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Mercado de Café - covid–19
1 - MERCADO DE CAFÉ A covid-19 atingiu
praticamente o mundo todo, resultando em incertezas sobre o futuro nas mais
diversas áreas. Suas possíveis repercussões no mercado cafeeiro geram muitas
expectativas. A evolução de sua propagação consiste em desafio ao segmento
cafeeiro, decorrente da insegurança dos consumidores em visitar os equipamentos
de varejo, pois não há precedentes para a situação atual em âmbito global. 2 - EXPECTATIVAS NO CONSUMO Embora o mercado de café ainda se mostre pouco
afetado pelos reflexos da pandemia, os cafeicultores anseiam por informações
mais assertivas, embasadas em dados acreditados, apesar das medidas de
mitigação implantadas pelas diversas esferas de governo. No cenário mundial, o
consumo de café apresenta comportamento tipicamente inelástico, ou seja,
oscilações no seu preço ou na renda dos consumidores, e consequentes alterações
na demanda do produto, não ocorrem na mesma proporção. Historicamente, seu
consumo mantém crescimento geométrico de 2,25% ao ano (Figura1). A demanda de café em
2020, estimada àquela taxa, alcançaria 171,70 milhões de sacas, incremento de
3,78 milhões de sacas no ano civil. Mas essa expectativa
poderá ser reduzida, considerando-se os reflexos da pandemia sobre a economia
global, ainda que, no curto prazo, o isolamento social promova maior consumo da
bebida, como recentemente noticiado em importantes mercados (EUA, Brasil,
França e Itália). Apesar das características do consumo de café, a
Organização Internacional do Café1 prevê que uma queda maior no
crescimento do produto interno bruto (PIB) ou uma recessão global poderá causar
efeito negativo acentuado sobre o segmento cafeeiro, resultando na estagnação ou até mesmo queda dos níveis de consumo, em
comparação ao período
pré-crise, marcado por anos de crescimento. A análise se baseia em uma amostragem dos 20 maiores países consumidores de
café, que representam 71% da demanda global. Os resultados mostraram que
um ponto percentual de queda no crescimento do PIB está associado a uma redução
do crescimento da demanda global de café de 0,95 ponto percentual, ou 1,6
milhão de sacas de 60 kg. O desemprego resultante da pandemia e consequente
redução da renda familiar poderão afetar a demanda por café, não só em termos
de volume. Os consumidores mais sensíveis aos preços poderão substituir café de
valor mais alto por blends ou marcas
de menor valor. No Brasil, embora no curto prazo o consumo fora de
casa venha diminuindo em escala significativa, dados sobre o comércio varejista
indicam que as compras no início da pandemia e o armazenamento doméstico de
provisões levaram a um aumento da demanda nas duas primeiras semanas da
quarentena, indicando aumento no consumo doméstico. Mas, a seguir, houve
regularização no volume comercializado do café industrializado. Em algumas regiões processadoras de café tem-se
notado alto índice de suspensão/interrupção de contratos de trabalhos. No centro
oeste paulista (região de Garça e Marília), foi atingido cerca de 40% do
comércio de modo geral (incluindo empresas alimentícias, bastante
representativas na região) e espera-se retração em torno de 17% a 22%% na
movimentação econômica regional, incluindo as compras nos supermercados2,
podendo atingir e modificar a relação consumo per capita do café. Torrefadoras líderes do mercado, preocupadas com
seus clientes institucionais, promovem mecanismos de financiamento e oferecem
suporte para o fluxo de caixa que foi contingenciado com a decretação da
quarentena. Outras soluções, como os vouchers de compras antecipadas para
utilização a posteriori, foram implementados (cafeterias, bares e
restaurantes). A criatividade em marketing das marcas e negócios tem sido
largamente empregada para manter a viabilidade econômica dos negócios. 3 - EXPECTATIVAS NO SEGMENTO DE
CAFÉS ESPECIAIS Atualmente, o segmento de cafés especiais,
representado por consumidores mais exigentes quanto aos aspectos qualitativos,
mas também quanto à sustentabilidade da cadeia agroindustrial, já representa
12% do mercado internacional3. O Brasil é um dos poucos países
capazes de produzir grande volume desse tipo de produto, devido à sua variedade
de bebidas obtidas nas regiões com diferentes tipos de solos, temperaturas e
altitudes4. Consequentemente, surgiram cafeicultores interessados em
se especializar na produção de cafés com maior valor agregado, objetivando
ampliar sua participação em nichos de mercado e melhorar a rentabilidade do seu
negócio. Em decorrência das medidas de contenção da covid-19,
estabelecimentos especializados em servir cafés para consumo local, bem como em
comercializar grãos torrados e/ou moídos, encontram-se fechados. Empresas
tradicionais, bem estabelecidas no mercado, comercializam seus produtos online
há algum tempo. Alguns empresários rurais estão tentando trilhar caminho
similar. Apesar disso, há possibilidade de que parte do volume de cafés
especiais produzido venha a ser comercializado como commodity, com a esperança
de que seus investimentos sejam remunerados. 4 - EXPECTATIVAS NAS EXPORTAÇÕES
BRASILEIRAS Com menor dependência de mão de obra em relação aos
seus principais concorrentes, as aquisições internacionais deverão favorecer o
Brasil, pois a garantia de volume, qualidade e prazo de entrega são
imprescindíveis diante da incerteza global estabelecida pela pandemia. A colheita poderá
assentar novo recorde de produção da lavoura no Brasil, um suprimento aguardado
por todo o mercado mundial. A redução dos estoques resultante do repentino
aumento do consumo e a significativa desvalorização cambial, caso não estresse
o fluxo logístico, deverão contabilizar progressivo aumento dos embarques
brasileiros. 5 - ESTIMATIVAS DE PRODUÇÃO E
COLHEITA NO BRASIL E NO ESTADO DE SÃO PAULO O recorde de produção no Brasil, de acordo com as
estimativas da Companhia Nacional de Abastecimento em janeiro de 2020, indica,
para a safra 2019/2020, em quase todas as regiões cafeeiras brasileiras, uma
produção entre 57,2 milhões e 62,02 milhões de sacas beneficiadas, superior à
safra anterior, em grande parte devido à influência da bienalidade positiva –
principalmente em relação ao café arábica5. Daqueles volumes, 43,2
milhões a 45,93 milhões de sacas de café arábica (aumento em volume entre 26,0%
e 34,1% em relação à safra 2018/2019) e 13,95 milhões a 16,04 milhões de sacas de
conilon (redução 7,1% e crescimento de 6,8% em relação à safra anterior). Em São Paulo, o segundo levantamento6 de
estimativa de safra de café 2019/20, realizado pelo Instituto de Economia
Agrícola e Coordenadoria de Desenvolvimento Rural Sustentável, indicou para o
estado que as boas condições climáticas e hídricas elevaram as expectativas de
colheita para 5,8 milhões de sacas de 60 kg de café beneficiado, estimativa que
poderá, inclusive, aumentar caso as boas condições climáticas se mantenham até
o final da colheita, podendo representar novo recorde de produção em todas as
regiões cafeeiras paulistas. Em relação à pandemia
de covid-19, não são esperados impactos significativos sobre o segmento
cafeeiro de modo geral, tampouco sobre a colheita da safra 2019/20 nas
principais regiões cafeeiras brasileiras. Os impactos na contratação e gestão
de mão de obra e de seu transporte poderão exigir adoção de medidas de proteção
aos colaboradores, que podem se acentuar caso o isolamento social for
intensificado e estendido regionalmente, visando combater a disseminação do
vírus. No caso do prolongamento do isolamento social, nos
minifúndios e pequenas propriedades – com mão de obra própria e de familiares,
ou os que contratam poucos colaboradores – os impactos não deverão ser
significativos. Propriedades médias e grandes sem colheita mecanizada precisam
contratar maior volume de mão de obra e, portanto, deverão ser mais afetadas.
Das quatro principais regiões cafeeiras do Estado de São Paulo, duas são
predominantemente mecanizadas - Alta Mogiana e Oeste Paulista – e não deverão
ser afetadas. Impactos mais significativos poderão ocorrer principalmente
na cafeicultura de montanha, onde prevalece a colheita manual, principalmente
na Baixa Mogiana. O uso de derriçadeira manual atenuará os impactos em relação
à colheita integralmente manual. De um modo geral, todas as regiões paulistas
adotaram medidas de prevenção, conforme orientações dos
serviços de saúde municipais, que incluem o afastamento do trabalho de qualquer
pessoa com sintomas. Especialistas, governos, entidades de classe e
cooperativas têm elaborado documentos com recomendações sobre a covid-19 no
meio rural, com base em orientações da Organização Mundial da Saúde. Elas
incluem higiene pessoal, saneamento de equipamentos e locais de trabalho, para
garantir a saúde dos proprietários e seus colaboradores e minimizar os efeitos
do vírus no segmento cafeeiro. O transporte da mão de obra é um dos itens mais
preocupantes nesse momento, resultando na preferência dos cafeicultores por
contratar mão de obra local. Oportunidades para alguns cafeicultores podem
aparecer devido ao desemprego resultante das medidas de isolamento social, o
que tem resultado em mão de obra potencial para a colheita do café. Sua
utilização efetiva dependerá do balanço entre os ganhos dos trabalhadores na
colheita formal e o valor do auxílio emergencial do governo federal, posto que
os cafeicultores evitem o uso de mão de obra não registrada – daqueles que não
desejam perder aquele auxílio – para não incorrerem em futuros passivos
trabalhistas. Outro ponto importante será a excelente qualidade
dos grãos que deverá alcançar 70% da safra, resultado de apenas uma grande
florada, com maturação bastante uniforme, e da permanência dos grãos nos pés
devido ao menor volume de chuvas, beneficiando a granação do grão e, dessa
maneira, o prolongamento de sua permanência no pé de café. 6 - DIFICULDADES COMUMENTE
ENFRENTADAS PELOS CAFEICULTORES Em relação aos principais problemas enfrentados
pelos cafeicultores destacam-se: redução de mão de obra para manutenção de
equipamentos e maquinários, e redução no período de atendimento das empresas de
processamento (secagem, classificação e armazenagem), beneficiamento,
torrefação, industrialização e comercialização do café. Iniciativas de impedimento do fluxo de caminhões em
algumas localidades já foram solucionadas. A suspensão de abastecimento de
cafés especiais para torrefadores e casas especializadas decorrente de
dificuldades de transporte da produção tem sido mais significativa em cidades
de grande porte, onde o impacto do fechamento do comércio e controle do tráfego
foi mais efetivo. A oscilação do mercado levou grandes torrefadoras a comprarem
grãos com antecedência de um mês visando não comprometer o fornecimento aos
supermercados. Em função da estimativa de safra recorde e possível
deficiência de contêineres para exportação e/ou enfrentamento de crise sanitária,
a indústria cafeeira poderá precisar se adaptar às oscilações do mercado nos
próximos meses7. 1ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO CAFÉ - OIC. Impacto da Covid-19 no setor global do café
– o lado da demanda. London: OIC, 2020. Disponível em: http://www.ico.org/market-report-19-20-e.asp.
Acesso em: 22 abr. 2020. 2ASSOCIAÇÃO COMERCIAL E INDUSTRIAL DE
MARÍLIA – ACIM. Notícias. Marília:
ACIM, 2020. Disponível em: https://acim.org.br/noticias. Acesso em: 22 abr.
2020. 3FIDELIS, L. Café commodity x especial: vale a pena investir? Safraes, 2019.
Disponível em:
https://www.safraes.com.br/mercado/cafe-commodity-x-especial-vale-pena-investir.
Acesso em: 25 abr. 2020. 4COMPANHIA NACIONAL DE ABASTECIMENTO -
CONAB. Acompanhamento da safra
brasileira café. Brasília: CONAB, 2019. Disponível em:
https://marco/downloads/boletimcafemaio2018.pdf. Acesso em: 25 abr. 2020. 5Op. cit. nota 4. 6CAMARGO, F. P. et
al. Previsões e
Estimativas das Safras Agrícolas do Estado de São Paulo, ano agrícola 2019/20,
fevereiro de 2020. Análises e Indicadores do Agronegócio, v. 15, n. 4,
p. 1- 9, 2020. Disponível em: http://www.iea.sp.gov.br/ftpiea/AIA/AIA-22-2020.pdf. Acesso em: 20 abr. 2020. 7FAGES, C. Pandemia do coronavírus tem forte impacto no mercado mundial de café.
Notícias, São Paulo, 2020. Disponível em:
https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/rfi/2020/04/10/pandemia-do-coronavirus-tem-forte-impacto-no-mercado-mundial-de-cafe.
Acesso em: 22 abr. 2020. Palavras-chave: coronavírus,
expectativas, mercado, café.
Data de Publicação: 16/06/2020
Autor(es):
Patricia Helena Nogueira Turco Consulte outros textos deste autor
Fernanda de Paiva Badiz Furlaneto (fernandafurlaneto@aptaregional.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Flávia Maria De Mello Bliska (bliska@iac.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor