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Café: Negócio Promissor
Mercado O ano de 2002 finaliza com as
cotações do café em níveis semelhantes aos verificados no início de 2001. A
recuperação do café robusta no mercado de Londres começou em janeiro de 2002,
verificada a quebra da safra do Vietnã, e atingiu, em dezembro último, a média
de US$ 47,30 por saca de 60 quilos (incremento de 107,63% nos últimos 12 meses),
superando em 21% o valor praticado em janeiro de 2001. A recuperação dos cafés
arábicas, que teve início somente a partir de julho de 2002, cresceu 31,75% nos
últimos 12 meses na Bolsa de Nova Iorque (contrato C, 2ª posição), atingindo em
dezembro US$86,06/sc, ainda 5,45% inferior à cotação média observada em janeiro
de 2001 (gráfico 1).
Assim, pode dizer-se que, no segundo semestre de 2002, se observou forte
inversão na tendência de preços no mercado cafeeiro, dado que, após a grande
safra mundial verificada no ano-safra 2002/03 (estimativas do USDA de 125
milhões de sacas) - cerca de 15 milhões de sacas superior ao consumo do ano -, a
expectativa é de que no ano-safra 2003/04 a produção mundial seja inferior ao
consumo.
No
mercado interno, os preços recebidos pelos produtores, além de acompanhar as
altas nos mercados internacionais, têm sido fortemente estimulados pela
desvalorização do real, de tal forma que as cotações observadas para o café
arábica, no âmbito dos produtores em São Paulo, voltaram aos níveis de maio de
2000, em termos nominais (gráfico 2). Assim, os preços recebidos pelos
produtores cresceram 77,13% no ano de 2002.
Entretanto, a instabilidade do câmbio brasileiro levou ao aumento do diferencial
das cotações no mercado futuro da BM&F, em relação à de Nova Iorque. Esta
diferença, que chegou a menos US$ 9,71/sc em dezembro de 2001, cresceu ao longo
dos meses para -US$ 21,62 /sc em dezembro de 2002, o que acabou por refletir nos
preços para os produtores brasileiros. Isso ocorreu porque a forte pressão de
venda exercida pelos exportadores brasileiros proporcionou aumento nos descontos
oferecidos aos importadores, resultando em menores cotações no mercado interno
brasileiro e em menores preços aos produtores, ao mesmo tempo em que o café
brasileiro recuperou uma importante fatia de 32% do mercado internacional do
café. Assim, os preços não estão captando toda alta observada no mercado
internacional do café.
É importante destacar que, de agora em diante, as cotações de café no Brasil e
no mercado internacional vão depender fortemente do desenvolvimento da safra
brasileira do ano-agrícola de 2002/03, assim como do comportamento do clima até
o completo desenvolvimento dos grãos e início da colheita. Nestas condições, os
produtores, tanto na venda de seus estoques quanto na venda da safra futura,
deverão estar atentos à expectativa dos preços futuros, para melhorar seus
níveis de negociação, após a crise enfrentada nos últimos dois anos.
Fonte: Instituto de Economia Agrícola
Exportando com maior valor agregado
Nesse espaço, temos rotineiramente defendido a tese de que o Brasil deveria posicionar-se globalmente como uma plataforma exportadora de café, notadamente buscando obter maior market share nas exportações de
café torrado e moído (T&M). Tal idéia, embora tenha levado algum tempo para
vingar, começa a caminhar, a partir de iniciativas pautadas pela parceria entre
os setores público e privado.
Projeto desenvolvido pelo Sindicato da Indústria do Café do Estado de São Paulo
(Sindicafesp), com apoio da Agência de Promoção às Exportações (Apex), é uma
primeira iniciativa conjunta nesse campo. Em evento de sensibilização para o
tema, realizado nas dependências da FIESP, foi lançado o Programa Setorial
Integrado (PSI) para incremento das exportações de café T&M. Tal programa já
abrange outros produtos, sendo emblemático o caso da cachaça que se tornou uma
bebida apreciadíssima em inúmeros países europeus.
O momento não poderia ser melhor para iniciar os trabalhos do PSI-café T&M, pois se percebe na nova equipe de governo (particularmente nos mandatários dos Ministérios do Desenvolvimento Econômico, da Agricultura e das Relações Exteriores) um renovado ímpeto na política de comércio exterior. Portanto, torna-se bastante oportuno que o café também componha a política de agregação de valor de nossas exportações. A Apex, associada às empresas (torrefadoras, cooperativas e traders) e ao Sindicafesp, aportando um
baixo montante de recursos financeiros, prevê que até 2006 o Brasil poderá
atingir o patamar de US$ 100 milhões em exportações de café T&M.
A meta de exportações propugnada é plenamente factível, pois nosso segmento de
torrefação possui nível tecnológico compatível com as exigências internacionais.
Ademais, o salto de qualidade alcançado pelo café brasileiro credencia-o a estar
presente nas prateleiras de qualquer distribuidor situado alhures. A trajetória
exitosa dos prêmios dos lotes de cafés verdes leiloados pela Brazil Specialty
Coffee Association (BSCA) comprova essa hipótese (sendo esse também um projeto
em parceria com a Apex).
Auspiciosa é a participação de cinco cooperativas de cafeicultores (uma isoladamente e outras quatro na forma de pool) ao programa. O segmento cooperativista possui competência na exportação de grão verde. Assim, é relativamente simples o passo no sentido de incluir em seus negócios tradicionais um novo negócio (exportação de café T&M) junto a sua clientela ou em novos mercados a serem prospectados. Também as empresas traders poderão ser potencialmente beneficiadas na adesão
ao PSI, uma vez que são particularmente talhadas para atuar no comércio
internacional.
Entre as estratégias de ações a serem implementadas, podem ser listadas joint-ventures com torrefadoras internacionais (duas já
em andamento); articulação para participação em feiras e eventos internacionais;
patrocínio à vinda de compradores de café para conhecer nossa cafeicultura e a
diversidade de grãos/bebidas disponíveis; aquisição de marcas de café nos países
importadores dos produtos; e industrialização de café para suprimento de marcas
próprias dos distribuidores (Coimex e Wall Mart), dentre outras.
Aos poucos, são abertas novas janelas para a constituição da idéia do Brasil
como plataforma exportadora de cafés. Lembramos que outros investimentos
anunciados compõem essa diretriz, tais como a ampliação da fábrica da Nestlè em
Araras (SP); a diminuição das barreiras européias para o solúvel; os ganhos
potenciais pela adesão à Alça e as multinacionais instaladas no País que
finalizam projetos de exportação de T&M.
A disparidade das previsões sobre a safra
De
acordo com última estimativa de safra divulgada, em 19/12/2002, pela Companhia
Nacional de abastecimento (Conab), a produção brasileira de café, no ano 2002,
foi da ordem de 47,2 milhões de sacas, o que corresponde a volume 5% superior à
estimativa anterior e 51% maior que a produção de 2001, reestimada em 31,3
milhões de sacas. Minas Gerais produziu 24,6 milhões de sacas, seguido de
Espírito Santo (9,0 milhões de sacas) e São Paulo (5,8 milhões de sacas).
Somados, esses três estados respondem por mais de 80% da produção.
Esses resultados não causaram qualquer surpresa, pois já predominava no mercado
o sentimento de que o órgão federal, responsável pelo levantamento, revisaria
para cima os dados de produção de 2002, em função do surgimento de novas
variáveis não consideradas anteriormente. Mesmo assim, o volume divulgado ficou
abaixo das estimativas feitas por alguns segmentos do mercado, que ultrapassavam
50 milhões de sacas. O próprio Departamento de Agricultura dos Estados Unidos
(USDA) estimou em 51,6 milhões de sacas a produção brasileira de 2002.
Também foi anunciada a primeira estimativa para a safra 2003, a qual deverá
variar entre os limites de 27,7 milhões e 29,7 milhões de sacas.
Chama atenção o fato de que a grande queda na produção em 2003 se dará em cima
da produção de café arábica, que deverá declinar de 37 milhões para 19 milhões a
20 milhões de sacas, enquanto, no caso do robusta, a redução deverá ser
desprezível, passando de praticamente 10 milhões para 9 milhões de sacas. O
mercado poderá, assim, encontrar dificuldades de abastecimento de café arábica,
principalmente de qualidade superior, pelo fato de que as maiores quedas na
produção serão observadas nas regiões tradicionalmente produtoras de cafés
finos.
Ainda em relação ao café robusta, um ponto pouco mencionado, para o qual se deve
chamar atenção, é o de que o Brasil, se já não é o principal produtor dessa
variedade no mundo, logo o será, ficando a dúvida por conta da credibilidade das
informações divulgadas tanto pelas autoridades do Vietnã quanto pelo USDA.
Os números da Conab terão pequeno (ou talvez nenhum) impacto sobre o mercado de
café. Primeiro, porque os agentes já esperavam uma revisão para cima da produção
de 2002; segundo, porque, como o mercado de café opera baseado mais em
expectativas de eventos futuros, a grande queda de safra esperada para 2003 já
estava refletida no mercado, constituindo-se na principal causa da mudança de
patamar e reversão da tendência declinante da curva de preços. Oscilações para
baixo, como as verificadas ultimamente, fazem parte de um mercado livre e com
presença de grandes especuladores.
Entretanto, o que interessa, principalmente para produtores e cooperativas, é
saber que, pelos fundamentos do mercado, a tendência de preços, a médio prazo, é
de evolução bastante favorável. Assim, se no passado (desde 1997, já prevendo
preços declinantes) alertávamos contra a afoiteza com que os produtores
investiam na produção, ampliando as áreas de plantio, hoje a nossa recomendação
é no sentido de postergar suas vendas, para obter resultados econômicos mais
favoráveis, inclusive compensando parte dos prejuízos acumulados em anos
recentes.
Algumas considerações sobre os números do mercado mundial embasam o nosso
otimismo quanto ao futuro. Segundo o USDA, a produção mundial de café em 2002
será de 125 milhões de sacas, considerada nessa avaliação a produção brasileira
de 51,6 milhões de sacas. Um ajuste desse número, em função da produção
brasileira dada pela Conab (47,2 milhões de sacas), reduziria esse volume global
para 120,8 milhões de sacas, ainda assim bem acima do consumo global, estimado
em menos de 110 milhões de sacas pela Organização Internacional do Café (OIC) e
a maior parte dos analistas.
Entretanto, a grande questão no mercado cafeeiro mundial é quanto ao balanço
entre produção e consumo no ano 2003. Se considerarmos que os demais países não
terão grandes alterações em sua situação e estrutura produtiva, e admitindo-se
ainda uma quebra de safra da ordem de 35 a 40% na produção brasileira, é grande
a probabilidade de se ter, pela primeira vez nos últimos 5 anos (a última vez
foi em 1997), uma situação de mercado em que a produção global não será
suficiente para atender ao consumo, obrigando os países consumidores a recorrer
aos estoques, cujo volume atinge mais de 20 milhões de sacas.
Data de Publicação: 09/01/2003
Autor(es):
Luiz Moricochi (moricochi@iea.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Nelson Batista Martin (nbmartin@uol.com.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor