Monumentos Geológicos e Turismo Rural em Propriedades Agrícolas

 

 


            O patrimônio natural paulista pode ser dividido em dois grandes grupos: a) o biótico, representado pela fauna e flora (biodiversidade), e b) o abiótico, constante do patrimônio natural geológico (geodiversidade). 
 

            Entende-se por geodiversidade a variedade de ambientes geológicos, fenômenos e processos ativos que dão origem aos minerais, rochas, solos, paisagens, fósseis e outros depósitos superficiais que são suporte para a vida na Terra1 (Figuras 1 e 2). 
 

Figura 1 - Monumento Geológico Rocha Moutonneé, Salto, Estado de São Paulo.
Fonte: RIBEIRO, R. R. Monumento Geológico Rocha Moutonneé, Salto, SP. 2010. 1 fotografia.
 
 
 
 
 

Figura 2 - Geossítio Cuscuzeiro de Analândia, Analândia1, Estado de São Paulo.
1Morro do Cuscuzeiro está localizado em uma propriedade rural do município de Analândia.
Fonte: RIBEIRO, R. R. Geossítio Cuscuzeiro de Analândia, Analândia, SP. 2010. 1 fotografia.
 
 

            Quando se identifica algum dos elementos da geodiversidade que apresente alto valor científico, cultural, educacional ou turístico, pode-se declará-lo (após avaliação por uma comissão técnico-científica) como monumento geológico.
 

            O conjunto de monumentos geológicos é considerado o patrimônio geológico de uma dada região ou espaço geográfico. Esse patrimônio (natural e cultural), além de fundamental para entendimento da história da Terra e da história da humanidade, é necessário para a formação de novos geocientistas nacionais e internacionais, preservação do meio ambiente, turismo, entre outras finalidades.
 

            O uso turístico de um monumento geológico é considerado como geoturismo que, segundo Ruchkys (2007),

pode ser entendido como um segmento da atividade turística que tem o patrimônio geológico como seu principal atrativo e busca sua proteção por meio da conservação de seus recursos e da sensibilização do turista, utilizando, para isto, a interpretação deste patrimônio tornando-o acessível ao público leigo, além das ciências da Terra2.

 

 

            Quando um monumento geológico é identificado em uma propriedade agrícola, o uso turístico neste geossítio pode ser uma forma interessante de aliar a conservação e a divulgação deste patrimônio natural e cultural com o desenvolvimento socioeconômico de uma localidade. Esse geossítio pode ser um fator de agregação de valor à propriedade agrícola, com possibilidade da prática do turismo rural, hoje em expansão. O turismo rural permite que a propriedade rural exerça sua função social, econômica e educativa, além de possibilitar a geração de alguma renda extra aos seus proprietários.
 

            Neste sentido, o Instituto Geológico, da Secretaria do Meio Ambiente, desenvolve projeto denominado Monumentos Geológicos de São Paulo, cujo objetivo principal é contribuir para o registro, o conhecimento e a divulgação do patrimônio geológico do Estado de São Paulo. Pretende também implantar o Inventário Paulista dos Monumentos Geológicos, para registrar, localizar e divulgar os monumentos que compõem o patrimônio geológico, de valor científico, no âmbito do Estado de São Paulo.
 

            Vários elementos da geodiversidade com grande potencial para serem monumentos geológicos não possuem nenhuma beleza cênica ou estão camuflados na cobertura vegetal, ao longo de várias áreas rurais. Muitos proprietários nem desconfiam de seu valor científico, paisagístico ou cultural. É o caso de grutas, cavernas, cachoeiras, rochas de formatos curiosos, canyons, etc.
 

            A possibilidade de identificar novos monumentos geológicos em propriedades rurais mostrou a importância de uma aproximação com o setor agrícola paulista. Uma das formas encontradas para informar e esclarecer sobre o assunto foi contatar a Câmara Setorial de Lazer e Turismo Rural da Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo (SAA). Na ocasião, a Câmara se mostrou receptiva à sua divulgação, vendo o geoturismo como uma nova oportunidade de atividade de turismo rural a ser divulgada aos produtores rurais paulistas.
 

            Basicamente, é identificada a existência de um geossítio em uma propriedade rural, avaliá-lo cientificamente, aprová-lo como monumento geológico e integrá-lo no inventário estadual.
 

            A partir de então, a ideia é incentivar seu proprietário a utilizá-lo como uma atividade do turismo rural, de forma sustentável, contribuindo para sua preservação. Nesse sentido, necessitará de um plano de manejo que oriente a melhor forma de conservação e de visitação deste patrimônio geológico.
 

            O turismo rural é definido pela Câmara Setorial de Turismo Rural da SAA como
 

atividade econômica realizada no espaço rural, tendo como unidade básica uma propriedade que seja ou tenha sido produtiva e proporcione lazer a partir da exploração de atividades inerentes ao meio. Inserem-se nesse contexto o ecoturismo, o de aventuras, o cultural, o histórico, o religioso e outros3.


            Tal definição permite incluir o conceito de geoturismo (como uma vertente do ecoturismo). Assim, por também apresentar características culturais e históricas, o geoturismo poderá ser utilizado no desenvolvimento do turismo rural e na conservação do patrimônio natural e cultural paulista.
 

            Essa ideia é reforçada pela definição utilizada pelo Ministério do Turismo4, que entende o turismo rural como um conjunto das atividades turísticas desenvolvidas no meio rural que estejam comprometidas com a produção agropecuária e agregue valor a produtos e serviços, conseguindo com isso resgatar e promover o patrimônio cultural e natural da comunidade.
 

            O uso turístico de um monumento geológico em uma propriedade agrícola, na forma do turismo rural, não implica ao proprietário rural, necessariamente, o tombamento do bem geológico, a desapropriação de seu imóvel ou a alteração dos direitos de propriedade. A legislação ambiental brasileira permite algumas possibilidades de proteção dos recursos naturais com o apoio do proprietário, como é o caso, por exemplo, da criação de uma Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN)5. Nessa categoria de unidade de conservação não há desapropriação do imóvel. A área reconhecida como RPPN passa a integrar o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), conforme previsto na Lei n. 9.985/20006.
 

            Uma das funções da RPPN é auxiliar na preservação da vegetação natural do Estado de São Paulo, que hoje conta com apenas 13,9% de vegetação. O fato de um proprietário transformar sua propriedade, ou parte dela em uma RPPN, auxilia na ampliação das áreas de proteção ao meio ambiente. Poderá ser incluída nessa ação de proteção ambiental a conservação do patrimônio natural geológico.
 

            Uma propriedade agrícola que acolha um monumento geológico, ao se transformar em uma RPPN, além da prática do turismo rural, poderá também proporcionar ao seu proprietário alguns benefícios, como:
 

- isenção do Imposto Territorial Rural sobre a área preservada;

- prioridade no acesso a recursos do Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA), do Ministério do Meio Ambiente, para projetos de implantação e gestão da RPPN;

- prioridade no acesso aos programas federais de crédito rural às propriedades que contenham RPPN em seu perímetro, sobre determinadas condições;

- acesso a recursos do Fundo Estadual de Recursos Hídricos (FEHIDRO) para recuperação, educação ambiental e conservação de áreas protegidas, por meio de parcerias;

- acesso a recursos e apoio técnico para a elaboração de plano de manejo da unidade de conservação; e

- garantias oficiais para a defesa do patrimônio natural existente no imóvel7.

O turismo rural no Brasil ainda é uma atividade emergente, na qual o produtor necessita agregar valores a seus produtos e também encontrar outras fontes de renda alternativas à sua produção8.
 

            As atividades turísticas no meio rural constituem-se da oferta de serviços, equipamentos e produtos de hospedagem, alimentação, recepção à visitação em propriedades rurais, recreação, entretenimento e atividades pedagógicas vinculadas ao contexto rural e outras atividades complementares às listadas, desde que praticadas no meio rural, que existam em função do turismo ou que se constituam no motivo da visitação9.
 

            Essa nova alternativa mostra-se mais um caminho para o produtor rural, com agregação de valor à sua atividade. Ela pode ainda, entre outros fatores, influenciar na diminuição do êxodo rural, gerar novos postos de trabalho e criar estratégias de preservação ambiental. Para isso, pode utilizar os recursos e a mão de obra local, muitas vezes remanescente da produção agropecuária, além de haver a possibilidade de recebimento de recursos e incentivos fiscais, que poderá auxiliar a permanência do homem no campo, por meio de uma nova atividade remunerada.
 

            A valorização do patrimônio natural como uma atividade estratégica, que tenha como objetivo principal a preservação e a recuperação ambiental do espaço rural e natural, e ainda como fonte de educação, é uma nova linha de atuação que converge com os interesses de um turismo rural sustentável - no caso, em uma propriedade agrícola.

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1BRILHA, J. Patrimônio geológico e geoconservação: a conservação da natureza na sua vertente geológica. Braga: Palimage Editores. 2005. 190 p.

2RUCHKYS, U. A. Patrimônio Geológico e geoconservação no Quadrilátero Ferrífero, Minas Gerais: potencial para criação de um geoparque da UNESCO. 2007. 211 p. Tese (Doutorado) - Instituto de Geociências, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2007.

3COORDENADORIA DE DESENVOLVIMENTO DOS AGRONEGÓCIOS - CODEAGRO. Processo n. 71.290/98. Ata da reunião do Grupo de Trabalho de Conceituação e Lenvantamento: Câmara Setorial de Lazer e Turismo no Meio Rural. São Paulo: CODEAGRO, 1999. (Mimeografado).

4SILVA, N. P. et al. Turismo rural: fonte de renda alternativa para produtores rurais.In: ENCONTRO DE ENGENHARIA E TECNOLOGIA DOS CAMPOS GERAIS. 3., 2007, Ponta Grossa. Anais... Ponta Grosa: AEAPG, 2007. Disponível em: <http://www.aeapg.org.br/3eetcg/Anais/ARTIGOS/PDFS/Desenvolvimento%20-%2001.pdf>. Acesso em: 21 Mar. 2011.

5RPPN é uma unidade de conservação privada que compreende o espaço territorial e seus recursos ambientais, legalmente instituída pelo Poder Público. Lei Federal nº 9.985/2000.

6SÃO PAULO (Estado). Secretaria do Meio Ambiente. Reserva Particular do Patrimônio Natural - RPPN: a natureza na sua propriedade, 2008. (folder).

7Op. cit. nota 6.

8Op. cit. nota 4.

9FORTES, C. V. A. Turismo rural: um instrumento de Inclusão social: os passos do planejamento. 2007. 88 p. Monografia (Especialização) - Centro de Excelência em Turismo, Universidade de Brasília, Brasília, 2007.
 
 

Palavras-chave: monumento geológico, patrimônio natural, turismo rural, propriedade agrícola, agregação.

 

 

Data de Publicação: 03/06/2011

Autor(es): Rogério Rodrigues Ribeiro (rrribeiro@igeologico.sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor
Rosana de Oliveira Pithan e Silva (rosana.pithan@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor