Fortalecimento do Real Pressiona as Cotações Futuras

 

Os indícios de que a economia brasileira exibirá recuperação em V da crise pandêmica tornaram-se mais consistentes, ocasionando um redirecionamento dos investimentos para o mercado acionário e investimentos produtivos, uma vez em que uma forte retomada econômica retira parte da pressão sobre a evolução do deficit público já contratado para 2021. Ademais, os registros consistentes de expressivo saldo cambial em 2020 (±US$55 bilhões) decorrente do balanço de exportações e importações aumentam o patamar das reservas internacionais em nível suficiente para desestimular especulações com a moeda estrangeira no mercado interno (Figura 1).

 

A valorização do real traz relevantes impactos sobre a formação dos preços das commodities agrícolas comercializadas nas bolsas. Tal comportamento do câmbio retira parte da competitividade espúria conquistada pelo produto brasileiro no mercado internacional, pois encarece em dólar os embarques. Por outro lado, retira a pressão sobre os preços desses produtos que têm como destino o mercado interno (caso emblemático em 2020 do óleo de soja). O café não escapa dessa lógica, pois com o real se valorizando, o desembolso dos importadores aumenta, pressionando os preços recebidos pelos cafeicultores; somente assim os contratos com os clientes internacionais são preservados.

Na Bolsa de Nova York, a média semanal das cotações futuras do café arábica exibiu evolução positiva. Na primeira semana do mês, as cotações para março de
2021 estavam sendo negociadas na média a US$?107,49/lbp, elevando-se para US$?118,29/lbp na média das cotações futuras da quarta semana, ou seja, variação de 9,66% no mês. Essa alavancagem das cotações do arábica, as expensas da valorização do real no período2 não repercutiu na formação dos preços do café, devido ao aumento da percepção de que a estiagem do terceiro trimestre do ano impactará de modo pronunciado a produção da próxima safra, acrescido das repercussões do tufão nos cinturões cafeeiros da América Central (Figura 2).

 

Cotejando a média das cotações futuras da quarta semana de novembro na Bolsa de Nova York (US$?118,29/lbp) com a média dos preços recebidos pelos cafeicultores do principal cinturão de lavoura cafeeira do Estado de São Paulo, o EDR de Franca, sistematizados pelo Instituto de Economia Agrícola, alcançam-se R$554,73/sc. tipo 6 bebida dura3 ou US$101,97/sc. pelo dólar médio do mês (R$5,44/US$). Efetuando-se as devidas conversões, esse montante representa US$?134,88/lbp. Descontando-se os custos de contratação de hedge e o deságio implícito frente ao contrato C (em média de 20%), alcançam-se US$?107,90/lbp, ou seja, apenas US$?10,30/lbp de vantagem financeira, ou aproximadamente US$13,74/sc. frente ao preço spot, montante capaz de atrair cafeicultores para proteção dos preços para seu produto.

O mercado futuro de café robusta negociado na Bolsa de Londres acompanhou aquilo que se observou para o mercado futuro de arábica. Ao contrário do comportamento climático observado no Brasil, no Vietnã é o excesso de chuvas que tem prejudicado a colheita do produto, trazendo especulações sobre o prosseguimento do suprimento ao mercado. Em contrapartida, os embarques de conilon brasileiro avançaram, podendo registrar em 2020 recorde de vendas internacionais do produto, uma vez que, entre janeiro e novembro desse ano, já se soma expansão de 25% frente a igual período do ano anterior (3,61 milhões de sacas embarcadas)4 (Figura 3). Não fossem as dificuldades vietnamitas em proceder com suas exportações, estaríamos tendo cotações cadentes para o robusta em face da expansão brasileira.

 

A possibilidade de contingenciamento do suprimento global em razão das dificuldades que a safra brasileira exibirá e o mau desempenho dos nossos principais concorrentes trouxeram preocupações aos investidores no mercado de café. Com isso, os contratos comprados, nos fundos e grandes investidores, passaram a superar com folga os vendidos, gerando uma posição líquida de mais de 15 mil contratos ao final de novembro de 2020 (Tabela 1).

 

 

As especulações sobre o futuro da oferta brasileira que terá em 2020/21 uma safra de ciclo baixo se intensificam. A ausência de dados confiáveis tem gerado estimativas das mais catastróficas (perdas de no mínimo 35%) e das mais modestas (até 20%) são postas no debate. Compete à administração pública, em colaboração com as principais cooperativas cafeeiras brasileiras, estimar com maior precisão o patamar das perdas e permitir que os investidores, exportadores e industriais façam seus planejamentos para não serem surpreendidos pela quase certa escalada de preços da matéria-prima que virá em 2021.

 

 

1O autor agradece o trabalho de sistematização do banco de dados econômicos conduzido por Paulo Sérgio Caldeira Franco, Agente de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do IEA.

 

2Ademais, houve em outubro mais uma queda nos estoques certificados em Nova York, totalizando 6,14 milhões de sacas em outubro, frente a 6,40 milhões em setembro, ou seja, queda de 264,94 mil sacas. Disponível em GREEN COFFEE ASSOCIATION. Warehouse coffee stocks. New York: Green Coffee Association, November, 2020. Disponível em: http://greencoffeeassociation.org/professionalresources/
warehouse_information. Acesso:
4 dez. 2020.

 

3INSTITUTO DE ECONOMIA AGRÍCOLA. Preços médios diários recebidos pelos produtores. São Paulo: IEA, 2020. Disponível em: http://ciagri.iea.sp.gov.br/precosdiarios/precosdiariosrecebidos.aspx?cod_sis=6. Acesso em: Acesso: 04 dez. 2020.

 

4CONSELHO DOS EXPORTADORES DE CAFÉ DO BRASIL – CECAFÉ. Relatório Mensal novembro de 2020. São Paulo: CECAFÈ, 2020. Disponível em: https://www.cecafe.com.br/publicacoes/relatorio-de-export
acoes/. Acesso em: 7 set. 2020.

Palavras-chave: cotações futuras, bolsa de valores, mercado de café.

 

 

 

 

 

 

 

 

VEGRO, C. L. R. Fortalecimento do Real Pressiona as Cotações Futuras. Análises e Indicadores do Agronegócio, São Paulo, v. 15, n. 12, dez. 2020. Disponível em: colocar o link do artigo. Acesso em: dd mmm. aaaa.

Data de Publicação: 17/12/2020

Autor(es): Celso Luís Rodrigues Vegro (celvegro@sp.gov.br) Consulte outros textos deste autor