fluidez das informações entre os softwares constituídos
separadamente para as diferentes etapas (elos) das atividades de produção, cada
vez mais surgem programas integrados que, tendo elevados custos de aquisição e
manutenção com a capacitação de mão-de-obra treinada para o seu manuseio, abrem
as possibilidades de uma ascendente lucratividade daqueles que as
adquirem5.
Com o
advento do Sistema de Posicionamento Global (GPS), acoplado às maquinas do campo
– tratores, plantadeiras, colheitadeiras, aviões e outras máquinas –, os
agricultores recebem informações por satélites de metro a metro da variabilidade
espacial de determinada gleba, com relação a tipos de solo, fertilidade, doenças
e pragas. A decisão sobre a melhor alternativa para o gerenciamento localizado
da cultura é feita com a utilização de programas (softwares de geoprocessamento)
específicos dos SIGs, os quais fornecerão mapas com todas as características da
variabilidade espacial das glebas como produto final.
Esse
novo conteúdo técnico-científico-informacional em processo de consolidação na
agropecuária do Brasil e do mundo se configurou no que chamamos de agricultura
de precisão. O complexo agroindustrial da lavoura canavieira no Brasil vem
reestruturando sua cadeia de produção no que se refere à informatização de todos
os processos das atividades do setor, desde a utilização dessas tecnologias de
precisão no campo, até a automação de toda a planta da usina.
Sendo
assim, o uso da agricultura de precisão na lavoura canavieira na era da
informatização apoiada por satélites, determinando a posição do ponto a ser
tratado de acordo com as suas coordenadas geográficas, deve começar na colheita
de uma safra, mapeando a produção e levantando alguns fatores de ocorrência
importantes durante a colheita. Após essa fase, a ideia é iniciar a
interpretação dos resultados e levantar os fatores que provavelmente possam ter
causado a diferença na produção, através de pesquisa de fertilidade do solo,
presença de pragas, doenças ou reboleiras de ervas daninhas. A partir desse
ponto, inicia-se a aplicação dos insumos para a correção da fertilidade do solo
de forma mais específica e localizada.
Na
colheita mecanizada, com a utilização de um GPS na colheitadeira que identifica
as posições percorridas pela máquina e de uma esteira possuidora de uma balança
medidora da quantidade de cana colhida, obtém-se a produtividade precisa das
glebas. Esses dados obtidos são direcionados a um dos programas dos SIGs que
confecciona mapas das diferentes produtividades das áreas. Com essas informações
em mãos, a próxima fase será mapear quais as problemáticas que proporcionam as
diferenças de produtividades.
A
aviação agrícola, com o uso do GPS, obtém o controle das condições gerais da
lavoura canavieira. A nova técnica consiste em capturar imagens digitais das
áreas plantadas, na faixa espectral do infravermelho e gerar mapas das
variabilidades espaciais da cultura. Uma mesma imagem capturada pelos aviões que
sobrevoam os canaviais fornece quatro bandas espectrais distintas das
plantações: azul, verde, vermelho e infravermelho. Pela análise das diferenças
das cores apresentadas, obtida por meio de processamento digital, pode-se
apontar áreas onde é necessário ter reforço de adubação, irrigação e combate às
pragas e doenças.
Os
resultados obtidos dessas imagens aéreas, combinados com os dos mapas das
diferentes produtividades, possibilitam o uso preciso e localizado dos
defensivos agrícolas. Diferente de antigamente, quando havia uma média
condicional das áreas e se aplicava uma mesma quantidade de defensivos em toda a
gleba. Hoje eles são empregados somente nos pontos com
necessidade.
Isso
tem acarretado uma diminuição dos custos de produção e uma maior rapidez do
processo, pois os aviões mapeiam extensas áreas em poucas horas. Há também
redução das despesas trabalhistas com o descarte dos bandeirinhas (pessoas que
ficam demarcando as áreas onde se devia aplicar fertilizantes e herbicidas) e
com os topógrafos (pessoas que medem a localização dos
bandeirinhas).
No
setor de transportes da atividade canavieira, sistemas computadorizados também
estão acoplados às frotas de caminhões que recolhem a cana na lavoura e a levam
às usinas. Colocado nos veículos das frotas, o sistema de informação
desenvolvido é integrado e modular, atuando na área de controle, programação e
planejamento das principais atividades de manutenção das frotas de veículos
carregadores e transportadores de cana. O diagnóstico de irregularidades é
realizado de forma automática e permanente, garantindo sensível e constante
redução dos custos das operações. Assim, esses sistemas informatizados
possibilitam diagnosticar em qual fase do processo produtivo estão ocorrendo
problemas operacionais.
Os
equipamentos digitais existentes a bordo dos veículos das frotas registram
informações sobre as viagens realizadas, que posteriormente serão analisadas nos
computadores das usinas. Os possíveis erros ocorridos durante o percurso são
automaticamente explanados aos motoristas através de um alarme emitido pelo
equipamento. Essa padronização normativa das atividades dos veículos da frota
alcançada com a informatização tem gerado a redução dos custos com combustíveis,
manutenção de peças e problemas com acidentes e paradas desnecessárias
executadas pelos motoristas.
Nas
usinas onde a cana é transformada em açúcar e álcool, a automação informatizada
dos diversos processos de beneficiamento tem ocorrido nos últimos anos.
Automação de destilarias e moendas, tratamento do caldo, cozedores, centrífugas,
caldeiras, peneiras vibratórias, separadores de fermento, esteiras de tratamento
de bagaço, dornas de fermentação e manuseio do açúcar deram uma maior
padronização aos equipamentos das fábricas de açúcar e álcool. Programas
informacionais em rede interligam todas as áreas em funcionamento, na usina e no
campo.
Essas
mudanças são estudadas cautelosamente, segundo a viabilidade técnica e
econômica, a partir de um Plano Diretor de Automação (PDA), organizado pelas
usinas e pelas empresas fornecedoras dos serviços de engenharia e equipamentos
para a automação industrial. Com todos os processos regularmente dominados, a
implantação de um software Controlador Lógico Programável (CLP) molda o
funcionamento das máquinas e descarta gastos com mão-de-obra antes
necessários.
Dentre os benefícios da automação, os mais significativos são os seguintes:
estabilidade do processo; maior recuperação de Açúcares Totais Recuperáveis
(ATR) com relação aos processos manuais; precisão nas variáveis do processo;
otimização da disponibilidade da produção; controle de todas as atividades
industriais, desde a entrada da cana até a saída do açúcar e do álcool, com
minimização das margens de erro quanto às variáveis do processo; maior segurança
para os operadores das máquinas, visando a redução de acidentes de trabalho e
custo de manutenção; e não necessidade de operador para monitorar as máquinas
por tempo integral, com maior disponibilidade para a execução de outras
atividades, como a manutenção preventiva auxiliadora do complexo
produtivo.
Além
desses benefícios, a automação das fases industriais - garantindo maior
qualidade e produtividade – surge como inovação facilitadora da obtenção de
certificações de qualidade pelas usinas, itens cada vez mais primordiais na
competitividade global do setor, colocando o açúcar e o álcool das empresas que
os possuem com maior aceitação e rentabilidade nos mercados nacional e
internacional. 2SCHUMPETER, J. A. A teoria do
desenvolvimento econômico: uma investigação sobre lucros, capital, crédito, juro
e o ciclo econômico. São Paulo: Nova Cultural, 1997.
3SANTOS, M. Natureza do espaço:
técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: EDUSP, 2002.
4Op. cit. nota
3.
5SILVA, C. B. Inovação na
indústria sucroalcooleira paulista: os determinantes da adoção das tecnologias
de agricultura de precisão. 2009. Tese (Doutorado em Economia Aplicada) - Escola
Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo, Piracicaba,
2009.
Palavras-chave: meio
técnico-científico informal; agricultura de precisão; atividade
canavieira.
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1SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O
Brasil: território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro: Editora
Record, 2001.
Data de Publicação: 06/01/2010
Autor(es):
Danton Leonel de Camargo Bini (danton.camargo@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Sérgio Alves Torquato (storquato@apta.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor