Produção integrada de frutas: a inserção do maracujá paulista

            Os produtores que se adaptarem à Produção Integrada de Frutas poderão sair na frente, garantindo certificação da produção, maior competitividade no mercado, aumento de renda e sustentabilidade no negócio.
            A Produção Integrada (PI) surgiu como uma extensão do Manejo Integrado de Pragas (MIP) nos anos 1970, no norte da Itália, como uma necessidade de reduzir o uso de pesticidas e de se obter maior respeito ao ambiente.
            'A produção integrada é um sistema de exploração agrária que produz alimentos e outros produtos de alta qualidade, mediante o uso dos recursos naturais e de mecanismos reguladores para minimizar o uso de insumos e contaminantes e para assegurar uma produção agrária sustentável'1.
            Assim, a PI assegura alimentos de alta qualidade, mediante principalmente o uso de técnicas que levem em consideração os impactos ambientais sobre o sistema solo/água/produção e possibilita avaliar a origem dos produtos, considerando as características dos recursos naturais locais e dos processos envolvidos na cadeia produtiva. As normas de PI definem um sistema de produção que elenca as melhores alternativas existentes para a exploração, assim como os instrumentos e técnicas de monitoramento ambiental e controle da cadeia produtiva, assegurando um menor risco de contaminação ambiental direta e indireta e menores custos de produção.
            No Brasil, o MIP representa 80% da estratégia de implantação da PI. Entretanto, ainda é praticado por poucos, daí a necessidade de internalizar os seus conceitos (e benefícios) junto aos produtores.
            Esses conceitos, em especial no que se refere às boas práticas de manejo, ainda são relativamente 'novos'. Portanto, devem ser incorporados ao setor agropecuário o mais rápido possível, ainda que de forma gradativa. O apoio dos diferentes formadores de políticas públicas é imprescindível, uma vez que se observa crescente exigência nos mercados interno e externo.
            A fruticultura foi um dos setores pioneiros na adoção da tecnologia. A Produção Integrada de Frutas (PIF) teve um grande impulso a partir dos anos 1980 e 1990, em função do movimento de consumidores que buscavam frutas sadias – com qualidade e sem resíduos de agroquímicos – e do trabalho de pesquisadores e extensionistas que estimularam os movimentos para preservação dos recursos naturais e a biodiversidade2.
            O Programa de Desenvolvimento da Fruticultura (PROFRUTA), do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA)3, criou e regulamentou a PIF no Brasil, a partir das Diretrizes Gerais para a Produção Integrada de Frutas (DGPIF). Teve início em 1998 com a PIF da maçã nas regiões de Vacaria (RS) e Fraiburgo (SC), obtendo o selo de qualidade a partir de 2001, o que tem garantido seu espaço no mercado internacional. As PIFs para manga, uva, mamão, caju e melão permitirão que parte da produção já consiga o atestado de qualidade para a próxima safra4. Outras frutas como pêssego, citros, banana e, mais recentemente, figo, goiaba, caqui, lima ácida e maracujá estão sendo preparadas para se adequarem às PIFs.
            Esforços para assegurar a sustentabilidade do maracujá paulista dentro das normas da Produção Integrada de Frutas (PIF) são necessários diante da importância sócio-econômica da cultura, dos problemas advindos do atual sistema de produção e das boas perspectivas do mercado.

A importância do maracujá

            O consumo mundial de frutas tropicais deve apresentar um crescimento de 40%, até 2005, segundo estimativa da FAO (Food and Agriculture Organization of the United Nations)5. Paralelamente ao segmento de frutas frescas, a produção de sucos naturais vem se notabilizando pelo forte crescimento do consumo, inserindo-se os sucos de frutas tropicais e os sucos cítricos onde o Brasil se destaca no cenário internacional.
            O Brasil é o maior produtor (e o maior consumidor) mundial de maracujá. O maracujá azedo (Passiflora edulis f. flavicarpa) representa cerca de 97% da área plantada e do volume comercializado em todo país. Estima-se que mais de 60% da produção brasileira de maracujá azedo sejam destinados ao consumo in natura, através de sacolões, feiras, supermercados, etc. O restante é destinado às indústrias de processamento, sendo o suco o principal produto6.
            A partir de 1996, o Brasil passou de exportador à condição de comprador. Além do Brasil, em outros tempos, países como Peru e Colômbia já ocuparam a liderança na exportação de suco de maracujá, por um período máximo de quatro anos. Um dos principais fatores que contribuem para a troca de posição internacional no mercado dessa fruta está relacionado ao suprimento de matéria-prima, mais precisamente às doenças graves que afetam o cultivo do maracujazeiro, o que inviabiliza a sua produção sob o ponto de vista econômico, fazendo com que a cultura adquira caráter itinerante7. As importações brasileiras atuais são originárias do Equador.
            A característica itinerante do maracujazeiro, internamente também está relacionada a fatores como baixa capacidade de organização do setor produtivo e da comercialização e falta de orientação/interação entre os diferentes segmentos que compõem a cadeia produtiva do maracujá8.
            Graças ao PROFRUTA foi possível introduzir, em 2002, o projeto para implantação da Produção Integrada de Maracujá (PIF-Maracujá), que se encontra em desenvolvimento. A Associação de Fruticultores de Vera Cruz (AFRUVEC)9 apoiou a iniciativa, visando ao fortalecimento da cultura na principal região produtora do Estado.
            A área cultivada paulista concentrava-se no litoral sul, tendo aumentado de 324 hectares em 1988 para 5.741 hectares em 1996. Porém, no período de 1996 a 2003, o maracujá sofreu contínua redução da área cultivada no Estado (48,6%)10.
            Em 2003, está estimada em 2.951 hectares, com produção de 2,8 milhões de caixas de 16 kg, distribuída por diversas regiões do Estado. A produtividade média paulista está em torno de 16 toneladas por hectares, acima da média nacional (entre 10 e 15t/ha). Na expansão da cultura, ocorreu aumento expressivo da incidência de problemas fitossanitários, o que não foi acompanhado por um sistema de produção adequado às diferentes regiões produtoras.
            Nesse sentido, a rapidez na identificação de doenças agiliza o processo de controle, fazendo com que os danos causados à atividade sejam minimizados. Portanto, considera-se oportuno a difusão das práticas conforme a DGPIF nas áreas exploradas com o maracujá.
            A produção em geral é desenvolvida em pequenas propriedades, a maioria no contexto de agricultura familiar, e, salvo raras exceções, em área cultivada variando de 1 a 5 hectares por produtor. As necessidades de tratos culturais fazem com que a atividade seja exigente em mão-de-obra, notadamente nas fases de plantio, florada (polinização) e colheita. É importante ressaltar que detalhes técnicos inerentes à produção demandem treinamento para essa mão-de-obra.
            Pela própria natureza dos trabalhos com a cultura, a mão-de-obra familiar é perfeitamente adequada. Estima-se que sejam necessários 2 trabalhadores por hectare, de forma direta, totalizando cerca de 60.000 trabalhadores no Brasil. A ocupação indireta, por sua vez, estimada em 4 trabalhadores por hectare, soma 120.000 empregos. Assim, a cadeia de produção do maracujá emprega um total de 180.000 trabalhadores11.
            Portanto, a Produção Integrada ao surgir das demandas reais de satisfazer às necessidades da sociedade, no que se refere à produção de alimentos e insumos industriais gerados pela agropecuária, traz em seu bojo a criação de empregos no campo para a população de baixa renda, a redução de êxodo rural e a sustentabilidade ambiental e econômica.

1 Titi et al. (1995)3, citado em PIF – Produção Integrada de Frutas. www.ufpel.tche.br/pif/index.html). Capturado em out., 2003.
2 Hoje a PIF na Europa é utilizada com sucesso na maioria das espécies vegetais cultivadas, incluindo frutas, olerícolas, pastagens e grãos. A proposta teve um efeito importante na indústria química, que gradualmente começou a converter os produtos de largo espectro para produtos mais específicos e seletivos, com baixas concentrações de princípios ativos, biodegradáveis e, na medida do possível, feitos com ingredientes naturais. Estes avanços foram colocados em prática com mudanças na agenda de pesquisas, tendo como objetivo a PIF (www.ufpel.tche.br/pif/index.html).
3 MAPA: www.agricultura.gov.br
4 Suplemento Agrícola – OESP. Norma torna mais difícil a exportação de frutas. Notícias da terra, G4, 22/out./2003.
5 FAO: www.fao.org
6 Rossi, Ângelo D. Produção de sucos tropicais: o maracujá. Análise Setorial, 2001. 47p.
7Rossi, Ângelo D. Comercialização do maracujá. In: Simpósio Brasileiro Sobre A Cultura Do Maracujazeiro, 5., 1998, Jaboticabal. Anais... Jaboticabal: Ed. Afiliada, 1998. p. 279-287.
8Rossi, Ângelo D. Maracujá – um desafio à sustentabilidade da produção. IV Reunião Técnica de Pesquisa em Maracujazeiro, Viçosa, 2002.
9 AFRUVEC: www.afruvec.com.br
10IEA. Instituto de Economia Agrícola – Previsões e Estimativas das Safras Agrícolas. 2003 (Banco de Dados).
11 Graziano, X. O Novo Estatuto da Terra: uma proposta para valorizar a tecnologia e o emprego rural. Brasília, DF: Centro de Documentação e Informação - Coordenação de Publicações, 2001.

Data de Publicação: 20/11/2003

Autor(es): Elizabeth Alves e Nogueira (enogueira@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nilda Tereza Cardoso De Mello (nilmello@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Palmira R. Righetto (prrolim@biologico.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Ana Maria Sannazzaro (anasannaz@ig.com.br) Consulte outros textos deste autor